Acórdão nº 280/14.4TTFUN.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelPAULA S
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: AAA intentou a presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento em processo especial contra: BBB,, pedindo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do mesmo, com as legais consequências.

A entidade empregadora apresentou articulado de motivação de despedimento, imputando-lhe factos que na sua opinião, violaram de forma culposa e grave os deveres de respeitar e tratar com urbanidade, os companheiros de trabalho; o de realizar o trabalho com zelo e diligência, bem como o cumprir com as ordens e instruções do empregador respeitantes à execução e disciplina do trabalho, de guardar lealdade ao empregador, o que tornaram de forma imediata e impossível a subsistência da relação de trabalho.

O trabalhador contestou, sustentando que nunca violou qualquer dever laboral, pelo que inexiste justa causa e consequentemente o despedimento terá que ser considerado ilícito.

Concluiu, pedindo que seja julgada procedente, por provada, a presente ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e, consequentemente; a) ser declarada a licitude do seu despedimento; b) ser condenada a R. a indemnizar o A. por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados; c) ser condenada a R. a pagar ao A. as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, sem prejuízo do disposto no art.º 98º-N, nºs 1 a 3 do CPT.

Realizou-se audiência final, tendo o Autor optado pela indemnização substitutiva.

Na sentença recorrida foi proferida a seguinte decisão: Com fundamento no atrás exposto, julgo procedente por provada a presente ação, e, em consequência: a)Declaro a ilicitude do despedimento do autor efetuado pela ré, por improcedência do motivo de justa causa invocado.

b)Condeno a ré a pagar ao autor as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento (11.07.2014) até ao trânsito em julgado desta decisão, sem prejuízo das retribuições cujo pagamento é da responsabilidade da Segurança Social da área de residência do trabalho e das deduções previstas nas alíneas a) e c) do nº 2 do artigo 390º do CT.

c)Condeno a Segurança Social da área de residência do trabalhador a pagar ao autor as retribuições que se venceram após o decurso do prazo de 12 meses, contados desde 15.07.2014 descontado o período de 139 dias, a efetuar até 30 dias após o trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento, nos termos do art.º 98º-N, nº 3 do CPT, sem prejuízo das importâncias referidas no nº 2 do artigo 390º do CT.

d)Condeno a ré a pagar ao autor uma indemnização de antiguidade correspondente a 20 (vinte dias) de retribuição base por fração ou ano completo de antiguidade contada desde 18.07.1972 até ao trânsito em julgado desta decisão.

A Ré, inconformada, interpôs recurso tendo para o efeito elaborado as seguintes Conclusões: 1.-Face à factualidade provada em sede de Audiência de Julgamento, nomeadamente, os factos dados como provados sob os n.ºs 1.1, 1.9. a 1.22. da douta sentença recorrida verifica-se justa causa de despedimento.

  1. -Ficou provado que o A. violou os deveres funcionais a que está adstrito por força do respectivo vínculo laboral, designadamente os deveres de respeitar e tratar com urbanidade os companheiros de trabalho; o de realizar o trabalho com zelo e diligência; bem como o de cumprir com as ordens e instruções do empregador respeitantes à execução e disciplina do trabalho, e a douta sentença reconhece essa violação, devendo, em nossa opinião, ter considerado também violado o dever de guardar lealdade ao Empregador.

  2. -Os factos apurados possuem uma gravidade que, só por si e em si, de um ponto de vista objectivo, jurídico, implicam uma quebra irremediável e sem retorno da relação de confiança que o vínculo laboral pressupõe entre empregado e empregador, impondo, nessa medida, a este último, o despedimento com justa causa, por ser a única sanção disciplinar que se revela proporcional, adequada e eficaz à infracção concreta.

  3. -Na apreciação do caso em apreço, é de enorme relevância que o A. era de Chefe de Bar e que a R. tinha absoluta confiança neste, e que todos os funcionários, accionistas, membros da administração e familiares têm perfeito conhecimento das regras e que estas devem ser estritamente observadas por todos.

  4. -Não só deve ser ponderada a conduta anterior do trabalhador, mas também a sua conduta posterior e o grau de arrependimento manifestado, sendo que o A. não só não revelou arrependimento, como praticou novas infracções, quando confrontado com a prática das infracções inicialmente imputadas, sendo que ao negar a sua prática não revelou arrependimento.

  5. -O A., na qualidade de Chefe, chamou aos seus subordinados, “sacanas”, expressão que não pode ser interpretada, como fez o douto Tribunal a quo, como um desabafo, sendo proferido em reacção ao facto dos empregados, seus subordinados, terem cumprido com o seu dever de lealdade para com a entidade Empregadora, informando-a com verdade sobre os factos que eram do seu conhecimento, o que torna especialmente grave o insulto, que não pode deixar de constituir uma violação do dever de respeito e de urbanidade.

  6. -Os factos provados configuram também uma violação do dever de lealdade pelo A., sendo certo que o dever de lealdade abrange mais situações que as referidas, exemplificativamente, na alínea f) do n.º 1 do art. º128 do C.T., sendo pacífico que o dever de lealdade ou honestidade não é susceptível de graduação, constituindo um dever absoluto, pelo que qualquer violação deste dever envolve uma falta grave, eliminando-se a confiança entre as partes.

  7. -É irrelevante que o prejuízo patrimonial para a Entidade Empregadora tenha sido mínimo, para a quebra irremediável de confiança que o comportamento do A. causou.

  8. -Um Chefe, atenta a natureza das suas funções, tem especiais obrigações, quer perante os seus subordinados, quer perante a sua Entidade empregadora, pelo que é muito grave que incite os seus subordinados a mentir à Entidade Empregadora.

  9. -Não é razoável exigir a uma Entidade Empregadora a manutenção do vínculo laboral com um funcionário que exerce funções de chefia, e que, ao invés, de ser o primeiro a dar o exemplo, é o primeiro a transgredir, num comportamento persistentemente desleal e desobediente, e que insulta os seus subordinados por estes cumprirem com estes deveres.

  10. -Os factos dados como provados em sede de Audiência de Julgamento são suficientemente graves, em si, e nas suas consequências, que justificam uma sanção disciplinar de despedimento, por ser esta proporcional, adequada, e justa, face à gravidade desses factos e culpa do A., que tornou imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho encontrando-se preenchido o conceito de justa causa, e verificada a justa causa de despedimento, devendo, a douta sentença ser revogada, declarando-se lícito o despedimento do A..

  11. -Dado que é impossível a subsistência de uma relação laboral em que o trabalhador, como foi o caso do A., desobedece sistematicamente às ordens e instruções da Entidade Empregadora, que é desleal para com esta, dando um mau exemplo aos seus subordinados, quando deveria ter um comportamento exemplar, enquanto chefe, incitando-os a mentir à Entidade Empregadora, prevalecendo-se da sua posição hierárquica superior para os ofender, e quando a Entidade Empregadora perdeu de forma absoluta, irremediável e definitivamente a confiança que tinha no A., enquanto pessoa, funcionário, e Chefe, quer para o exercício destas ou de quaisquer outras funções.

  12. -A única sanção disciplinar proporcional à gravidade das infracções e à culpabilidade do A. é o despedimento, sendo inexigível por parte da Entidade Empregadora a manutenção do vínculo laboral com o A.

  13. -A alínea c) do n.º 1 do art.º 98- O do Código de Processo de Trabalho, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 295/2009, de 13/10, está ferida do vício de inconstitucionalidade orgânica da já que viola o disposto nos artigos 112º, n.º 2, 165º, n.ºs 1 e 2 e 198º, n.º 1, al. b) da CRP.

  14. -A acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, com processo especial, encontra-se regulada nos artigos 98.º-B a 98.º-P do Código de Processo de Trabalho, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 295/2009, de 13/10.

  15. -O referido Decreto-Lei nº 295/2009, de 13/10, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 76/2009, de 13 de agosto, procedeu a um conjunto de alterações na disciplina processual do direito do trabalho, criando no direito adjectivo uma acção declarativa de condenação com processo especial, de natureza urgente, que admite sempre recurso para a Relação, para impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento.

  16. -A Lei n.º 76/2009, de 13 de agosto, autorizou o Governo a alterar o Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, definindo o artigo 2.º o sentido e a extensão da autorização legislativa concedida, e previsto na alínea “n) Criar uma acção declarativa de condenação com processo especial para impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, de natureza urgente, que admite sempre recurso para a Relação, aplicável aos casos em que seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual, seja por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja ainda por inadaptação, e na alínea v) Caso a decisão da acção em primeira instância ocorra depois de decorridos 12 meses desde o início da acção, exceptuando os períodos de suspensão da instância, mediação, tentativa de conciliação e aperfeiçoamento dos articulados, e o despedimento seja considerado ilícito, prever que o tribunal determine que seja efectuado pela entidade competente da área da segurança social o pagamento ao trabalhador das retribuições devidas após aquele prazo e até à decisão em...

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