Acórdão nº 1544/16.8T8CSC.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Janeiro de 2018
Magistrado Responsável | ONDINA CARMO ALVES |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA.
I.
–RELATÓRIO.
JOSÉ ….
, residente na Rua …., intentou, em 24.05.2016, a presente acção de condenação, com processo comum, contra MARIA …, residente na ….., pedindo que esta seja condenada a restituir-lhe a quantia de 30.000,00 €, que este lhe entregou no dia 2 de Novembro de 2004, a título de enriquecimento sem causa.
Fundamentou o autor, no essencial, esta sua pretensão no facto de ter entregue tal quantia à ré, sua mulher, para que esta pudesse completar o preço do andar que iria adquirir no princípio de Novembro seguinte, e esta ficara de os devolver até ao dia 2 de Novembro de 2010, o que não ocorreu.
Por essa razão, o autor intentou contra a ré acção destinada a obter o pagamento do empréstimo que lhe fez em 2 de Novembro de 2004. Contudo a acção foi julgada improcedente, por não provada, por não se ter provado que a tradição patrimonial tivesse tido como causa o empréstimo que fez à ré.
Assim, vem agora o autor peticionar a ré, com base no enriquecimento sem causa.
Citada, a ré apresentou contestação, em 24.06.2016, por excepção, invocando a prescrição, bem como o caso julgado, e impugnou, no essencial os factos alegados na petição inicial, pugnando pela improcedência da pretensão, por infundada, já que a entrega de tal quantia foi feita a título de doação.
Notificado, o autor respondeu, em 31.10.2016 às excepções invocadas pela ré.
Dispensada a audiência prévia, foi proferido o despacho saneador, em 09.12.2016, onde foi julgada improcedente a excepção de caso julgado, sendo relegado o conhecimento da prescrição para a sentença. Foi identificado o objecto do litígio, consistente no apuramento da obrigatoriedade da restituição pela ré ao autor da quantia peticionada por enriquecimento sem causa e dispensada a enunciação dos temas da prova, invocando-se a sua simplicidade e o disposto no artigo 596.º, n.º 1, do CPC. Foram ainda admitidos os meios de prova e designada data para a realização do julgamento.
Foi levada a efeito a audiência final, em 07.03.2017, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 24.03.2017, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Pelo exposto, de facto e de direito, decide-se julgar a acção improcedente por não provada, dela absolvendo a R. MARIA.
Custas pelo A. nos termos do art.º 527º do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
Inconformado com o assim decidido, o autor interpôs recurso de apelação, em 08.05.2017, relativamente à sentença prolatada.
São as seguintes as CONCLUSÕES do recorrente: i.
– O A. e a Ré casaram, entre si, no regime da separação de bens, no dia 8 de Março de 1996 (ponto 1. dos factos dados como provados da, aliás douta, sentença recorrida); ii.
– A. e Ré são titulares do usufruto da casa de morada de família (sita na Rua de ….), direito que apenas se extingue, no todo, com a morte do cônjuge que sobreviver ao outro (ponto 10. dos factos dados como provados da, aliás douta, sentença recorrida); iii.
– Em Setembro de 2004, a Ré encetou negociações para adquirir ao Montepio Geral uma fracção autónoma sita em T., pelo preço de € 82.500,00, não dispondo da totalidade desse montante (pontos 2. e 3. dos factos dados como provados da, aliás douta, sentença recorrida); iv.
– O A. entregou à Ré € 30.000,00, em numerário, que esta utilizou para completar o preço da fracção autónoma que efectivamente adquiriu ao Montepio e cuja propriedade se encontra registada apenas a favor dela (pontos 5. e 8. dos factos dados como provados da, aliás douta, sentença recorrida); v.
– A fracção autónoma adquirida pela Ré (também com dinheiro do A.) é utilizada gratuitamente, como habitação de uma das suas filhas (ponto 16. Dos factos dados como provados da, aliás douta, sentença recorrida); vi.
– Desde meados de 2012, A. e Ré fazem vidas separadas, continuando a ora apelada a residir na casa de morada de família, de que é usufrutuária (ponto 12., 14. e 10. dos factos dados como provados da, aliás douta, sentença recorrida); vii. A Ré não restituiu ao A. € 30.000,00 que ele lhe entregou em 2 de Novembro de 2004 (ponto 11. Dos factos dados como provados da, aliás douta, sentença recorrida); viii.
– Não se provou que o A. tenha oferecido à Ré a quantia de € 30.000,00 cuja restituição peticiona nesta acção (alínea b) dos factos dados como não provados da, aliás douta, sentença recorrida); ix.
– Para efeitos patrimoniais entre vivos, o regime da separação de bens é semelhante ao que se passa nas uniões de facto, não existindo bens comuns; x.
– Tendo cessado a coabitação entre o A. e a Ré (ainda que subsista o vínculo conjugal), pretende o ora apelante que lhe sejam restituídos os € 30.000,00 que entregou à Ré para possibilitar a compra do mencionado apartamento; xi.
– A história trazida aos autos pela Ré (teria sido do A. a iniciativa de a convencer a comprar o apartamento, para o que este lhe doou € 30.000,00, sendo esta acção uma forma de pressão para a forçar a sair da casa de morada de família, com renúncia ao usufruto de que é beneficiária, tendo já existido outras formas de pressão, como seja a suspensão do pagamento do gás, da internet e do telefone e o desleixo do jardim e da piscina) foi dada como não assente nas alíneas a), c), d), e), f), g) e h) dos factos dados como não provados da, aliás douta, sentença recorrida); xii.
– Ainda que impenda sobre o A. o ónus de provar a inexistência de causa para o enriquecimento da Ré, a análise conjugada dos factos dados como provados e como não provados pela Mma. Juiz a quo, à luz das regras da experiência comum, impõe a conclusão de que esse ónus foi cumprido; xiii.
– O ónus de provar a inexistência de causa para o enriquecimento não pode ter por objecto uma infinitude de situações (ao sabor da imaginação de quem os alega), mas o facto invocado pela Ré como justificador da deslocação patrimonial, que no caso foi a doação; xiv.
– A forma como se mostra redigida a alínea b) dos factos dados como não provados na, aliás douta, sentença recorrida, evidencia que não existiu tal doação (diferentemente sucederia se a Mma. Juiz a quo tivesse dado como não provado que o A. não ofereceu os € 30.000,00 à Ré); xv.
– A Ré está obrigada a restituir € 30.000,00 ao A., com base no instituto do enriquecimento sem causa; xvi.
– A Mma. Juiz a quo procedeu, na, aliás douta, sentença recorrida, a errada interpretação e aplicação do art. 473º. do Código Civil.
Pede, por isso, o apelante, que seja concedido provimento à apelação e revogada a, aliás douta, sentença recorrida.
A ré apresentou contra-alegações, em 31.05.2017, propugnado pela manutenção da sentença recorrida e formulou as seguintes CONCLUSÕES: i.
– O enriquecimento sem causa depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a)- a existência de um enriquecimento; b)- que esse enriquecimento não tenha causa que o justifique; c)- que ele seja obtido à custa do empobrecimento de quem pede a restituição e; d)- que não haja um outro acto jurídico entre o acto gerador do prejuízo e a vantagem obtida pelo empobrecimento; e)- que a lei não...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO