Acórdão nº 4242/12.8TASXL.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelVIEIRA LAMIM
Data da Resolução05 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: Iº-1.No Processo Comum (Tribunal Singular) nº4242/12.8TA..., da Comarca de Lisboa - ... - Inst. ... - Secção Criminal - J..., foi julgado, FF..., pronunciado por um crime abuso de confiança, p. e p. pelo artigo 205, nºs1 e 30, nº2, do Código Penal e demandado civilmente por Condomínio do Prédio da Rua ..., n.º ..., na A..., que pediu a condenação do demandado/arguido a pagar a quantia de €6.998,47 a título de danos patrimoniais, posteriormente ampliando o pedido, reclamando juros de mora vencidos e vincendos.

O Tribunal, após julgamento, por sentença de 21Out.15, decidiu: "….

… condeno o arguido FF... como autor material de um crime de abuso de confiança na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 205º, n.º 1 e 30º, n.º 2 do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à taxa diária de €6,00 (seis euros) no total de €480,00 (quatrocentos e oitenta euros).

Julgo parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido por Condomínio do Prédio da Rua ..., n.º ..., na A... e, em consequência, condeno o arguido no pagamento ao demandante de uma indemnização a título de danos patrimoniais no valor de €6.240,25 (seis mil, duzentos e quarenta euros e vinte e cinco cêntimos), acrescida dos juros de mora contabilizados à taxa legal em vigor desde as datas dos respectivos vencimentos até integral e efetivo pagamento.

Absolvo o demandado do demais peticionado.

…".

  1. Desta decisão recorre o arguido FF..., tendo apresentado motivações, das quais extraiu as seguintes conclusões: 2.1-O arguido foi acusado e condenado pela prática de um crime de abuso de confiança na forma continuada p. e p. pelos artigos 205° n.° 1 e 30." n.° 2 do Código Penal, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 6€ no total de 480€.

    2.2-O arguido não cometeu este crime.

    2.3-O presente recurso abrange matéria de facto e de direito, uma vez que a audiência foi gravada.

    2.4-O tribunal considerou como provados os factos constantes da acusação, o que o arguido não aceita: 2.5-É falso que não houvesse intervenção na administração do prédio pelos administradores eleitos o Sr. F... (arguido) e a Sr.a D. AH....

    É falso que só o arguido tenha recebido quotas mensais pagas pelos condóminos.

    É falso que a pretexto de despesas se tenha apoderado de verbas do condomínio.

    Que a tenha sido movida no Julgado de Paz do seixal uma acção contra o arguido pessoalmente.

    Que para sua representação tenha recorrido á sociedade de advogados J... e Associados, RL.

    Que os serviços prestados pela sociedade tenham sido em único e exclusivo benefício do arguido.

    Que o arguido agiu de forma consciente e voluntária sabendo ser proibida a sua conduta.

    2.5-O que deveria constar da sentença como provado e não constou: a)Que entre 2002 e 2012 o arguido exerceu funções de administrador conjuntamente com duas pessoas não sendo ele o único responsável pela gestão dos dinheiros recebidos e despesas efectuadas, b)Que durante dez anos as quotas foram recebidas pelos administradores, o arguido e a Srª D. AH....

    c)O arguido tinha despesas para fazer a administração do prédio designadamente com deslocações para efectuar pagamentos e compras, telefonemas, mudança de lâmpadas, e de outro material, redacção de cartas e que apelidou como despesas administrativas e diversos, tendo registado tais valores no livro da contabilidade do condomínio.

    d)Que no ano de 2012 correu termos no Julgado de Paz do ... uma acção movida pelos condóminos, contra o arguido na qualidade de administrador do prédio.

    e)Que nessa acção, o arguido socorreu-se dos serviços da sociedade de advogados "J... & Associados - Sociedade de Advogados RL".

    f)Que em data não concretamente apurada próxima da data de emissão da referida factura, o arguido procedeu ao pagamento do montante nela inscrito utilizando quantias monetárias pertencentes ao condomínio.

    g)O arguido desconhecia ser proibida a sua conduta actuando por isso sem consciência da ilicitude do facto.

    2.6-Resulta do depoimento do arguido, da testemunha AH... e dos documentos acima referidos, tudo conjugado, que o arguido não estava só na administração do condomínio do prédio, que havia uma secretária, a Sr.a D. AH... e um secretário, o Sr. JS....

    Que houve intervenção designadamente da Srª. D. AH... em actos de gestão do mesmo, como fossem o acto de receber quotas dos outros condóminos, abrir conta bancária, movimentar essa conta bancária e que inclusive contratou uma Senhora para efectuar a limpeza do prédio - Cfr. doc. de fls 16 a 22 que é uma acção intentada no Julgado de Paz em que esta senhora figura como demandante e onde é afirmado pela mesma a contratação da Srª. da Limpeza.

    2.7-Resulta do depoimento da Sr. D. AH... que a tarefa de receber quotas era efectuada pelo arguido e pela própria na sala da administração.

    2.8-Resulta dos documentos, designadamente do apenso A, que o arguido inscrevia mensalmente os valores que retirava do condomínio. Valores esses para fazer face às despesas necessárias para realizar a administração do prédio, como telefonemas que o próprio realizava do seu telefone, com deslocações a vários serviços mensalmente tais como pagar água e luz, mandar fazer chaves para os condóminos que o solicitavam, com a compra de produtos, mudança de lâmpadas e outro material, etc, etc, etc.

    2.9-Pela natureza destas despesas não existe documento fiscal a suportá-las, o que não pode significar que o arguido não deva ser pago por elas e que fazendo o seu pagamento esteja a cometer um crime.

    2.10-Trata-se de um prédio com 54 fracções que necessita da atenção permanente do administrador - é dito pela testemunha R....

    2.11-Era o próprio arguido quem inscrevia mensalmente essas despesas no livro contabilístico do condomínio.

    2.12-Considerava tais valores, como uma despesa do condomínio.

    2.13-O documento de fls. 497 é um orçamento que foi dado para administrar o prédio no valor de 270€ + iva. O arguido tinha despesas na ordem dos 50€/mês...Quem é que beneficiou com esta administração? Foi o arguido que se vê agora acusado de um crime ou foi o condomínio que durante 10 anos poupou 220€/mês?? A testemunha R... disse não ter razões de queixa do arguido, que durante 10 anos tudo funcionou no prédio.

    Mais, os administradores que sucederam ao arguido logo trataram de se isentarem de pagar as quotas por conta do trabalho que desenvolviam no cargo de administradores. Porque afinal administrar este prédio dá trabalho, despesas, perde-se tempo. Disse-o a testemunha R... mas nem era preciso dizê-lo afinal são 54 fracções… 2.14-Ademais o cargo de administrador é remunerado, é o que diz a lei, e não faz a lei depender esta remuneração de uma deliberação - Cfr. art.° 1435 do CC. Então porque razão há-de o arguido ser condenado quando se faz pagar pelas despesas quando até o Código Civil, e qualquer pesquisa no Google, dizem que o cargo de administrador é remunerado. É do conhecimento geral.

    2.15-"Não há almoços grátis" é uma expressão comumente utilizada que expressa a ideia de que é impossível conseguir algo sem dar nada em troca e que mesmo se alguma coisa aparenta ser gratuita, há sempre um custo para a pessoa ou para a sociedade no seu conjunto.

    2.16-Os condóminos viram-se servidos durante 10 anos e não querem "pagar" por isso... Estiveram 10 anos em silêncio a serem servidos...

    2.17-Contudo os 50€ mensais que o arguido retirou não eram uma remuneração, como o próprio explicou, era um valor para as despesas que tinha, para compensar os gastos que tinha a fazer a administração, o próprio disso que havia meses em que tinha que por dinheiro do seu bolso.

    2.18-Não resulta provado que o arguido tenha integrado tais valores no seu património e utilizado em seu próprio benefício antes que tais valores minimizavam as despesas que tinha no desempenho do seu cargo.

    2.19-Resulta do documento de fls. 41 a 44 que é uma sentença do Julgado de Paz do ... que os demandantes interpuseram acção contra o demandado, na qualidade de administrador de condomínio, peticionando que este prestasse contas da administração bem como convocasse assembleia de condóminos.

    Tendo sido demandado, em acção judicial, o arguido na qualidade de administrador do condomínio para que prestasse contas e que convocasse uma assembleia, o réu nessa causa é ele próprio mas enquanto representante da administração do condomínio.

    2.20-Resulta do teor do documento de fls.7 que é a acta n.° 20 da assembleia de condóminos do prédio: "Como ponto prévio à ordem de trabalhos, foi questionado por alguns condóminos a presença do senhor advogado, JA..., na assembleia, sendo que o próprio fez questão de explicar as razões da sua presença. Foi explicado que a presença do advogado se ficava a dever ao facto de alguns condóminos terem intentado acção no julgado de paz contra o administrador do prédio e que nesse processo tinha ficado acordado a realização daquela assembleia, razão pela qual o advogado se disponibilizou a estar presente e poder dar os esclarecimentos que fossem reputados de necessários. Após a explicação, procedeu-se á votação para saber se o advogado deveria ou não permanecer na assembleia, tendo sido aprovado por unanimidade a sua continuidade nos trabalhos." 2.21-Assim se a factura que o arguido pagou com verbas do condomínio liquidou o processo intentado contra o administrador do prédio e a assessoria jurídica de uma assembleia de condóminos realizada em Setembro de 2009 (doc. de fls. 205 e 291), assessoria essa aceite, inclusive, pela assembleia, porque razão deveria tal montante sair do seu bolso e não do condomínio? A ter que sair do seu bolso não havia administradores neste país.

    2.22-O depoimento do arguido também é muito claro quanto a esta questão quando diz expressamente que o advogado era do condomínio e não seu, querendo dizer que o trabalho que o advogado desenvolveu foi para proveito do condomínio e não do arguido pessoalmente.

    2.23-Nos documentos de fls. 486 a 496 e na...

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