Acórdão nº 101/15.0PAPST.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS ALMEIDA
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: 1–A arguida D.F.B. foi julgada na Secção de Competência Genérica – Juiz 1 – da Instância Local de Porto Santo da comarca da Madeira e aí condenada, por sentença de 3 de Outubro de 2016, pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência, conduta p. e p. pelo artigo 148.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), do Código Penal, tendo sido dispensada de pena.

A arguida foi ainda condenada a pagar ao Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira, E.P.E. 36 €, acrescidos de juros de mora contados desde a data da notificação até efectivo e integral pagamento.

Nessa peça processual o tribunal considerou provado que: 1.-A arguida D.F.B. é chefe de SM, desempenhando as suas funções na área da Segurança, no rastreio de bagagem de cabine, no aeroporto da ilha do Porto Santo, sito no Sítio do Tanque.

  1. -No dia 22 de agosto de 2015, sensivelmente pelas 22 horas e 37 minutos, naquele local, a arguida agarrou numa caixa azul vazia para colocação dos bens dos passageiros, que se encontrava junto ao aparelho de rastreio de bagagem de cabine, e atirou-a para cima daquele aparelho, com força, fazendo com que outra caixa azul, que se encontrava na parte dianteira desse aparelho, caísse e tivesse atingido SM no maxilar esquerdo e na mão esquerda.

  2. -Em consequência direta e necessária do comportamento da arguida, SM sofreu dor física e padecimento, ficando chorosa e mantendo a sua anterior ansiedade e stress, sem afetação da capacidade para o trabalho geral e profissional.

  3. -Ao agir do modo descrito, a arguida D.F.B. atuou com falta de cuidado que o dever geral de prudência aconselha, cuidado que era capaz de adotar e que devia ter adotado, violando elementares deveres de precaução e cautela, cuidados esses que devia e podia ter para evitar aquele resultado, que igualmente podia e devia prever.

  4. -A arguida representou como possível que poderia colocar, como colocou, em perigo a integridade física da ofendida, causando-lhe dores físicas e, ainda assim, atuou da forma descrita, sem se conformar com essa possibilidade.

  5. -A arguida agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que o seu comportamento era e é proibido e punido pela lei penal.

  6. -A arguida não tem antecedentes criminais registados.

  7. -Condições económicas, sociais e pessoais: a)-A arguida aufere mensalmente cerca de 1.050,00 € líquidos como supervisora de segurança no Aeroporto de Porto Santo.

    b)-Tem 2 filhos menores de 4 e 6 anos de idade.

    c)-Paga mensalmente cerca de 350,00 € de empréstimo bancário e 90,00 € de despesas de educação.

    d)-Tem 2 veículos automóveis, um dos quais paga cerca de 220,00 € de mensalidade de empréstimo bancário.

    e)-Tem o 12.º ano de escolaridade.

  8. -Na sequência do descrito de 2 a 6, a demandante, no exercício da sua actividade, prestou cuidados de saúde à utente SM, que consistiram num atendimento no Serviço de Urgência do Centro de Saúde Dr. Francisco Jardim, no dia 28 de Setembro de 2015, no valor de 36,00 € (trinta e seis euros), a qual nunca foi liquidada.

    O tribunal considerou não provado que: A.-Que o descrito em 1 tenha sucedido pelas 23 horas e 30 minutos.

    B.-Que as lesões descritas em 3 tenham necessitado de um período de 30 dias para a cura.

    C.-A arguida representou como possível que poderia colocar, como colocou, em perigo a integridade física da ofendida, causando-lhe dores físicas e, ainda assim, atuou da forma descrita, conformando-se com essa possibilidade.

    O tribunal fundamentou a decisão de facto nos seguintes termos: A convicção do Tribunal para a determinação da matéria de facto dada como provada fundou-se na ponderação da prova produzida em audiência de julgamento, a qual foi apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador – artigo 127.º do C.P.P. – na prova documental – auto de visionamento de imagens, de fls. 17 (complementado pela visualização, em audiência de julgamento, da gravação da vigilância do aeroporto) no tocante aos pontos (2 a 6 e A e C) relativos ao sucedido no dia e hora dos factos (esta última alterada de acordo com as referências da videovigilância) e ainda documentação clínica, de fls. 26 e 27, conjugada com a prova pericial – auto de exame médico de fls. 29 a 31 – no tocante às lesões causadas à ofendida e despesas médicas com esta (doc. nota de despesa de fls. 75) – pontos 3 e 9.

    No tocante às lesões da ofendida, cumpre notar que não foi dado como provado – ponto B – que o período de cura se fixasse em 30 dias, em divergência com o constante do relatório pericial de fls. 29 a 31.

    De facto, entendemos que tal divergência contende não tanto com a não prova da existência de um período extenso (indeterminado) em que a ofendida tenha sofrido de ansiedade ou stress derivado da sua relação conflituosa com a arguida, mas sim com a não prova de que tal se devesse aos específicos factos aqui em apreço.

    Notemos, em nota prévia, que os dias de cura no referido relatório imputam-se a um quadro, nos termos do próprio de "ansiedade ligada ao stress", isto é, contendem estritamente com o quadro psíquico e não com as lesões físicas da ofendida – como o próprio relatório frisa, sendo impreciso, porém, na determinação da causa do referido quadro.

    Assim sendo, importa fixar o início e duração do referido quadro clínico, bem como a sua causa para efeitos de ligação causal com a factualidade aqui em apreço.

    Como infra veremos, do depoimento da ofendida e declarações da arguida resultou...

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