Acórdão nº 1461/16.1PFLSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: 1.

–Nos presentes autos com o NUIPC 1461/16.1PFLSB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo de Instrução Criminal – J3, foi proferido, aos 26/10/2017, despacho de não pronúncia dos arguidos JA, ML e RP.

  1. –O assistente ALS não se conformou com esse despacho e dele interpôs recurso, impetrando que seja substituído por outro que pronuncie os arguidos por factos integradores da prática de um crime de difamação, p. e p. pelo artigo 180º, nº 1, do Código Penal.

    2.1–Extraiu o recorrente da motivação as seguintes conclusões (transcrição): 1ª–O presente recurso vem interposto do douto Despacho proferido em 26.10.2017 no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de Instrução Criminal de Lisboa - Juiz 3, que decidiu não pronunciar os arguidos JA, ML e RP pela prática do crime de difamação que lhes era imputado na acusação particular 2ª–" Para sustentar a sua decisão o Tribunal a quo concluiu que "... os arguidos não poderiam em caso algum, por referência às expressões vertidas na acusação particular, preencher com a sua conduta os elementos típicos objectivos e subjectivos do crime de difamação." 3ª–Está em causa o "Relatório de Averiguação" de acidente automóvel com data 11.04.2013 com anexos, que foi elaborado pelo perito de seguros RP, sob a supervisão de e sob a direcção de JA, aqui arguido, em que na página 9 do referido e sob a epígrafe "Factos Provados" fez-se constar que "Houve tentativa por parte do CVT em apresentar faltas testemunhas. (Sr. IM e VM) ".

    1. –Esses factos falsos são ofensivos da honra e do bom nome de outrem como é o caso do assistente e não se almeja, que tais factos foram proferidos na prossecução de um interesse legitimo.

    2. –Não existindo quaisquer factos que possam suportar as expressões que a este respeito ficaram a constar no "Relatório de Averiguação", e que passaram a ser mais um elemento a ser considerado na decisão sobre a imputação da responsabilidade pelo sinistro, que como se sabe, injustamente, recaiu sobre o assistente.

    3. –Discorda-se pois e absoluto que para além de expressões "algo desagradáveis mas compreensíveis", venha também entendido que se enquadre tal imputação num quadro de normalidade da "vida em sociedade" com ocorrência de "alguma conflitualidade entre as pessoas", que se insere no quadro das "frequentes desavenças, lesões de interesses alheios, etc. que provocam animosidade", que "uma pessoa que se sente prejudicada por outra pode compreensivelmente manifestar o seu descontentamento através de palavras azedas, acintosas ou agressivas".

    4. –A conduta cometida arguido RP, também à luz dos exemplos jurisprudenciais acabados de transcrever, não é excluída pelo princípio da insignificância.

    5. –Ocorrem indícios suficientes e bastantes, para se entender com segurança de que foi praticado o crime de difamação e o arguido RP é responsável pelo mesmo.

    6. –Ao contrário do que foi decidido, a ilicitude da conduta, por qualquer forma, não é afastada por força do disposto no artigo 180.º, n.º 2, al. a) e b) do CP.

    7. –Ocorrem indícios suficientes e bastantes, para se entender com segurança de que foi praticado o crime de difamação e o arguido RP é responsável pelo mesmo.

    8. –Quanto aos arguidos JA e ML, reitera-se o que já foi dito a este respeito na acusação particular, no quadro de que os crimes em geral, como acontece com o crime de difamação, são suscetíveis de serem praticados por ação ou omissão.

    9. –A parte geral do Código Penal inclui disposições que constituem verdadeiras cláusulas de extensão da tipicidade, ou seja, que alargam cada uma das previsões típicas constantes na parte especial do Código Penal de forma a permitir a punição, nomeadamente, da tentativa (artigos 22º e 23º), da cumplicidade (artigo 27º), da omissão (artigo 10º) e da co-autoria (artigo 26º).

    10. –Os arguidos JA e ML, no exercício das suas funções de direção o primeiro e de supervisão o segundo, consentiram e nada fizeram para prevenir a inclusão das referidas imputações difamatórias, assim como consentiram e nada fizeram para prevenir o seu envio nessas condições à seguradora F..

    11. –É forçoso concluir que também no caso dos arguidos JA e ML existem indícios suficientes de que praticaram os factos em co-autoria material por ação ou omissão 15ª–Razão pela qual há que concluir que também ocorre a tipificação e subjetiva do tipo de crime de difamação, tendo sido violado o disposto no artigo 180.º 10.º e 14.º do Código Penal e 283.º do CPP.

    12. –A douta decisão recorrida incorreu em erro de julgamento requerendo-se a Vossas Excelências que a revoguem a fim de ser proferida outra que pronuncie os arguidos pela prática do crime de difamação.

    Termos em que, na procedência das presentes conclusões, e nos termos que o elevado saber de Vossas Excelências sempre mui doutamente suprirão, deve revogar-se o douto Despacho recorrido, proferindo-se outro que pronuncie os arguidos pela prática do crime de difamação.

  2. –Respondeu o magistrado do Ministério Público junto do tribunal a quo à motivação de recurso, pugnando pela confirmação da decisão recorrida.

  3. –Também os arguidos responderam à motivação de recurso, concluindo por não merecer provimento.

  4. –Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta apôs o seu “Visto”.

  5. –Colhidos os vistos, foram os autos à conferência Cumpre apreciar e decidir.

    II–FUNDAMENTAÇÃO.

  6. –Âmbito do Recurso O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª Edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª Edição, Editora Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série – A, de 28/12/1995.

    No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação de recurso, a questão que se suscita é a de saber se existem indícios suficientes da prática pelos arguidos, em co-autoria, do crime de difamação, p. e p. pelo artigo 180º, nº 1, do Código Penal.

  7. –A Decisão Recorrida 2.1–A decisão recorrida, na parte que releva, tem o seguinte teor (transcrição): Nos presentes autos os arguidos JA, MLe RP vieram requerer a abertura de instrução por se mostrarem inconformados com a acusação particular deduzida pelo assistente ALS, não acompanhada pelo Ministério Público pela prática do crime de difamação, p.p. no art. 180.º nº 1, do C. Penal.

    Alegam os arguidos JÁ e ML que, respectivamente, na qualidade de Supervisor de Averiguações e Director de Averiguações, não intervieram na elaboração do Relatório que consta a fls. 21 e seg. dos autos, nem tomaram do mesmo conhecimento prévio ao seu envio ao cliente Seguradora F..

    Não faz parte das suas funções normais intervirem neste tipo de procedimentos, tendo o arguido RP...

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