Acórdão nº 451/17.1T9LSB-A.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 30 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelABRUNHOSA DE CARVALHO
Data da Resolução30 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: No Juízo de Instrução Criminal de Lisboa, por despacho de 03/04/2017, constante de fls. 165/167, à “Ordem dos Enfermeiros”, com os restantes sinais dos autos (cf. procuração de fls. 80), foi recusada a intervenção como assistente, nos seguintes termos: “… A Ordem dos Enfermeiros veio, a fls. 70, requerer a sua constituição como assistente. A requerente alegou que estando-lhe confiada "a defesa dos interesses gerais dos destinatários dos cuidados de enfermagem e a representação e defesas dos interesses da profissão" de Enfermeiro, nos termos do artigo 3°, n° 1, da Lei n° 156/2015, de 16.09., e porque se investigam nos autos factos suscetíveis de pôr em causa estes interesses, assume a qualidade de ofendida, nos termos e para os efeitos do artigo 68°, n° 1, do Código de Processo Penal'.

O Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento do requerido com os fundamentos constantes da douta promoção de fls. 122, alegando que a matéria denunciada não é passível de integrar a prática de ilícito criminal, acrescentando que, caso se viesse a indiciar a não administração de medicamentos/de comida/de cuidados de higiene aos doentes, de molde a colocar a sua saúde em perigo, apontando-se, então, para a existência de um crime de ofensa à integridade física, o ofendido de tal crime seria sempre o doente e não a Ordem.

Nos autos não ocorreu constituição de arguido.

Cumpre apreciar e decidir.

De acordo com o que resulta do are 68°/1 do Cód. Proc. Penal têm legitimidade para se constituírem assistentes no processo penal os ofendidos (considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente — de forma imediata e direta - quis proteger co incriminação), os seus sucessores, os seus representantes legais (quando o ofendido tenha idade inferior a 16 anos ou seja por outro motivo incapaz) e qualquer pessoa nos crimes contra a paz e a humanidade bem como nos demais crimes elencados na alínea e) da mesma disposição legal.

Para o que aqui nos interessa, e como se referiu, de acordo com o preceituado no artigo 68°/1/a) do Cód. Proc. Penal, o ofendido (com legitimidade para se constituir assistente) é o titular do interesse que constitui objeto jurídico imediato do crime.

Como ensina o Prof. Figueiredo Dias, "... a nova lei parte do conceito estrito de ofendido na determinação do círculo de pessoas legitimadas para intervir como assistentes no processo penal..." (Direito Processual Penal, 1, págs. 512/513).

Nos presentes autos foram denunciados pela requerente os factos vertidos a fls. 33 e 34, que a Ordem do Enfermeiros considerou suscetíveis de integrar a prática de ilícitos penais. Em resumo, os factos denunciados correspondiam a situação em que num determinado serviço do Centro Hospitalar Lisboa Central teria sido verificada uma situação de não administração de medicamentos/de comida/de cuidados de higiene aos doentes.

Como bem entende o Ministério Público, a matéria denunciada poderia, eventualmente, integrar o cometimento de crime(s) de ofensa à integridade física dos doentes assistidos pelo referido serviço do Centro Hospitalar Lisboa Central que, por via dos factos, tivessem visto a sua saúde afetada pela privação de medicamentos, comida e cuidados.

Sucede que o bem jurídico protegido pelos referidos crimes de ofensa à integridade física não é da titularidade da requerente Ordem dos Enfermeiros.

O facto de o artigo 3°, n° 1, do respetivo Estatuto, aprovado pela Lei n° 156/2015, de 16.09., considerar como desígnio da Ordem a defesa dos interesses gerais dos destinatários dos cuidados de enfermagem, não converte a requerente em titular do interesse que constitui objeto jurídico imediato do crime – titular desse interesse será sempre e só o doente afetado.

Sendo assim, por falta de legitimidade, indefere-se a pretensão da Ordem dos Enfermeiros a ser constituída como assistente.

…”.

* Não se conformando, a “Ordem dos Enfermeiros” interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 183/188, com as seguintes conclusões: “… 1.A decisão...

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