Acórdão nº 288/17.8BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | ANA CELESTE CARVALHO |
Data da Resolução | 04 de Outubro de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: N………. F………… – Produtos ………., S.A.
, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 26/06/2017, que no âmbito da ação de contencioso pré-contratual movida contra o SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, julgou a ação improcedente, absolvendo a Entidade Demandada do pedido.
Formula a aqui Recorrente nas respetivas alegações (cfr. fls. 405 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem: “A.
Este recurso vem interposto da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra quanto à impugnação, pela N........., das Peças do Procedimento de um concurso lançado pela SPMS. A ação da N......... visava a anulação das Peças do Procedimento do Concurso CP 2017/65, lançado pela SPMS para o Fornecimento de Medicamentos de Várias Áreas Terapêuticas, aos Hospitais e Serviços do Serviço Nacional de Saúde. Estava em causa, especificamente, a anulação dos Lotes 5, 6 e 7 desse procedimento, que respeitam à aquisição do medicamento Imatinib.
B.
O Imatinib tem várias indicações terapêuticas aprovadas, mas está primeiramente indicado para o tratamento de duas doenças: leucemia mieloide crónica (“LMC”), e tumores de estroma gastrointestinal (“GIST”). A N…………P…………. é cotitular e licenciada da Patente GIST, que protege, entre outros, a utilização de Imatinib no tratamento de GIST (as “Indicações GIST”). A N......... P......... conferiu à Recorrente N......... F……….. uma sublicença para a exploração da Patente GIST. Em Portugal, a N......... comercializa o medicamento com substância ativa Imatinib sob a marca comercial “Glivec”.
C.
Por força da proteção conferida pela Patente GIST, só o Glivec pode, sem violar a Patente GIST, ser oferecido, e em geral explorado, para tratamento das indicações GIST em território português.
D.
O âmbito e reivindicações da Patente GIST foram aceites pelo Tribunal. O que está realmente em jogo neste recurso é apurar se a Patente GIST ou o SiNATS são inevitavelmente violados por força do procedimento previsto nas Peças do Procedimento impugnadas.
E.
A título preliminar, e por cautela de patrocínio, a N......... impugna a matéria de facto assente na decisão, o que faz apenas no caso de o Tribunal ad quem considerar que duas circunstâncias relevantes para o julgamento correspondem a factos. Se assim se considerar, as constatações que se seguem devem ser aditadas à matéria de facto assente, nos termos concretizados no ponto 2. do corpo destas alegações, e nos termos da parte final da alínea c) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC, aplicável ex vi artigo 140.º do CPTA: i. O Imatinib consta da lista de substâncias ativas sujeitas a aquisição centralizada, nos termos das Circulares Informativas Conjuntas n.º 01/2016/ACSS/INFARMED/SPMS, de 22 de fevereiro, e 08/2016/ACSS/INFARMED/SPMS, de 19 de setembro em cumprimento do n.º 2 do Despacho n.º 1571-B/2016, de 1de fevereiro.
ii. O Imatinib é uma substância ativa de um medicamento sujeito a receita médica, que se destina a ser adquirido pelas entidades tuteladas pelo membro do Governo responsável pela área da Saúde.
F.
A impugnação das Peças do Procedimento assenta no argumento de que as Peças do Procedimento foram aprovadas de uma forma que permite a violação da Patente GIST, e na verdade cria condições indispensáveis para essa violação. Com efeito, as Peças do Procedimento não separam entre Imatinib a utilizar no tratamento das Indicações GIST e Imatinib para tratamento de outras indicações não-protegidas. Isto conduz a que os concorrentes da N......... que apresentem propostas a este procedimento apresentem necessariamente uma proposta para oferecer Imatinib que será utilizado para tratamento das Indicações GIST, em violação da Patente.
G.
O Tribunal a quo considerou que as Peças do Procedimento impugnadas não implicavam ou conduziam a uma violação da Patente GIST ou do SiNATS, essencialmente por considerar que as Peças do Procedimento não indicavam que as substâncias ativas a adquirir ao abrigo do Acordo Quadro seriam utilizadas para tratamento de indicações terapêuticas protegidas; além disso, seria sempre possível proteger a Patente GIST através de ajuste direto, a lançar nos termos do artigo 24.º, n.º 1, al. e) do Código dos Contratos Públicos.
H.
O Tribunal a quo chegou a esta conclusão julgando que a Patente GIST e o SiNATS só seriam eventualmente violados quando o medicamento fosse utilizado para o tratamento da indicação GIST protegida: porque as Peças do Procedimento não previam a utilização do Imatinib nesse tratamento, as consequências temidas pela N......... não seriam despoletadas por esses documentos.
I.
Com o devido respeito pelo Tribunal, esta conclusão deriva de dois erros de julgamento.
J.
O primeiro erro é considerar que a Patente GIST e o SiNATS (apenas) são violados quando o Imatinib é concretamente utilizado no tratamento de GIST (quando o medicamento é tomado pelo paciente). Não é verdade.
K.
A Patente GIST é violada sempre que o Imatinib for fabricado, oferecido, armazenado, ou introduzido no comércio para tratamento de GIST (vd. artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial).
L.
Assim, se o Imatinib fornecido ao abrigo do Acordo Quadro for utilizado para o tratamento de GIST - e sê-lo-á necessariamente - uma empresa comercializadora de medicamentos genéricos que ofereça, na sua proposta, um genérico para tratamento de GIST, estará por exemplo a violar a Patente GIST.
M.
Já o SiNATS prevê expressamente que “entidades tuteladas pelo membro do Governo responsável pela área da saúde [NDR: em regra, Hospitais e Serviços do SNS adquirentes] só podem adquirir medicamentos sujeitos a avaliação prévia desde que exista contrato de avaliação prévia válido no momento da celebração do contrato de fornecimento respetivo, e apenas para as indicações e nas condições aprovadas no contrato de avaliação prévia” (cf. artigo 26.º, n.º 2 do SiNATS, com destaque nosso). Uma vez que as empresas comercializadoras de genéricos de Imatinib terão extraído as Indicações GIST do seu Resumo de Características do Medicamento, para assim se conformarem à Patente GIST, não se espera que as Indicações GIST sejam aprovadas no respetivo contrato de avaliação prévia. Ora, se os Hospitais e Serviços do SNS...
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