Acórdão nº 202/10.1PBCVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução16 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório No processo supra identificado, foi julgado em processo comum, com intervenção do tribunal singular o arguido A...

, portador do BI n.º (...) , nascido em 14/05/1983, filho de (...) e de (...) , natural de Cascais, com residência na Rua (...) , Cascais.

É imputado ao arguido a prática de um crime de burla qualificada p. e p. pelos art. 217.º e 218.º, n.º 1 e 2, a. b), do Código Penal (CP) e não apenas pelo art. 218.º, n.º 1 e 2, a. b), como incorrectamente se imputa na acusação e no relatório e dispositivo da sentença recorrida, uma vez que é naquele primeiro artigo que se definem os elementos constitutivos do crime base da burla, e o segundo apenas define o elemento da qualificativa, pelo qual foi condenado na pena de 2 (dois) anos de prisão, suspensa na sua execução, pelo mesmo período, “com a condição de reparar a ofendida B..., nos montantes apropriados e respectivos juros, em 30 dias, a contar do trânsito em julgado e disso fizer prova nos autos”.

* Do acórdão interpôs recurso o arguido, formulando as seguintes conclusões: «43. Vem o presente Recurso, interposto da douta sentença condenatória de fls., no qual se condenou o ora Recorrente na pena de 2 (dois) anos de prisão suspensa, pela prática de crime de burla qualificada.

  1. Na determinação da pena concreta a aplicar ao Arguido importa ter em conta, nos termos do artigo 71 o do C.P., as necessidades de prevenção geral e especial que nos autos se imponham, bem como, as exigências da reprovação do crime, não olvidando que a pena tem de ser orientada em função da culpa concreta do agente e que deve ser proporcional a esta, em sentido pedagógico e ressocializador.

  2. Na fixação da pena concreta ter-se-á de atender, naturalmente, á medida da actuação e do comportamento delituoso do Arguido, na medida em que é a medida da culpa de cada um, a baliza do juízo de censura que é susceptível de lhe ser formulado.

  3. Nessa medida, invoca-se a desqualificação da burla qualificada para o crime de burla simples, que foi o que efectivamente ocorreu, no caso em debate.

  4. E em assim o entendendo, venerandos julgadores, deverá ser extinto o procedimento criminal, que corre termos contra o Arguido/Recorrente, em virtude da desistência de todos os lesados/ofendidos.

  5. Caso não entendam dessa forma, jamais poderá ser o arguido/recorrente condenado por um crime de burla qualificada. Só podendo ser condenado por um crime de burla simples.

  6. Seguindo este raciocínio, caberá contra o Arguido/Recorrente, no máximo, uma pena de multa, a ressaltar que este não tem sequer antecedentes criminais.

    Por todo o Exposto, forçosamente se conclui pela EXTINÇÃO do feito por desistência do procedimento criminal por parte dos ora ofendidos/lesados contra o então Recorrente/Arguido A... do crime de burla qualificada em que foi condenado, o que desde já se requer, com a máxima vénia, a doutos julgadores, por ser medida de inteira e salutar justiça. E, caso não seja acolhida a pretenção apresentada, forçosamente deverá ser desqualificado o crime de burla qualificada pelo crime de burla simples, em virtude de toda a fundamentação acima descrita e provada. E, assim entendendo Vossas Excelências, caberá no máximo uma pena de multa para o caso em discussão, diferentemente da pena de prisão suspensa que foi decretada pela douta sentença a quo em face do Recorrente, pelo que, desde já, se requer a este douto tribunal, e assim se fará a costumada e Sã, JUSTIÇA!».

    * Respondeu o Ministério Público na 1.ª instância ao recurso interposto, nos termos do art. 413.º, n.º 1, do CPP, pugnando pela sua improcedência, por a sentença recorrida, não merecer reparo, devendo em consequência ser integralmente confirmado.

    Para tal sustenta que a conduta do arguido não se subsume ao crime de burla simples, mas sim qualificada, atenta a verificação da qualificativa da al. b), do n.º 2, do art. 218.º, do CP e como tal não admite desistência de queixa.

    O tribunal apreciou devidamente a prova para dar como provados os factos designadamente quanto ao facto do arguido “fazer da burla modo de vida”.

    * Nesta instância, os autos tiveram vista do Ex.mo Senhor Procurador-geral Adjunto, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, emitindo douto parecer também no sentido de se manter a sentença recorrida, por não haver razão para alterar a matéria de facto, mesmo através da existência dos vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, que invoca na motivação de recurso, apesar de não lhe fazer depois referência nas conclusões.

    Suscita a questão, como nota prévia, de que não reflectindo as conclusões o resumo da motivação, deveria o arguido ser convidado, nos termos do art. 417.º, n.º 3, do CPP, a completar e esclarecer as mesmas.

    Mesmo a admitir a invocação dos vícios alegados nas considerações 38, 30 e 40, da motivação de recurso, as mesmas nada têm a ver com os vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP.

    Acompanha a resposta do Ministério Público na 1.ª instância quando à subsunção dos factos à qualificativa do art. 218.º, n.º 2 al. b), do CPP. Conclui assim estarem prejudicadas as restantes questões, isto é, a convolação para o crime de burla simples e consequentemente a desistência de queixa.

    Relativamente à medida da pena, a mesma é adequada, reflectindo as atenuantes provadas a favor do arguido, quer na fixação da medida concreta, quer quanto á suspensão da sua execução.

    * Cumprido que foi o disposto no art. 417.º, n.º 2, do CPP, foram colhidos os vistos legais, pelo que cumpre decidir.

    * Atentas as questões suscitadas na motivação de recurso, vejamos antes de mais a decisão da matéria de facto, constante da sentença, importando atentarmos nos factos provados, factos não provados e motivação.

    1. Factos provados: A) «a. No dia 1 de Julho de 2010, a hora que não foi possível determinar, a ofendida B..., melhor id. nos autos, pretendendo alugar um quarto nesta cidade e comarca da Covilhã, efectuou, via internet, uma pesquisa através do link http://www.covilhacastelobranco.olx.pt, com vista a essa finalidade; b. Depois de verificar a publicidade de um determinado quarto que estaria para alugar, que se localizaria mesmo em frente à Biblioteca da UBI, com o n.º de contacto telefónico (...) , a ofendida B... decidiu entrar em contacto com essa pessoa; c. Assim, através do seu aparelho de telemóvel com o n.º (...) a ofendida efectuou um contacto telefónico para o aparelho de telemóvel com o n.º (...) , tendo sido atendida pelo ora arguido, que se identificou como sendo " A..."; d. Pelo arguido foi, então, afirmado que se encontrava na localidade de Rio de Mouro, pelo que teria de se deslocar à Covilhã para poder mostrar o referido quarto; e. Mas, para tanto, a ofendida teria que adiantar uma determinada quantia, como espécie de um sinal; f. Depois de outros contactos, sempre por via telefónica, o arguido lá foi solicitando à ofendida o pagamento da quantia de 50.00 € (cinquenta euros), por vale postal, para poder ver o referido quarto; g. De tal modo ficou a ofendida convencida de que o arguido era o real proprietário do referido quarto, que logo decidiu remeter um vale postal daquela quantia para poder visualizar aquele quarto; h. Assim, no dia 1 de Julho de 2010, cerca das 14 horas, a ofendida dirigiu-se ao balcão da Estação dos CTT nesta cidade da Covilhã, e ali preencheu, assinou e enviou para o ora arguido o vale postal que se encontra junto aos autos a fls. 32, no montante de 50.00 € (cinquenta euros), tendo ainda despendido a quantia de 6.75 € para suporte dos custos do envio; i. Combinou de seguida encontrar-se com o arguido nesta cidade da Covilhã, para poder ver o quarto, mas o que é certo é que até hoje o arguido nunca mais apareceu, tendo deixado de receber qualquer contacto telefónico efectuado pela ofendida; j. Assim a ofendida prejudicada, pelo menos, no montante de 50.00 € (cinquenta euros), já que o arguido nunca mais devolveu tal quantia; k. Quantia essa que o arguido integrou no seu património, gastando-a em proveito próprio, não obstante saber que a mesma não lhe pertencia; l. O que só conseguiu em virtude do artifício por si criado; B) m. No dia 1 de Novembro de 2010, durante o período da manhã, o ofendido D... , melhor id. nos autos, pretendendo alugar um quarto nesta cidade e comarca da Covilhã, efectuou, via internet, uma pesquisa através do link http://www.covilhacastelobranco.olx.pt. com vista a essa finalidade; n. Depois de verificar a publicidade de um determinado quarto que estaria para alugar, que se localizaria a cerca de 10 minutos da UBI, com o n.º de contacto telefónico (...) - " G... ou A... ", conforme print que consta de fls. 85, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, o ofendido D... decidiu entrar em contacto com essa pessoa; o. Assim, através do seu aparelho de telemóvel com o n.º (...) o ofendido efectuou um contacto telefónico para o aparelho de telemóvel com o n.º (...) , tendo sido atendida pelo ora arguido, que se identificou como sendo " G... "; p. Pelo arguido foi, então, afirmado que se encontrava na cidade do Porto - quando afinal se encontrava na zona da Grande Lisboa - pelo que teria de se deslocar à Covilhã para poder mostrar o referido quarto; q. Mas, para tanto, o ofendido teria que adiantar uma determinada quantia, como espécie de um sinal; r. Depois de outros...

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