Acórdão nº 211/15.4JELSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS ESP
Data da Resolução08 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: * No âmbito do Processo Comum Colectivo supra id., que corre termos na Comarca de Lisboa – Instância ... – ...ª Secção Criminal – J ..., foi o arguido Rafael ..., com os demais sinais dos autos, condenado, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21°, n° 1, do D.L 15/93 de 22/01, na pena quatro anos e três meses de prisão.

Inconformado com o teor de tal decisão interpôs aquele arguido o presente recurso pedindo a suspensão da execução da pena que lhe foi aplicada.

Apresentou para tal as seguintes conclusões: O acórdão afastou a hipótese de suspender a pena, de acordo com o disposto no art.° 50 do CP.

A prevenção geral, neste caso em concreto, não se atinge com um enclausuramento do recorrente durante quatro anos e três meses numa prisão, e depois expulsar o arguido para o seu país de origem, que, inexistem, conforme conclui o Douto Tribunal de que ora se recorre, quaisquer exigências a nível de prevenção especial, pois tendo em conta que a pena deve ter uma finalidade preventiva e não uma finalidade repressiva, a pena de prisão efectiva aplicada ao ora recorrente é destituída de sentido, violando assim os artigos 70.° e 40° do CP.

Deveria portanto ser suspensa na sua execução a pena aplicada cuja medida o arguido não contesta, não o fazendo, não parece à defesa que o acórdão tenha neste caso concreto, acautelado os princípios pelos quais se aplica uma pena.

Até porque como se disse, não deve ser o tribunal a aplicar as políticas de prevenção e combate ao tráfico de droga, mas sim a aplicar a lei, e nesses termos a mesma permite a suspensão da execução, nos termos já enunciados.

As finalidades da punição devem ser a tutela dos bens jurídicos e a reinserção social do arguido.

O arguido encontra-se plenamente inserido, quer socialmente, quer familiarmente, tem nacionalidade portuguesa, vive em casa arrendada que partilha com amigos.

O arguido já tem já a noção dos aspectos negativos que a prisão pode trazer, pois está detido desde junho de 2015.

O arguido confessou a prática do crime sem reservas, e com total colaboração com o tribunal.

9)O arguido reconhece a ilicitude da sua conduta, e não contesta a medida da pena, apenas não concorda com a sua não suspensão. pena, apenas não concorda com a sua não suspensão.

Não se conforma o arguido com a não aplicação do regime da suspensão da execução da pena de prisão; A situação actual do arguido demandava solução diversa, pois o arguido tem a sanção de expulsão do território nacional, e não fará sentido a ressocialização e depois a expulsão.

Face a todo o supra exposto, deverá a pena aplicada ser suspensa na sua execução, ser o arguido libertado e conduzido às autoridades competentes para o seu repatriamento.

Respondeu o MP, pugnando pela improcedência do recurso nos seguintes termos: O Ministério Público concorda na íntegra com o douto acórdão proferido, nomeadamente com a fixação da matéria de facto efectuada pelo tribunal, considerando estar aquele devidamente fundamentado e ter feito correto enquadramento jurídico dos factos.

Alega o arguido que não se conforma com a não aplicação do regime da suspensão da execução da pena de prisão, não tendo o Tribunal ponderado devidamente a sua situação actual, as circunstâncias da prática dos factos, o seu registo criminal.

Ora, salvo melhor opinião, cremos não ter o recorrente razão no alegado em sede de recurso, como procuraremos demonstrar.

A conduta do arguido integra a previsão normativa do art.° 21° do DL 15/93, de 22.01.

Tal crime é punível com pena de prisão de 4 a 12 anos.

Como se pode constatar o Tribunal aplicou ao arguido uma pena ligeiramente superior ao limite mínimo da pena abstractamente aplicável.

Perante o quadro fáctico descrito pela decisão recorrida não foi excessivamente dura a pena aplicada em concreto. O Tribunal limitou-se, afinal, a graduar a sanção em quantum muito próximo do mínimo legal, ou seja, numa moldura de 4 a 12 anos, optou-se por um período de 4 anos e 3 meses.

Parece-nos, pois, que o Colectivo fez correcta interpretação dos critérios contidos nas disposições conjugadas dos art°s 40° n°l, 71° n°s 1 e 2 do C.Penal.

Atendeu-se, cremos, à vantagem da reintegração tão rápida quanto possível do arguido em sociedade, sem esquecer, porém, que a pena deve visar também, de forma equilibrada, a protecção dos bens jurídicos e a prevenção geral e especial, neste caso particularmente relevante. As fortes exigências de prevenção, a gravidade da actuação do arguido, o meio que utilizou e o dolo com que actuou tinham, obviamente, em conformidade e de acordo com os critérios acima referidos, de ser traduzidos em pena correspondente à medida da sua culpa, o que o Tribunal recorrido conseguiu de forma justa, e com respeito pelas finalidades visadas pela punição.

Não pode esquecer-se, porém, que o arguido detinha quantidade considerável de estupefaciente (cocaína) que se destinava a ser comercializado e que, uma vez cortado, abasteceria decerto muitas centenas de consumidores, manifestando, assim, elevada insensibilidade pelo destino de tantos jovens e pela saúde pública em geral e pela vaga de crimes contra o património e contra as pessoas que tanto alarme social causa aos demais cidadãos.

O Tribunal Colectivo, e a nosso ver bem, não suspendeu a execução daquela pena de prisão como pretende o arguido.

Nos termos do disposto no art.° 50°, n°l do Código Penal," O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".

Assim, a suspensão da aplicação da pena, apenas terá lugar quando se verifiquem cumulativamente duas circunstâncias: 1°-Que o Tribunal se convença de que a ameaça da pena evitará a repetição de condutas delituosas futuras, atendendo: A personalidade do arguido; Às suas condições de vida; Às circunstâncias do facto punível.

  1. -Que a suspensão da execução da pena não coloque irremediavelmente em causa a tutela dos bens jurídicos e não contenda com o sentimento de reprovação social do crime e com a confiança da comunidade nas instâncias judiciais.

Como refere Figueiredo Dias " pressuposto material da aplicação do instituto é que o Tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente: que a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para afastar o delinquente da criminalidade". Para tal, " o tribunal atenderá especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto". Contudo," apesar da conclusão do Tribunal por um prognóstico favorável, a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (...) Estão aqui em questão não quaisquer considerações de culpa, mas exclusivamente considerações de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. Só por estas exigências se limita sempre o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto ora em análise".

Ou seja, as considerações de prevenção especial de socialização têm sempre por limite considerações de prevenção geral positiva impostas pela defesa do ordenamento jurídico, sendo que " desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias".

Mesmo sem fazer referência às exigências de prevenção geral a que acima se alude, sob a forma de conteúdo mínimo de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico, considera-se que não estão sequer reunidos no caso em apreço os pressupostos atinentes à personalidade, circunstâncias do delito, comportamento do arguido após a prática do facto ilícito e circunstâncias da sua vida, que justificassem a aplicação de uma pena de substituição da prisão decretada.

Os factos provados e atinentes à personalidade, condições de vida, e comportamento do arguido após a prática do delito, não assumem qualquer relevo para fundamentarem um juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena, na vertente da prevenção especial e, bem pelo contrário, desaconselham totalmente a sua aplicação.

Mas, mesmo que se entendesse que tais razões eram ponderosas do ponto de vista da prevenção especial de socialização nunca o seriam do ponto de vista da prevenção geral, já que a suspensão da execução da pena a um traficante de droga - ainda que mero detentor - ofende, inegavelmente, a imperatividade da defesa do Ordenamento Jurídico.

O tráfico de estupefacientes é um flagelo das sociedades hodiernas sendo responsável, directa ou indirectamente, pela morte de milhares de pessoas, atingindo muitas outras na sua integridade física...

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