Acórdão nº 11684/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Março de 2015

Data12 Março 2015
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_02

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO O Município do Fundão (devidamente identificado nos autos), réu na ação administrativa comum, sob a forma de processo ordinário (Proc. nº 2/10.9BECTB) em que é autor Águas do Zêzere e Côa, S.A (igualmente devidamente identificado nos autos), inconformado com a decisão vertida no despacho-saneador de 08/04/2014 (proferido pela Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco em sede de audiência prévia a que alude o artigo 591º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013) pela qual julgou improcedente a exceção de incompetência material dos tribunais administrativos para conhecerem do pedido formulado na ação (que havia sido suscitada pelo recorrente, réu na ação, defendendo que a mesma pertence aos tribunais tributários em face da natureza fiscal da questão em dissídio), vem dela interpor o presente recurso autónomo, com subida em separado, ao abrigo do disposto nos artigos 644º nº 2 alínea b) e 645º nº 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), pugnando pela sua revogação, com substituição por decisão que julgue a incompetência material do Tribunal Administrativo para conhecer o pedido relativo à Taxa de Recursos Hídricos, declarando competentes para o efeito os Tribunais Tributários, absolvendo, em consequência, o réu, aqui recorrente, da instância.

Nas suas alegações o Recorrente formula as seguintes conclusões nos seguintes termos: «1. 0 despacho saneador ora recorrido viola o disposto nos artigos. 212º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa , e nos artigos. 1°, nº 1, 4°, nº 1, ai.

a), 44°, nº 1, e 49°, todos do ETAF.

  1. Pelas razões ora alegadas a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, faz, ao decidir como decidiu, com todo o respeito se refere, uma interpretação errada do estipulado no artigo 77º nº 2 e 80º da lei nº 58/2005 de 29/12 (Lei da Água), do artigo 5º e 14º do Decreto Lei nº 97/2008 de 11/06 e dos pontos B.1.2 e B.1.3 do despacho nº 484/2009 do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, publicado no Diário da República , 2º série de 8/01/2009.

  2. A questão que se coloca com o presente recurso é a de saber se o Tribunal Administrativo é competente para decidir o pedido de condenação do R. a pagar à A. a Taxa de Recursos Hídricos e respetivos juros.

  3. A cobrança dos valores reclamados a título de taxa de recursos hídricos, adiante designada por TRH, e respetivos juros de mora, pressupõe a apreciação de normas de direito fiscal substantivo, o que determina a incompetência do Tribunal a quo em razão da matéria.

  4. Pelo que nesta parte dos autos, estamos no âmbito de uma relação jurídica de natureza tributária ou fiscal pois implica a discussão e interpretação de normas de natureza fiscal e que se situam no domínio da atividade tributária; 6. E para a qual são competentes os Tribunais Tributários , nos termos conjugados dos arts. 212°, nº 3 da Constituição da República Portuguesa, e nos arts. 1º, nº 1, 4º, nº 1, ai. a), 44°, nº 1, e 49º, todos do ETAF.

  5. Sendo, em consequência, incompetente em razão da matéria, para dirimir esta questão o presente Tribunal Administrativo de Castelo Branco, e sendo, em consequência, inidónea para tanto o presente meio processual utilizado a ação administrativa comum.

  6. 0 artigo 212.º n.º 3 da CRP dispõe que “compete ao tribunais (...) fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes da relações jurídicas (...) fiscais”; 9.

    0 artigo 212.º nº 3 da CRP tem concretização legal no nº 1 do artigo 1.º do ETAF, segundo o qual “os tribunais da jurisdição (...) fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas (...)fiscais” 10. A TRH encontra-se disciplinada pela lei nº 58/2005 de 29/12 (Lei da Água), pelo Decreto lei nº 97/2008 de 11/06 e pelo despacho nº 484/2009 do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, publicado no Diário da República, 2º série de 8/01/2009.

  7. 0 artigo 77º nº 2 da Lei da Água determina que estão sujeitos ao pagamento de TRH todos os utilizadores dos recursos hídricos que utilizem bens do domínio público e todos os utilizadores de recursos hídricos públicos ou particulares que beneficiem de prestações públicas que lhes proporcionem vantagens ou que envolvam a realização de despesas públicas.

  8. 0 artigo 5.º do decreto-lei 97/2008 de 11/06, determina que todas as pessoas, singulares ou coletivas, que efetuem as utilizações do domínio público hídrico descritas no artigo 4.º do referido diploma são sujeitos passivos da TRH, devendo repercutir o valor da taxa no consumidor final.

  9. A base tributável encontra-se definida no artigo·77º da Lei da Água, dispondo o artigo 80º que a taxa é cobrada pelas autoridades licenciadoras aquando da emissão dos títulos de utilização privativa.

  10. Por seu turno o artigo 14.º do decreto-lei 97/2008 de 11/06, determina que a liquidação compete à ARH, 15. E o artigo 16.0 n.º 4 dispõe que o pagamento é feito empregando todos os meios genericamente previstos na LGT.

  11. 0 ponto B.1.2 do despacho 484/2009 determina que as entidades gestoras dos sistemas multimunicipais de abastecimento de água e saneamento de águas residuais devem repercutir a TRH, que pagaram à ARH, nos Municípios utilizadores dos serviços, sendo a forma de repercussão disciplinada no ponto 8.1.3 do referido despacho .

  12. Face ao quadro legal que rege a liquidação, pagamento e repercussão da TRH, salvo melhor opinião e respeito por opinião contrária, a conclusão só pode ser a de que na apreciação do pedido de pagamento da TRH o Tribunal é chamado a interpretar e aplicar normas de direito tributário por forma a dirimir um litígio que emerge do exercício da função tributária da administração pública.

  13. No caso dos autos o objecto do litígio que o tribunal administrativo foi convocado a dirimir e decidir reconduz-se a apurar se são legalmente devidas e exigíveis da R as quantias facturadas enquanto valores respeitantes à parcela reportada à recuperação do valor pago pela A. com os encargos legais obrigatórios, nomeadamente e no caso, com a taxa de recursos hídricos (cfr. Arts 20., 21, 22.º, do DL 97/08 e 82º do lei n.º 58/05).

  14. Em discussão nos presentes autos está, assim, o reflexo directo da relação jurídica fiscal que se estabeleceu e estabelece entre a ARH competente e a aqui A - com a liquidação e pagamento anual da taxa de recursos hídricos cujo montante pago "adiantado " a concessionária tem o direito a ser ressarcida.

  15. Pelo que, o que está efectivamente em causa e é pedido prende-se, entre o mais, com o não pagamento duma parcela inserida nas facturas emitidas e que é relativa à cobrança da taxa de recursos hídricos, 21. Pelo que a causa de pedir e o pedido não se enquadram no domínio da responsabilidade fundada no incumprimento do contrato de concessão enquanto fonte duma relação jurídica administrativa , Mas antes, 22. Numa decorrência de relação jurídica fiscal visto estar em discussão a legalidade da interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal , ou que se situa no campo da actividade tributária.

  16. Assim conclui-se que o pedido de condenação do R. dos montantes relativos à TRH, alegadamente devida e não paga, acrescida de juros moratórias, inscreve-se no âmbito de uma relação jurídico tributária, 24. Pelo que a competência para a sua apreciação pertence aos tribunais tributários e não aos tribunais administrativos.

  17. Pelo que terá, como é de inteira justiça , ser declarada a incompetência material do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco materialmente incompetente para conhecer o pedido relativo à TRH, absolvendo-se o R. da instância 26. Declarando-se competente para dirimir e conhecer este pedido os Tribunais Tributários.» A Recorrida, autora na ação, contra-alegou (fls. 25 ss.

    ), pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, defendendo que, como nela se entendeu, os tribunais administrativos são os competentes em razão da matéria para decidir o pedido formulado na ação.

    Admitido o recurso, por despacho da Mmª Juiz do Tribunal a quo de 16/05/2014 (de fls. 18 ss.), com efeito meramente devolutivo, subiu o mesmo em separado a este Tribunal instruído, entre o demais, com certidão das seguintes peças processuais: - da petição inicial (fls. 52 ss.

    ) - da contestação (fls. 67 ss.

    ) - da réplica (fls. 74 ss.

    ) - do requerimento de 27/02/2013 do réu (fls. 153 ss.

    ) - do requerimento de resposta da autora de 08/03/2014 (fls. 164 ss.) - da ata de audiência prévia de 08/04/2014 (fls. 109 ss.) O(a) Digno(a) Magistrado(a) do Ministério Público junto deste Tribunal notificado(a) nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA emitiu Parecer (fls. 180 ss.

    ) no sentido da improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, por entender, em suma, que a relação jurídica controvertida é de natureza administrativa e não fiscal, sendo que dele notificadas as partes, nenhuma respondeu (cfr. fls. 184-185).

    Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

    * II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO (das questões a decidir) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA (correspondentes aos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo).

    No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pelo recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida no despacho-saneador de 08/04/2014, proferido pela Mmª Juiz do Tribunal a quo em sede de audiência prévia a que alude o artigo 591º do CPC novo...

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