Acórdão nº 1830/10.0TBFIG-Q.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução14 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I Por apenso aos autos de insolvência de A (…), LDA., pessoa coletiva com o n.º (....) , com sede na Rua (....), Figueira da Foz, e por determinação da sentença que declarou a respetiva insolvência, foi aberto o presente incidente de qualificação da insolvência.

O Administrador da Insolvência emitiu parecer no sentido da qualificação da insolvência como culposa.

Referiu para tanto que, no âmbito das funções que lhe foram incumbidas, empreendeu diversas buscas no intuito de verificar a existência de bens, móveis e imóveis, em nome da sociedade insolvente, e que tentou agendar sem sucesso uma reunião com o gerente da insolvente, (…), o qual não deu resposta às duas comunicações escritas que lhe enviou para o efeito. Solicitou então a colaboração policial no sentido de apurar do paradeiro de diversas viaturas apreendidas, através da qual veio a ter conhecimento de que o gerente informou desconhecer tal paradeiro e que o mesmo já seria desconhecido quando tomou posse da empresa.

Mais invocou que a contabilidade só foi organizada até dezembro de 2008, inexistindo a partir dessa data.

Conclui que a insolvência deve ser declarada culposa por verificação, pelo menos, das previsões das alíneas h) e i) do art. 186.º, n.º 2, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Refere deverem ser afetados pela qualificação o atual gerente (…)e o anterior gerente (…) O Ministério Público acompanhou o parecer do administrador, pronunciando-se pela qualificação da insolvência como culposa e pela afetação do gerente (…) Pessoalmente citado, o requerido (…) deduziu oposição. Alegou para tanto que, embora nomeado como gerente em 1 de março de 2010, nunca exerceu de facto as funções de gerente, facto que foi tempestivamente comunicado ao administrador, a quem foi igualmente comunicado que nunca teve acesso à contabilidade da insolvente. Mais invoca que a insolvente não teve qualquer atividade a partir de finais de 2008 e que, desde então, deixaram de existir documentos contabilísticos.

Conclui que a qualificação da insolvência não deve afetar o oponente por não ter contribuído por qualquer ato ou omissão para o estado de insolvência da sociedade A.S.P. Não foi lograda a citação pessoal do requerido (…) que, citado editalmente, e através do respetivo defensor, deduziu igualmente oposição. Nesta peça, defendeu que, estando ausente em parte incerta, não se pode concluir que não colaborou com o administrador da insolvência, e que a inexistência de documentos contabilísticos dos anos 2009 e seguintes se explica devido à inatividade da sociedade desde 2008.

Concluiu igualmente que a qualificação da insolvência o não poderá afetar.

A insolvente não deduziu oposição.

Foi dispensada a realização de audiência prévia, bem como, atenta a simplicidade do incidente, a prolação de despacho saneador, de fixação do objeto do processo e dos temas da prova.

Realizou-se a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que decidiu: a) Qualificar como culposa a insolvência de A (…) Lda.; b) Julgar afetados pela qualificação (…) e (…); c) Declarar (…) e (…) inibidos para o exercício do comércio pelo período de 2 (dois) anos, bem como declarar os requeridos inibidos, por igual período, para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa; d) Determinar a perda de quaisquer direitos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelos requeridos (…) e (…)e condená-los na restituição de quaisquer bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos; e) Condenar os requeridos (…) e (…) no pagamento das custas do incidente.

Inconformado com tal decisão, na parte que o afeta, veio o requerido (…) recorrer, concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso: I.) O Recorrente nunca assumiu de facto as funções de gerente. É o que expressamente consta do ponto 22. da Fundamentação de Facto da sentença recorrida. Ao não assumir as respetivas funções, não praticou qualquer ato de gestão.

II.) O facto de haver sido considerado “não provado” que o Recorrente nunca tivesse tido acesso às viaturas ou conhecimento da sua localização, não implica a prova do seu contrário, ou seja, de que tivesse efetivamente tido conhecimento da sua localização ou acesso ao mesmo.

  1. ) Em consequência, não é legítimo exercer a mesma censura ético-jurídica, como se houvesse sido feita prova pela positiva ou sobre o facto positivo.

IV. ) Os deveres assinalados ao gerente, de manter contabilidade organizada até ao momento previsto no art. 118º nº 6 do Código do IRC bem como, ainda, o dever de cuidado, previsto no art. 64º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), estando igualmente fora do alcance da previsão constante do art. 72º do CSC., são deveres que devem ser observados e têm apenas por destinatários quem desenvolve efetivamente a função, ativamente e pela positiva, desempenha efetivamente a atividade e não a quem a não desempenha, tendo sido mero gerente de favor, como é o caso do Recorrente.

V.) Por isso, o Recorrente, tratando-se de um gerente meramente formal e que não exerceu qualquer função, não é o destinatário de tais normas, pelo que sobre o mesmo não podem recair as consequências pelo respetivo incumprimento.

VI.) Não se verificam assim fundamentos de facto que suportem a decisão proferida e que legitimem o juízo de censura ético-jurídica que recaiu sobre o Recorrente na sentença proferida e aqui posta em crise.

VII.) A sentença padece assim do vício previsto na al. c) do nº 1 do art. 615º do nCPC.

Pelo que se impõe conceder provimento ao presente recurso.

Respondeu o Ministério Público, pugnando pela decisão recorrida: (…) Diga-se, desde já, que a decisão proferida, não nos merece qualquer reparo, evidenciando uma correta subsunção dos factos ao direito, mostrando-se clara e devidamente...

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