Acórdão nº 1108/13.8TBMTJ-A.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução29 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: G. ... ... ... ...

e Susana ... ... ... ...

deduziram oposição à execução comum contra eles instaurada pela Caixa ………., S.A.

, requerendo a extinção da execução.

Para o efeito alegaram, em suma, que a exequente considerou que se encontram vencidas todas as prestações referentes a dois empréstimos bancários (mútuos com hipoteca) que com eles celebrou, exigindo o total do capital mutuado acrescido de juros.

Porém, a obrigação não é exigível por não terem incorrido em incumprimento a partir da data que a exequente entendeu verificar-se o mesmo.

A obrigação não é líquida por a exequente não indicar a taxa de juro aplicável e qual a sua natureza.

Os juros de mora à taxa peticionada não são devidos por violação do dever de informação por parte da exequente, sendo, por isso, nula a respetiva cláusula contratual referente à determinação da taxa de juros constantes dos referidos contratos.

Contestou a exequente, alegando, em síntese, que a obrigação é exigível encontrando-se os executados/opoentes em incumprimento quanto a um dos empréstimos desde 04/11/2009, e quanto ao outro, desde junho de 2008.

A obrigação encontra-se liquidada sendo devidos juros de mora independentemente de interpelação.

A taxa de juros peticionada é a que decorre da aplicação do clausulado nos contratos em conformidade com a legislação aplicável ao crédito à habitação com regime bonificado.

Em sede audiência prévia (fls. 107-110), o Ilustre Mandatário dos executados/opoentes fez a seguinte declaração, consignada na respetiva ata: “Os oponentes, melhor compulsando os elementos probatórios juntos, reconhecem neste momento que as datas de incumprimento dos contratos de empréstimo referidos nos autos são as que constam do requerimento executivo.

Deste modo, não colocam em causa a existência do incumprimento no pagamento das prestações do contrato.” Realizado o julgamento foi proferida sentença (fls. 138-173) que julgou a oposição parcialmente procedente nestes termos: “…declaro inexigível a obrigação exequenda relativa aos juros de mora nos termos acima definidos, os quais serão devidos, quanto às prestações vencidas após a citação, a partir desta.

No mais, a oposição é julgada improcedente, e absolvido o Banco do pedido.” Inconformada, a apelou a exequente (fls. 177-184v), apresentando as conclusões de recurso infra transcritas.

Responderam os executados/opoentes, ampliando o recurso (cfr. fls. 187-194v) e apresentando as conclusões infra transcritas.

Foi admitido o recurso (cfr. fls. 198).

A apelante exerceu o contraditório em relação à ampliação do recurso (cfr. fls. 238-245).

Conclusões da apelação da exequente (recurso principal): 1.

-O Tribunal a quo decidiu que a ora Recorrente tem apenas direito aos juros de mora vencidos desde a citação, uma vez que não logrou provar a interpelação dos devedores.

  1. -Salvo o devido respeito, não concorda a ora recorrente com a posição assumida.

  2. -Com efeito, os contratos de mútuo ora em crise são obrigações de prazo certo, liquidável em diversas prestações.

  3. -Ora, dispõe o artigo 781º do Código Civil que “Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas.” 5.

    -E vencimento imediato significa, neste caso, exigibilidade imediata (Antunes Varela, Das obrigações em geral, 6ª ed., II, nº 279, págs. 52 e segs.).

  4. -Porém, esta norma não é imperativa! 7.-Pois permite que as partes determinem de modo diverso, à luz do princípio da liberdade contratual consagrado no artigo 405º do Código Civil.

  5. -Com efeito, estas podem dispensar a realização de qualquer interpelação como condição do vencimento da totalidade do crédito e da respectiva constituição em mora.

  6. -Foi o que se verificou no caso concreto! 10.-Conforme consta da alínea d) da cláusula 12ª do documento complementar que faz parte integrante do título executivo que serviu de base à presente execução, as partes convencionaram que à ora recorrente ficou reconhecido o direito de considerar o empréstimo vencido se o imóvel hipotecado for alienado sem o seu consentimento ou se a parte devedora deixar de cumprir alguma das obrigações resultantes deste contrato.

  7. -E a vontade das partes deve prevalecer! 12.-Foi nesse sentido que decidiram os Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação no Acórdão nº 5366/09.4T2AGD-A.C1: “(…) Significa isto, portanto, que o vencimento imediato daquelas prestações e a constituição em mora do devedor relativamente às mesmas, pressupõe a prévia interpelação para cumprir a totalidade da obrigação (imediatamente vencida e exigível em consequência da falta de pagamento de uma das prestações). Mas isso não significa que as partes, ao abrigo da liberdade contratual que a lei lhes faculta (art. 405º do C.C.), não possam regular a situação em termos diversos, dispensando a realização da interpelação e convencionando, desde logo, que a falta de pagamento de uma das prestações implica, de forma automática, a constituição do devedor em mora relativamente a todas as prestações. (…)” 13.-Ora, no caso em apreço, as partes convencionaram que o empréstimo se vence automaticamente se os oponentes deixarem de cumprir alguma das obrigações resultantes deste contrato.

  8. -Ora, no caso concreto, ficou demonstrado que os oponentes deixaram de pagar as prestações acordadas entre as partes.

  9. -Conclui-se assim que, no caso concreto, as partes outorgantes dispensaram a realização de qualquer interpelação como condição do vencimento da totalidade do crédito e da respectiva constituição em mora.

  10. -Deste modo, deverá a sentença recorrida ser revogada, no que diz respeito aos juros de mora, devendo ser substituída por outra decisão que determine que a ora recorrente tem direito aos juros de mora contabilizados desde o vencimento, ou seja, desde as datas 04.11.2009 e 04.06.2008.

    Conclusões das contra-alegações e da ampliação do recurso: 1.ª-Nos contratos de mútuo em que as dívidas são liquidáveis em prestações - fraccionando a quantia mutuada em meses -, de acordo com o regime consagrado no art. 781.º, do C. Civil, o não pagamento de uma delas não importa a exigibilidade imediata de todas, cabendo ao credor interpelar o devedor para proceder ao pagamento da totalidade da dívida.

    1. -Isto porque face ao disposto nesse dito art. 781.º do C.Civil, deve-se considerar que o imediato vencimento de todas as prestações e a constituição em mora relativamente às mesmas, pressupõe a prévia interpelação do devedor para cumprir a prestação nesses termos (na sua totalidade). Se o credor não interpela o devedor na data do incumprimento da obrigação, esta torna-se pura e fica abrangida pelo disposto no artigo 805.º, n.º 1 do C. Civil.

    2. -Inexistindo interpelação extra-judicial, e não tendo mutuário e mutuante convencionado a dispensa de interpelação, vale como tal a citação sendo devidos juros de mora a contar da citação, inclusivé aqueles que o Exequente classifica de juros vincendos cujo início de contagem se reporta à data do incumprimento.

    3. -Não merece qualquer censura jurídica a sentença que julga parcialmente procedente a oposição à execução com os fundamentos supra enunciados e determina que são devidos juros de mora, onde se incluem os designados por vincendos, apenas a contar da citação.

    4. -O documento probatório junto ao processo na contestação à oposição através do qual se enumeram cronologicamente as taxas de juro remuneratórias mais elevadas para operações de crédito à habitação prova, tão-só, que naquele dia e mês, daquele concreto ano, eram aquelas as taxas de juro remuneratórias mais elevadas para operações de crédito à habitação e não têm o condão probatório de atribuir a sua vigência para além da última data ali fixada.

    5. -Incorre em erro de julgamento sobre matéria de facto a sentença que dá como provado que a taxa de juro remuneratória mais elevada não sofreu alterações desde a data de 01.07.2003 quando os executados fizeram juntar aos autos, em tempo, documento público do Banco de Portugal sendo, ainda, notório, que identifica a evolução das taxas de juro posteriores àquela data e que espelham o período de tempo a que se reporta a mora, que evidenciam valores muito inferiores ao que foi acolhido pelo tribunal a quo.

    6. -Actua em abuso de direito e má-fé o mutuante que falta ao dever de informação ao mutuário, que sob ele impende nos termos do artigo 75.º, n.º 1 do Regime Geral Das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, da taxa mais elevada de juros remuneratórios daquela natureza porque a dinâmica do mercado financeiro não pode deixar aprisionado o mutuário a uma taxa de juro convencionada quando a própria cláusula prevê poder vir a sofrer alterações diariamente.

    7. -Tal comportamento omissivo viola o disposto no artigo 75.º, n.º 1 do Regime Geral Das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e os artigos 334.º e 227.º do C.C., sendo nulas as cláusulas 4.ª e 5.ª dos documentos complementares.

    8. -Em consequência da nulidade indicada, a taxa de juro de mora a aplicar deverá ser a taxa de juro remuneratória vigente em cada dia, acrescida de 2%, a contar da citação.

    9. -Por isso, padece de erro de julgamento de direito a sentença que dando como provado que, a título de cláusula penal convencionada, em caso de mora são devidos juros à taxa mais elevada de juros remuneratórios que, em cada um dos dias em que se verificar a mora, estiver em vigor na Caixa credora para operações activas da mesma natureza, não dando provimento aos Executados, por violação do dever de informação devido ao devedor de qual a taxa de juro vigente para cada um dos dias em que se verificar a mora nos termos do disposto no Decreto-lei n.º 220/94, de 23.08, e no artigo 75.º, n.º 1 do Regime Geral Das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

    Pelo exposto: a)deverá ser a presente apelação julgada improcedente, por não provada, e ser confirmada...

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