Acórdão nº 19331-16.1T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução12 de Outubro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de LISBOA.

1.

–Relatório: A (INSTITUIÇÃO FINANCEIRA ….., S.A.,) com sede no PORTO, intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum , contra B, de Lisboa, pedindo que : a)- seja judicialmente reconhecida a legalidade e a validade da resolução por si operada do contrato de locação financeira celebrado entre as partes ( autora e Ré ) ; b)- seja a Ré condenada a pagar-lhe a quantia de €21.730,22, acrescida de juros de mora vincendos, até integral pagamento, correspondente às quantias devidas pelo incumprimento da Ré das obrigações assumidas em contrato de locação financeira.

1.1.

– Para tanto alegou a autora, em síntese, que : – celebrou com a Ré em Junho de 2006, um contrato de locação financeira, tendo por objecto uma viatura automóvel , a vigorar pelo período de 73 meses, mediante o pagamento de rendas mensais, sendo a primeira no valor de € 1.950,00 e as demais no montante mensal de €190,24 ; – Tendo a Autora pago as rendas nos primeiros 3 anos, certo é que, após 5/6/2009, deixou de o fazer, e , após interpelação para pôr termo à mora, não o fez; – Daí que, por carta de 11 de Outubro de 2010, veio a autora a resolver o contrato, não tendo porém a Ré efectuado o pagamento das rendas vencidas , bom como dos encargos devidos, e não tendo outrossim procedido à restituição imediata do veículo.

1.2.

– Citada a Ré ( nos termos do artº 232º, do CPC ) , não veio a mesma apresentar contestação, razão porque, nos termos do artº 567º, do CPC, foi proferida decisão que jugou confessados os factos alegados pela autora na sua petição inicial, tendo de seguida esta última - a convite do tribunal - vindo aos autos esclarecer a forma de cálculo da quantia correspondente ao pedido deduzido, o que fez nos seguintes termos : – € 4.783,45, correspondente a rendas vencidas e não pagas ( 37ª à 53ª renda), juros de mora e despesas decorrentes da falta de pagamento das rendas apresentadas a débito ; – €1.064,29, correspondente a juros de mora calculados desde a data da resolução do contrato; – €11.534,26 , correspondente à mora na entrega do veículo, nos termos das disposições conjugadas da cláusula 13ª , b), n° 1 e cláusula 12ª , f) - o valor da última renda vencida por cada mês ou fracção na obrigação de entrega do bem, desde a resolução do contrato em 11.10.2010 até à emissão de carta de perda de interesse em 30.11.2015 ; – €3.793,50, correspondente a indemnização calculada nos termos do disposto na cláusula 13ª, b), n° 3, e ao valor do prejuízo pela perda do veículo quantificado no montante de avaliação do referido veículo.

1.3.

– Seguiu-se depois a prolação da competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor: “ (…) Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção e, consequentemente, condeno a Ré a pagar à Autora a quantia de € 8.576,95, acrescida de juros de mora, à taxa legal, devidos desde 11/10/2010, até integral pagamento, absolvendo-a do mais peticionado.

Custas pela Autora e pela Ré, na proporção do respectivo decaimento.

Registe e notifique.

Lisboa, 4.04.2017” 1.4.

– Não se conformando com a decisão/sentença do tribunal a quo, da mesma apelou então a Autora A, alegando e deduzindo as seguintes conclusões : I–Vem o presente recurso interposto da douta sentença na parte em que absolver a ré do pagamento da quantia de € 11.534, 26, correspondente à mora na entrega do veículo, nos termos das disposições do contrato de locação financeira celebrado (confrontar cláusula 12ª, f) do contrato de locação financeira junto aos autos) II–Autora e Ré celebraram um contrato de locação financeira nos termos do qual a esta foi cedido o gozo de utilização de um veículo automóvel o qual, uma vez resolvido o contrato por incumprimento, não foi restituído à locadora, aqui Autora Recorrente.

III–Tal obrigação de restituição impendia sobre a Ré nos termos do contrato, para além do pagamento dos valores devidos com origem na resolução por incumprimento.

IV–A Ré, regularmente citada, não contestou a acção.

V–A falta de cumprimento dessa obrigação de restituição constitui a Ré na obrigação de pagar a Autora a quantia devida pela mora, nos temos contratualmente fixados.

VI–Tal quantia é distinta da indemnização devida por incumprimento do contrato e ao ser julgada como indevida tal significaria que não haveria qualquer diferença entre restituir ou não o veículo, uma vez findo o contrato.

VII–No regime jurídico do contrato de locação financeira, previsto no Decreto-Lei nº 149/95 de 24 de Junho, com as alterações subsequentes, está mesmo previsto um procedimento específico para a recuperação dos bens pelas locadoras e estipulado que "findo o contrato por qualquer motivo e não exercendo o locatário a faculdade de compra, o locador pode dispor do bem, nomeadamente vendendo-o ou dando-o em locação financeira ao anterior locatário ou a terceiro".

VIII–O regime legal da locação financeira traduz de forma clara o direito da locadora reaver o bem objecto do contrato uma vez findo o mesmo, no contraponto do que se encontra o correspondente dever da locatária em proceder à sua entrega e devolução.

IX–A operacionalidade e eficácia de tal dever terá necessariamente de implicar a possibilidade de responsabilizar e penalizar a locatária pelo respectivo incumprimento de modo a que incumprir o contrato e proceder à restituição do bem OU incumprir o contrato e não proceder à restituição do bem não pode ter o mesmo resultado.

X–Do contrato consta expressamente prevista uma cláusula específica destinada a regular a consequência do incumprimento da obrigação da entrega, cláusula que a Ré aceitou quando subscreveu o contrato, pelo que a douta sentença recorrida, salvo o devido respeito, constitui ainda violação do princípio pacta sunt servanda e do respeito pela liberdade contratual que o informa.

XI–São realidades jurídicas distintas o dano que à Autora causa o incumprimento do contrato - ao qual corresponde parte do valor peticionado na acção e cujo pedido a douta sentença de fls. () reconhece - e o dano que à Autora causa a falta de restituição do veículo.

XII–A fixação de uma cláusula com a natureza da prevista na cláusula 12ª, f) do contrato tem também a pretensão de gerar nas contrapartes um efeito preventivo e compulsivo-sancionatório.

XIII–É justo penalizar a locatária pela detenção abusiva do veículo tanto mais que para evitar tal pagamento bastaria que restituísse o veículo.

XIV–A douta sentença de fls. () foi proferida em clara violação do regime legal da locação financeira regulado pelo Decreto-Lei nº 149/95 de 24 de Junho e do princípio da liberdade contratual plasmado no artigo 405º do Código Civil.

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO E SEMPRE COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, MUI VENERANDOS DESEMBARGADORES, ROGA-SE SEJA REVOGADA A DOUTA SENTENÇA DE FLS.( ), QUE ABSOLVEU PARCIALMENTE A RÉ DO PEDIDO POR OUTRA QUE DETERMINE A PROCEDÊNCIA TOTAL DA ACÇÃO, ASSIM SE FAZENDO BOA E SÃ JUSTIÇA.

1.5.

– Não foram apresentadas contra-alegações.

Thema decidendum 1.6.

– Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, a questão a apreciar e a decidir é a seguinte : Primo – Aferir se deve a sentença apelada ser revogada, sendo substituída por decisão que julgue a acção também procedente no tocante ao pedido de condenação da Ré no pagamento da quantia de : – €11.534,26 , correspondente à mora na entrega do veículo, nos termos das disposições conjugadas da cláusula 13ª , b), n° 1 e...

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