Acórdão nº 16347-15.9T8SNT-F.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução14 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

– Relatório: C, por apenso ao processo de insolvência de T, instaurou acção declarativa, com processo especial de verificação ulterior de créditos, contra a insolvente, a respectiva massa insolvente e todos os credores.

Pediu que seja reconhecido e graduado crédito no valor de € 870.320,76, acrescido de respectivos juros vincendos.

Alegou, em síntese, que celebrou diversas operações de crédito com a sociedade O. Para garantia do cumprimento dessas obrigações, além de outras garantias, foi constituída hipoteca a favor da Autora, incidente sobre imóvel então da Insolvente. Esse imóvel foi transmitido à sociedade P por negócio de compra e venda realizado em 10.01.2014. Operada a resolução desse negócio, pelo Administrador da Insolvência, a A. ficou credora da insolvente por todas as quantias abrangidas pela garantia hipotecária.

Foi lavrado termo de protesto.

A Massa Insolvente contestou. Alegou a nulidade da hipoteca por constituir negócio que não é do interesse da insolvente, nem se integra no seu objecto social, após o que impugnou os negócios objecto de garantia. Pediu a intervenção acessória provocada da sociedade O. e dos demais garantes das obrigações invocadas pela Autora.

O incidente de intervenção acessória provocada foi julgado improcedente.

Realizou-se audiência prévia, na qual, além do mais, foi caracterizado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Após audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que: –Julgou improcedente a excepção de nulidade da hipoteca, arguida pela Ré.

– Reconheceu ao credor C crédito sobre a insolvente, no montante de € 425.000,00 (quatrocentos e vinte e cinco mil euros de capital), a que acrescem juros de mora e penalização calculados à taxa global de 8,955%, desde as datas de vencimento provadas nesta decisão, acrescidos do imposto de selo que seja devido, até ao limite de capital e juros de € 551.926,25 (quinhentos e cinquenta e um mil novecentos e vinte e seis euros e vinte e cinco cêntimos); –Limitar a responsabilidade da insolvente pelo referido crédito, ao produto da liquidação do imóvel a que respeita a hipoteca de que beneficia o credor, fracção autónoma designada pelas letras “CBPA” que corresponde ao segundo piso - cave – sala de espectáculos, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito no Bairro X –Qualificar o referido crédito como garantido, pela referida fracção autónoma.

Inconformada, a Massa Insolvente da Sociedade T interpôs competente recurso, cuja minuta concluiu da seguinte forma: A)–O presente recurso da douta Sentença ora impugnada justifica-se por se entender que a mesma não faz uma análise casuística e concreta das circunstâncias, e, consequentemente, não faz uma aplicação correcta do direito; B)–A douta Sentença decidiu julgar improcedente a excepção de nulidade da hipoteca, arguida pela Massa Insolvente, ora Recorrente, sustentando simplesmente que o ónus de prova da excepção da alegada invalidade recai sobre ela e não sobre o credor que dela beneficia, a ora Recorrida; C)–Entende, pois, que deve ser a Massa insolvente a demonstrar a «inexistência de justificado interesse» da sociedade-garante T ao invés de ser a C a demonstrar a «existência do justificado interesse»; ou seja, considera que deve ser a Massa Insolvente a demonstrar o facto negativo de «inexistência» e não a C a demonstrar o facto positivo de «existência»; 6 No sentido de que o ónus da prova é responsabilidade da entidade garantida vide também J.M. Coutinho Abreu, in «Curso de Direito Comercial», Vol. II – Das Sociedades; João Labareda, in “Direito Societário Português”, 1998, Quid Juris; D)–No entanto, o legislador do Código das Sociedades Comerciais refere no preâmbulo (ponto 23) que “Os actos praticados pelos gerentes em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhes confere vinculam-na para com terceiros, não obstante as limitações constantes do contrato social ou resultantes de deliberações dos sócios. A sociedade pode opor a terceiros limitações de poderes resultantes do objecto social se provar que o terceiro tinha conhecimento de que o acto praticado não respeitava essa cláusula [sublinhado nosso] e se, entretanto, ela não tiver assumido o acto, por deliberação expressa ou tácita dos sócios, mas tal conhecimento não pode ser provado apenas pela publicidade dada ao contrato de sociedade (artigo 260.º).” E)–A C, ora Recorrida, sabia que o objecto social da T não permitia a possibilidade de prestação da garantia a favor de terceiro, conforme resultou do facto dado como provado sob n.º 37 e que, portanto, em última instância, sabia que o mesmo poderia ser declarado inválido; F)–Perante tal facto, restava à C alegar e provar nos autos que, não obstante, a sociedade-garante T obteve uma vantagem ao prestar a garantia a favor de terceiro, o que não sucedeu; G)–Devendo, portanto, concluir-se que a prestação de garantia pela T a favor de terceiro e de que beneficiou a ora Recorrida, foi realizada sem qualquer «interesse próprio» daquela estando, por isso, ferida de nulidade.

H)–Refira-se que a declaração genérica aposta na escritura, de que a sociedade T tem interesse próprio, não é prova suficiente do efetivo interesse, porquanto tal prova terá de passar por uma demonstração efectiva de vantagem (directa ou indirecta) para a sociedade-garante; I)–Mas caso assim não se entendesse, o que por mera cautela se admite, sem contudo conceder, salvo melhor opinião, a douta Sentença não leva em consideração a natureza das partes aqui em confronto, facto que, no entender da Recorrente, também tem relevância para o caso em apreço; J)–Efectivamente, em confronto estão, por um lado, a Massa Insolvente da sociedade garante, que é alheia ao negócio e, por outro lado, a C que nele foi parte; K)–Ora, a C, enquanto parte interveniente no negócio, está em muito melhores condições para demonstrar que a sociedade garante interveio com «justificado interesse», do que está a Massa Insolvente de provar a «inexistência de justificado interesse»; L)–Acresce que, a C é uma instituição de crédito, motivo pelo qual está obrigada a adoptar medidas e comportamentos necessários para garantir o cumprimento dos requisitos legais e formais dos negócios em que intervém, o que lhe é imposto directamente pelo próprio Regime Geral das Instituições das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (v.g. art.º 73.º); M)–Caso ainda assim não se entenda, sublinhe-se que a Massa Insolvente não tendo sido interveniente no negócio, ao invocar contra o beneficiário banco a nulidade da prestação de uma garantia, com fundamento na falta de capacidade de gozo da sociedade garante, não pode o mesmo ser considerado como um facto constitutivo da sua pretensão, sob pena de tal entendimento contribuir para uma situação de (quase) impossibilidade de ver declarada tal invalidade quando alegada por terceiro; N)–A maioria da doutrina (citada nas alegações supra) e parte da jurisprudência (vide Ac. TRP de 15/09/2014, melhor identificado na nota de rodapé 2), adoptou claramente a tese de que o ónus da prova nos casos como o dos autos recai sobre a entidade que beneficia da garantia, pelo que considerando as circunstâncias em apreço, impunha-se também aqui decisão nesse sentido; Nestes termos, e nos melhores de direito que serão doutamente supridos por V...

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