Acórdão nº 56/14.9T8PTS.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução14 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 30.6.2000 António, sua mulher, Dolores e Joana, intentaram no Tribunal Judicial da Comarca da Ponta do Sol ação declarativa de condenação, com processo ordinário, contra Companhia de Seguros (…), S.A.

, requerendo igualmente a intervenção provocada de Maria.

Os AA. alegaram que, juntamente com a Chamada Maria, são comproprietários e compossuidores de um prédio urbano, constituído por um edifício com dois pisos, sito na freguesia da (…), ilha da Madeira. No dia 6 de julho de 1996 um veículo pesado de mercadorias despistou-se e embateu contra esse edifício, provocando-lhe sérios danos, que impossibilitam a sua utilização. A proprietária do aludido veículo havia transferido para a ora R. a respetiva responsabilidade civil automóvel.

Os AA. terminaram pedindo que, julgada a ação procedente por provada, fosse a R. condenada a:

  1. Reparar o prédio identificado no art.º 1.º da petição inicial, nas exatas condições em que o mesmo se encontrava à data do acidente, nos termos referidos nos artigos 17.º a 29.º da petição; b) Pagar aos AA. e à Chamada Interveniente a quantia mensal de Esc. 150 000$00, por cada mês de impossibilidade de ocupação do referido prédio, a contar da citação, quantia essa acrescida de juros à taxa legal, a contar da citação e até à conclusão da reparação, a título de indemnização pela dita não ocupação.

    Foi admitido o chamamento da aludida interveniente que, citada, nada disse.

    A R. seguradora contestou, impugnando, por desconhecimento, os danos alegados pelos AA. e afirmando que em julho de 1998 havia declarado aos AA. estar disposta a pagar o montante de Esc. 2 866 366$00, correspondente a orçamento elaborado por uma empresa para a reparação do edifício, proposta que já anteriormente efetuara em maio de 1997. Mais alegou ter pago a outros lesados pelo mesmo sinistro diversas indemnizações, que quantificou, que deveriam ser tidas em consideração na decisão a proferir na presente ação.

    A R. terminou concluindo que a ação deveria ser julgada de harmonia com os factos já provados e aceites pela R. e os que se viessem a apurar e as disposições legais aplicáveis.

    Os AA. apresentaram réplica que foi julgada não escrita em despacho saneador lavrado em 22.01.2002, que antecedeu imediato despacho de seleção da matéria de facto assente e de fixação da base instrutória.

    Realizou-se perícia colegial.

    A audiência de discussão e julgamento realizou-se nos dias 27.6.2012, 03.10.2012, 28.11.2012 e 21.12.2012, data em que foi proferida decisão de facto.

    Em 27.02.2013 foi emitida sentença, que julgou a ação parcialmente procedente e consequentemente condenou a R. a pagar aos AA. e à Chamada a quantia de € 14 297,37, na proporção de 1/3 para os primeiros AA., 1/3 para a segunda A. e 1/3 para a Chamada, absolvendo-se a R. da restante parte do pedido.

    Os AA.

    apelaram da sentença, tendo apresentado alegações em que formularam as seguintes conclusões:

    1. A douta sentença recorrida é nula, porque condena em objecto diverso do pedido, como decorre do que preceitua a alínea e) do número 668.º do Código de Processo Civil, doravante apenas CPC.

    B) O Tribunal a quo julgou incorrectamente os quesitos levados aos pontos 15.º e 16.º da douta base instrutória; C) Impõe-se, assim, que tais concretos pontos de facto, as respostas aos quesitos 15.º e 16.º, sejam reformuladas de molde a que a resposta dada ao quesito 15.º esclareça que as obras ali aludidas não eram aquelas que os Autores reputavam necessárias a proceder às reparações dos danos padecidos pelo imóvel; D) E, no que ao quesito 16.º concerne, de forma a que a resposta a este quesito mencione que os Autores sempre justificaram à Ré porque não aceitavam as propostas desta.

    E) As respostas dadas aos quesitos 15.º e 16.º da douta base instrutória, devem, por isso, serem modificadas; F) A sentença objecto do presente recurso, ademais, viola o preceituado no número 1 do artigo 12.º, 217.º, 218.º, 342.º, 508.º e 562.º do Código Civil e ainda o artigo 6.º do Decreto-lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-lei n.º 3/96, de 25 de Janeiro, em vigor à data dos factos; Os apelantes terminaram pedindo que o recurso fosse julgado procedente e, consequentemente, a Ré condenada no pedido deduzido na petição inicial, tudo com as demais consequências legais.

    A R. não contra-alegou, mas interpôs apelação subordinada, em que rematou com conclusões que, atenta a sua extensão e devido a sérias dificuldades evidenciadas na sua transcrição por meios informáticos, assim se sintetizam, quanto ao seu objeto:

  2. Deve aditar-se, ao abrigo do art.º 662.º n.º 1 do CPC, a matéria de facto alegada no art.º 10.º da contestação; b) A responsabilidade pelo acidente em causa nos autos emerge apenas do risco, pelo que está sujeita ao limite máximo de Esc. 2 000 000$00, correspondente a € 9 975,96; c) Havendo que ratear a indemnização devida pelos diversos lesados; d) Tendo-se apurado que a indemnização devida aos AA./recorridos era de € 14 297,37 e estando provado que a R. pagou a quatro outros lesados o total de € 23 258,87, era devida aos AA., em rateio, a quantia de € 3 797,77; e) Os AA. pedem a reparação do prédio nos exatos termos descritos na petição inicial; ora, esses termos não se provaram, pelo que o pedido deve improceder; f) A R. não procedeu à reparação do prédio por mora imputável aos AA., pelo que, atendendo ao agravamento da situação do prédio decorrente da mora, nenhuma obrigação impende sobre a R.; g) A mora dos AA. é reconhecida na sentença recorrida, a qual, ao não absolver na íntegra a ora apelante, enferma de nulidade por contradição com os seus fundamentos – art.º 615.º n.º 1 alínea c) do CPC.

    A apelante/R.

    terminou pedindo que a sentença proferida fosse revogada e substituída por acórdão que determinasse a total improcedência da ação.

    Os AA. contra-alegaram, pugnando pela improcedência da apelação da R. e pela total procedência da ação, nos termos explanados na sua apelação.

    A instância foi suspensa por óbito da A. Joana Mendes de Freitas.

    Por sentença de 09.7.2015 Luís foi julgado habilitado a prosseguir os termos da causa no lugar da falecida A. Joana.

    Foram colhidos os vistos legais.

    FUNDAMENTAÇÃO Pela interligação do seu objeto, apreciar-se-á conjuntamente ambas as apelações.

    As questões que estes recursos suscitam são as seguintes: Nulidades da sentença; impugnação da matéria de facto; direito dos AA. e da Chamada.

    Primeira questão (nulidades da sentenç

  3. Apreciar-se-á primeiramente a nulidade invocada pelos AA. e, depois, a arguida pela R..

    Nulidade invocada pelos apelantes/AA.

    : Os AA. entendem que a sentença padece da nulidade prevista na alínea e) do art.º 668.º do CPC, na medida em que, tendo os AA. peticionado a condenação da R. na reconstituição natural do seu prédio, o tribunal condenou a R. no pagamento de uma indemnização.

    Os preceitos de natureza adjetiva a ter aqui em consideração são os constantes do CPC de 1961, na medida em que a sentença ora impugnada foi proferida em fevereiro de 2013, data anterior à da entrada em vigor do CPC atual (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho), pelo que, ressalvada menção expressa em contrário, as normas doravante referidas estarão contidas no anterior CPC.

    É sabido que o tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes (n.º 1 do art.º 3.º). Sendo que a causa se define pelos sujeitos, pela causa de pedir e pelo pedido (cfr. artigos 497.º e 498.º). Cabendo ao autor indicar, na petição inicial, o pedido (art.º 467.º n.º 1 alínea e)), que é, na formulação do art.º 498.º n.º 3, o efeito jurídico que se pretende obter. Citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, à causa de pedir e ao pedido, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei (art.º 268.º). Sendo que a modificação do pedido (assim como da causa de pedir), dependerá sempre da vontade do autor (artigos 272.º e 273.º). E a omissão do pedido, a sua ininteligibilidade, contradição com a causa de pedir ou incompatibilidade substantiva entre pedidos acarreta a nulidade insanável do processo, por ineptidão da petição inicial (art.º 193.º).

    Destas regras deflui, como consequência expressa no art.º 661.º, que “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir” (n.º 1). Constituindo causa de nulidade da sentença a condenação “em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido” (alínea e) do n.º 1 do art.º 668.º).

    Revertamos ao caso dos autos.

    Nesta ação os AA. formularam dois pedidos:

  4. O de condenação da R. a “reparar o prédio identificado no artigo 1º deste petitório, nas exactas condições em que o mesmo se encontrava à data do acidente, nos termos em que é referido nos artigos 17º a 29º desta petição”; b) O de condenação da R. no pagamento aos AA. e à Chamada interveniente da quantia mensal de Esc. 150$00, por cada mês de impossibilidade de ocupação do referido prédio.

    Ou seja, o segundo pedido consiste na condenação da R. na prestação de uma obrigação pecuniária. O primeiro pedido consiste na condenação da R. numa prestação de facere, em termos que se mostram concretizados nos artigos 18.º a 29.º da petição inicial, onde se lê o seguinte: “18.º Pelo que os Autores reclamam da Ré a eliminação dos mencionados danos, exigindo que esta proceda à reconstrução do edifício identificado no artigo 1º deste articulado.

    1. Devendo para o efeito, no interior do aludido edifício, realizar a reparação das paredes interiores em ambos os pisos.

    2. Reparar os tectos falsos interiores do rés-do-chão e primeiro andar.

    3. Proceder à reposição integral do...

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