Acórdão nº 8965/12.3TDLSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução08 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO 1.

Nos presentes autos com o NUIPC 8965/12.3TDLSB, da Comarca de Lisboa - Lisboa - Instância Local – Secção Criminal – J2, foi proferida sentença, aos 24/06/2015, que condenou o arguido A na pena única de 1 ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática de um crime de peculato, p. e p. pelo artigo 375º, nº 1, com referência ao artigo 386º, nº 1, alínea d), um crime de burla, p. e p. pelo artigo 217º, nº 1 e um crime de burla informática (em co-autoria), p. e p. pelo artigo 221º, nºs 1 e 5, alínea a), todos do Código Penal.

Pela mesma decisão foi condenado também o arguido A na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática, em co-autoria com A, de um crime de burla informática, p. e p. pelo artigo 221º, nºs 1 e 5, alínea a), do Código Penal. Não interpôs este arguido recurso.

2. A não se conformou com o teor da decisão e dela interpôs recurso, para o que formulou as seguintes conclusões (transcrição): i O recorrente foi condenado pela prática, como autor material e na forma consumada de um crime de um crime de peculato, p. e p. pelo art.º 375.

º, n.º 1, com referência ao art.º 386.º, n.

o 1, alínea d), como autor material e na forma consumada de um crime de burla, p. e p. pelo art.º 217.º, n.

o 1, como co-autor material e na forma consumada de um crime de burla informática, p. e p. pelo art.º 221.

º, n.º 1 e 5 alínea a), com referência ao art.º 202.º a), todos do CP, respectivamente na pena de um ano de prisão, na pena de seis meses de prisão, na pena de um ano de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano e seis meses de prisão, nos termos no art.º 50.º, n.

o 1 e 5 do CP.

ii O douto Tribunal ad quo considerou provado que os arguidos, ainda que em quantitativos diferentes, enriqueceram com os valores correspondentes a todos os abastecimentos feitos com os cartões "Galp Frota" pertencentes à Reitoria da Universidade de Lisboa entre 16 de Março de 2012 e 20 de Agosto de 2012.

iii Contudo, neste periodo de mais de 5 meses, não é possível que, de acordo com as regras de experiência comum, não existissem no universo de todos os abastecimentos efectuados, alguns, vários ou mesmo a maior parte que efectivamente tivessem sido destinados ao serviço da Reitoria da Universidade de Lisboa. Ou seja, não se logou provar, de todos os abastecimentos relacionados nos artigos 18 e 19 na acusação, quais foram efectuados ao serviço da Reitoria e quais, de acordo com a tese acusatória, não foram.

iv Por não ter sido determinado e não ter resultado provado, o quantitativo de abastecimentos destinados ao normal serviço da Reitoria — com distinção dos abastecimentos que não tinham este fim - não poderia o arguido igualmente ser condenado nos termos do n.º 5, alínea a) do art.º 221.

0 do CP, quanto ao crime de burla informática, nem ser condenado na totalidade do pedido de indeminização cível.

v O concurso efectivo de crimes de crime é real quando o agente pratica vários actos que preenchem autonomamente vários crimes ou várias vezes o mesmo crime (pluralidade de acções) e é ideal quando através de uma mesma acção se violam normas penais ou a mesma norma repetidas vezes (unidade de acção). A par categoria de concurso efectivo de crimes temos a de concurso aparente, onde as leis penais concorrem só na aparência, excluindo umas as outras, segundo regras de especialidade, subsidariedade ou consumpção.

vi No caso concreto verifica-se que, entre os crimes de burla e de burla informática p. e p. respectivamente nos art.ºs 217.º e 221.º do CP e o crime de peculato, p. e p. no art.º 375.º do CP, há uma relação de concurso aparente, não podendo desta forma o arguido ser condenado por ambos, isto é, aqueles e este, preceitos legais.

vii A douta Sentença violou, pelo exposto, o disposto no art.º 30.º, n.

o 1 do CP na medida em que considerou que, pela conduta do agente foram efectivamente e simultâneamente praticados os crimes de peculato, por um lado e, por outro lado, burla bem como burla informática.

viii De todo o modo e sem prejuízo da existência de concurso aparente, conforme descrito, no que toca ao crime de burla (p. e p. pelo art.º 221.º do CP) relativo aos factos dados como provados na douta Sentença, descritos em t), u) e v) (cfr. pág. 3 da douta Sentença) o mesmo não deveria ter sido dado como provado por não ter sido produzida em julgamento prova suficiente para tal.

ix Pelo que, neste parte e ainda quanto ao descrito em iv, supra, verificou-se o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a que alude o art.º 410.º, n.

o 2, alínea a) do CPP.

Neste termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, decidindo-se como se propugna supra, absolvendo o arguido dos crimes de burla e burla informática pelos quais foi condenado.

3. O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo respondeu à motivação de recurso, pugnando pela sua improcedência.

4.

Resposta apresentou também a demandante civil Universidade de Lisboa, concluindo pela manutenção da sentença revidenda nos seus exactos termos.

5.

O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

  1. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de os autos retornarem à 1ª instância a fim de ali se efectuarem os procedimentos tendentes à liquidação e eventual pagamento da multa devida por o recurso ter sido interposto no 1º dia útil após o decurso do prazo de 30 dias a que se refere o artigo 411º, nº 1, alínea b), do CPP, não se mostrando paga a multa prevista na alínea a), do artigo 107º-A, do mesmo diploma legal.

  2. No exame preliminar, o Relator proferiu decisão sumária, aos 17/11/2015, por considerar verificar-se circunstância obstativa ao conhecimento imediato do recurso, nos termos do artigo 417º, nº 6, alínea a), do CPP pois, de acordo com os elementos dos autos constantes ao momento, o recurso teria dado entrada em juízo no 1º dia útil após o decurso do prazo de 30 dias estabelecido no nº 1, do artigo 411º, do CPP, pelo que estava sujeita essa prática à sanção prevista na alínea a), do artigo 107º-A, do CPP e, não se mostrando paga a multa respectiva, visto que a validade do acto depende desse pagamento, nos termos do consagrado no artigo 139º, nº 5, do CPC, estava presente a referida circunstância.

  3. Notificado desta decisão sumária, o recorrente veio reclamar para a conferência, argumentando, em síntese, que enviou a peça processual recursória em 09/09/2015, por correio electrónico e, por isso, dentro do prazo legal de 30 dias, juntando cópia da mensagem transmitida.

    Conclui impetrando a apreciação do recurso interposto, por inexistir circunstância que obste ao respectivo conhecimento.

  4. A reclamação para a conferência foi admitida.

  5. Foram colhidos os vistos, após ao que o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

    II - FUNDAMENTAÇÃO 1. Âmbito do Recurso O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no artigo 410º, nº 2, do CPP – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série A, de 28/12/1995.

    No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação de recurso, as questões que se suscitam são as seguintes: Vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

    Enquadramento jurídico-penal da conduta do recorrente.

    Quantia atribuída a título de indemnização civil.

    2. A Decisão Recorrida O Tribunal a quo deu como provados os seguintes factos (transcrição): a) À data dos factos, o arguido A era funcionário da Universidade de Lisboa, integrando o mapa de pessoal não docente da Reitoria da Universidade de Lisboa, na categoria de assistente operacional, e desempenhava as funções de motorista.

    1. Funções que exerceu até ao dia 12 de Agosto de 2013, data em que foi demitido.

    2. À data dos factos, a Universidade de Lisboa era titular dos cartões "Galp Frota ", com os números 708257502218000902 e 708257502218000803.

    3. Que funcionavam em postos "Galp" como meio de pagamento de combustível mediante a sua passagem no terminal respectivo e introdução de um código "PIN", composto por quatro dígitos.

    4. Tais cartões integravam a modalidade "Veículo", ou seja, encontravam-se associados às matrículas de duas viaturas pertencentes à Universidade de Lisboa.

    5. Concretamente, o cartão com o número 708257502218000902 estava associado à viatura da marca e modelo Peugeot 406 "Executiv» ", com a matrícula..._..._QF g) O cartão com o número 708257502218000803 estava associado à viatura da marca e modelo Peugeot 406 "Premium ", com a matrícula..._..._OT.

    6. Tendo ambos sido entregues a A para abastecimento exclusivo das mencionadas viaturas, destinadas ao transporte do Reitor da Universidade, em virtude das funções de motorista que lhe estavam acometidas.

    7. À data dos factos, o arguido A era funcionário do posto de abastecimento de combustível "Auto-Fascinante, Estação de Serviços e Oficinas, Lda", sito na Estrada dos Arneiros, nº 40, A-C, em Lisboa.

    8. Em data não concretamente determinada do ano de 2012, mas seguramente anterior ao dia 16 de Março, A traçou um plano, conjuntamente com A. , que conhecia as funções que aquele desempenhava na Universidade de Lisboa, e a sua qualidade de funcionário.

    9. Nos termos do qual, num primeiro momento, o arguido António abster-se-ia de introduzir no sistema informático do posto os abastecimentos de...

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