Acórdão nº 10708/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelPEDRO MARHÃO MARQUES
Data da Resolução29 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório O Digno Magistrado do Ministério Público junto do TAC de Lisboa veio interpor recurso jurisdicional da sentença daquele tribunal, datada de 25.01.2013, que julgou improcedente a acção especial de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa, por si intentada contra Irina ……………, de nacionalidade caboverdiana, natural de Nossa ………………….., ………, Cabo Verde, e residente na Rua ……….., nº66, 2ºEsq., ……….

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões: 1ª - À luz do artigo 4°, n°s l e 2, alínea a), do Código de Processo Civil, as acções de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa devem ser consideradas como acções de simples apreciação negativa, pois que as mesmas são destinadas à demonstração (e consequente declaração judicial) da inexistência de ligação à comunidade nacional; 2ª - Consequentemente, e de harmonia com o disposto no artigo 343°, n°1, do Código Civil, a prova dos factos constitutivos do direito a que se arroga competia à Requerida, ora Recorrida, fazer; 3ª- Aliás, perante uma acção que é consequência de uma pretensão inicialmente formulada junto da Conservatória dos Registos Centrais pela interessada em obter a nacionalidade portuguesa, sempre a esta caberia, de acordo com as regras gerais do ónus da prova, demonstrar os factos constitutivos de tal pretensão; 4ª - A redacção do artigo 2° da Lei n°37/81, de 3 de Outubro, mantida pela Lei n°2/2006, de 17 de Abril, continua a estabelecer que o(a) estrangeiro(a) filho(a) de nacional português pode adquirir, em determinadas circunstâncias, a nacionalidade portuguesa, mediante declaração; 5ª - Todavia, enquanto o artigo 9°, na sua redacção anterior, estabelecia que constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, designadamente, a "não comprovação pelo interessado, de ligação efectiva à comunidade nacional” na sua redacção actual estabelece o mesmo normativo que constitui fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, entre outros factores, a "inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional”.

6ª - Por outro lado, estatui o n°l do artigo 57° do Decreto-Lei n°237-A/2006, de 14 de Dezembro, que "Quem requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou adopção, deve pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional e sobre o disposto nas alíneas b) e c) do n°2 do artigo anterior" (sublinhado nosso); 7ª - E face ao comando ínsito no citado artigo 343°, n° 1, do Código Civil - estando em causa uma acção que resulta de uma pretensão por ela própria formulada junto da Conservatória dos Registos Centrais - não pode a Requerida, perante as regras gerais do ónus da prova, eximir-se a tal pronúncia; 8ª - O facto de a Recorrida ser filha de pai que adquiriu a nacionalidade portuguesa, no recente ano de 2006, não é suficiente para se entender que a mesma já possuí os requisitos necessários - ligação efectiva à comunidade portuguesa - para adquirir essa mesma nacionalidade, tanto mais que não contestou, nem juntou quaisquer provas documentais ou outras da sua ligação efectiva à comunidade portuguesa como lhe cabia, por força da inversão do ónus da prova; 9ª- Para adquirir a nacionalidade portuguesa são necessários, para além da menoridade/incapacidade e da filiação, outros requisitos, nomeadamente, uma ligação efectiva, um sentimento de unidade com a comunidade nacional, em termos de comunhão da mesma consciência nacional, impondo a lei uma ligação efectiva, já existente, devendo, assim, verificar-se uma forte e duradoura afinidade com a matriz dos portugueses, considerados estes como uma comunidade política e socialmente organizada; 10ª - Ora, no caso dos autos, nada disso acontece, já que a Requerida, hoje de maioridade, para além do mais, sempre viveu em Cabo Verde, comunidade nacional onde nasceu e cresceu, na qual se integra e se encontra inserida, e, naturalmente, com a qual se identifica; 11ª - Não basta, assim, verificar-se no caso concreto o requisito objectivo da Requerida ser filha de cidadão português, para se considerar que existe, imediata e automaticamente, ligação efectiva à comunidade nacional portuguesa, como parece resultar da Sentença.

12ª - Por tudo quanto foi dito e conforme melhor resulta dos autos, a douta Decisão recorrida fez um inadequado julgamento, de facto e de direito, tendo violado as disposições legais e os princípios de direito contidos no artigo 9°, al. a) da Lei n°37/81, na redacção dada pela Lei n°2/2006, de 17 de Abril, no artigo 56°, n°l, al. a) do Decreto-Lei n°237-A/2006, de 14 de Dezembro e no artigo 343°, n°l, do Código Civil; 13ª - Assim, mal decidiu o Tribunal Administrativo Círculo de Lisboa ao julgar improcedente a oposição deduzida pelo Ministério Público à aquisição da nacionalidade da Recorrida e ao ordenar o prosseguimento do processo conducente ao registo respectivo, pelo que, dando-se provimento ao presente recurso, deve aquela revogada e substituída por outra em que se declare a procedência da presente acção.

Pelo exposto, ao darem provimento ao recurso, revogando a douta decisão, far-se-á a esperada e costumada JUSTIÇA!».

• A Recorrida, Irina ………………, não apresentou contra-alegações.

• Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

• I. 2.

Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento ao ter considerado como não verificado o fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa previsto no art. 9.º, al. a), da Lei da Nacionalidade (inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional).

• II.

Fundamentação II.1.

De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a qual se reproduz ipsis verbis: A) A Ré nasceu a 2 de Novembro de 1991 em Nossa ………., …….., Cabo Verde (Certidão de Registo de Nascimento n.°……../17-12-1991, junto a fls. 13 dos autos do processo físico e cujo teor se dá por reproduzido); B) Tem nacionalidade caboverdiana (Certificado de Nacionalidade n°……./………. da Conservatória dos Registos Centrais de Cabo Verde, junto a fls. 18 dos autos do processo físico); C) Reside habitualmente na cidade de São …….., São ……., Fogo, Cabo Verde (Auto de Declarações de Aquisição de Nacionalidade junto a fls. 11-12 dos autos do processo físico); D) O seu pai, João …….., adquiriu a nacionalidade portuguesa nos termos do art.°7° da Lei n.°37/81, de 3 de Outubro, conforme Averbamento ao Assento de Nascimento n.° …… da Conservatória dos Registos Centrais, junto a fls. 16-17 dos autos do processo físico; E) Em 14 de Outubro de 2009, na Secção Consular da Embaixada de Portugal na cidade da Praia, Cabo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT