Acórdão nº 181/06.0TASEI-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução16 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

Relatório Por despacho de 25 de Março de 2015, a Ex.ma Juíza da Comarca da Guarda, Instância Local de Seia – Secção de Competência Genérica, J1 –, indeferiu o requerimento de folhas 668 e 669 do arguido A...

, em que este solicitava a declaração de nulidade insanável do despacho que lhe revogou a suspensão de execução da pena, prevista no art.119.°, al. c) e d) do C.P.P. e, a sua libertação imediata, com a subsequente designação de data para a sua audição com vista à eventual revogação da suspensão da pena em que foi condenado nos presentes autos.

Inconformado com o douto despacho dele interpôs recurso o arguido A... , concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1.º - Porque o arguido não foi notificado da promoção do Ministério Público tendente à revogação da suspensão da pena - devendo tê-lo sido face ao princípio subjacente ao art. 113°, n.° 10, do C.P.Penal, conjugado com a regra constitucional do art.32.° da C.R.P..

  1. - E ainda porque não foi pessoalmente ouvido, em clara violação dos procedimentos previstos no art.492.°, e segs. do C. P Penal, 3.º - A decisão que revogou a suspensão da pena está ferida da nulidade insanável, face ao disposto no art.119.°, alíneas c) e d) do C.P. Penal.

  2. - Nulidade essa que deveria ter sido oficiosamente conhecida, devendo sê-lo uma vez suscitada em requerimento pelo arguido.

  3. - Ao invés, invocando o trânsito - que não ocorreu e, de resto, não é causa legal de sanação, face ao art.121.° do C.P.Penal - o despacho de 25/3/15, violou as normas citadas, devendo ser revogado.

Termos em que, declarando a invocada nulidade insuprível e, por via dela, considerando sem efeito a decisão de revogação da suspensão e o despacho que não reconhece tal nulidade e, consequentemente, determinando a libertação imediata do arguido e a renovação da diligência tendente à eventual revogação da suspensão - com audição pessoal do arguido -, farão, Vossas Excelências Justiça.

O Ministério Público da Comarca da Guarda, Instância Local de Seia, respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção integral da decisão recorrida.

A Ex.ma Procuradora-geral adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso deve improceder.

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P., tendo o arguido respondido ao douto parecer.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação O despacho recorrido tem o seguinte teor: « Veio o arguido A... requerer que se declare a nulidade insanável prevista no art." 119.°, al. c e d) do Cód. Proc. Penal e se ordene a sua libertação imediata, com a subsequente designação de data para a sua audição com vista à eventual revogação da suspensão da pena em que foi condenado nos presentes autos.

Para sustentar o peticionado alega, no essencial, que por decisão proferida em 28.05.2013 foi determinada a revogação da suspensão da pena de prisão em que o arguido foi condenado, porquanto aquele não cumpriu com o pagamento da condição de suspensão daquela. Por despacho de fls.440 foi determinada a notificação do arguido para exercer o contraditório, o qual foi cumprido apenas na pessoa da sua defensora oficiosa. Alega assim que a notificação para exercer o contraditório deveria ter sido efectuada na pessoa do arguido, nos termos do art.°113.°, n.º10 do Cód. Proc. Penal, defendendo que tal notificação tem que ser pessoal. Por outro lado, alega ainda que o procedimento relativo à execução da pena suspensa impõe a audição do condenado, a qual tem que ser presencial, como resulta do disposto no n.º 2 do art.º 495.° do Cód. Proc. Penal. Sucede porém que o arguido não foi notificado, nem sequer ouvido, entendendo o arguido que a falta de tais formalidades integram nulidade insanável prevista no art.° 119.°, al. c) e d) do Cód. Proc. Penal.

Cumpre apreciar.

Dispõe o art.°118.º do Cód. Processo Penal que “1 - A violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei. 2 - Nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular. 3 - As disposições do presente título não prejudicam as normas deste Código relativas a proibições de prova.” Nos termos do art.°119.º do mesmo diploma legal “Constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, além das que como tal forem cominadas em outras disposições legais: a) A falta do número de juízes ou de jurados que devam constituir o tribunal, ou a violação das regras legais relativas ao modo de determinar a respectiva composição; b) A falta de promoção do processo pelo Ministério Público, nos termos do artigo 48.°, bem como a sua ausência a actos relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência; c) A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência; d) A falta de inquérito ou de instrução, nos casos em que a lei determinar a sua obrigatoriedade; e) A violação das regras de competência do tribunal, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 32.°; f) O emprego de forma de processo especial fora dos casos previstos na lei.” De seguida, prevê o art.º 120.º do mesmo diploma que “1 - Qualquer nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos interessados e fica sujeita à disciplina prevista neste artigo e no artigo seguinte. 2 - Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais: a) O emprego de uma forma de processo quando a lei determinar a utilização de outra, sem prejuízo do disposto na alínea f) do artigo anterior; b) A ausência, por falta de notificação, do assistente e das partes civis, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência; c) A falta de nomeação de intérprete, nos casos em que a lei a considerar obrigatória; d) A insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade. 3 - As nulidades referidas nos números anteriores devem ser arguidas: a) Tratando-se de nulidade de acto a que o interessado assista, antes que o acto esteja terminado; b) Tratando-se da nulidade referida na alínea b) do número anterior, até cinco dias após a notificação do despacho que designar dia para a audiência; c) Tratando-se de nulidade respeitante ao inquérito ou à instrução, até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito; d) Logo no início da audiência nas formas de processo especiais.” No que às nulidades respeita, vigora o princípio da legalidade, do qual resulta que o elenco legal das nulidades, sejam estas sanáveis ou insanáveis, é taxativo. Estamos perante normas com carácter excepcional que, por isso, não admitem aplicação analógica.

As nulidades insanáveis têm os efeitos previstos no art.º122.º do Cód. Proc. Penal, nos termos do qual “1 - As nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas puderem afectar. 2 - A declaração de nulidade determina quais os actos que passam a considerar-se inválidos e ordena, sempre que necessário e possível, a sua repetição, pondo as despesas respectivas a cargo do arguido, do assistente ou das partes civis que tenham dado causa, culposamente, à nulidade. 3 - Ao declarar uma nulidade o juiz aproveita todos os actos que ainda puderem ser salvos do efeito daquela.” Conforme resulta do excerto da norma do transcrito art.º119.º do Cód. Proc. Penal, as nulidades insanáveis devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do processo, até ao trânsito em julgado da sentença da decisão final, não sendo inconstitucional a preclusão do direito de arguir uma nulidade insanável com o trânsito em julgado da decisão final, se o arguido teve plena oportunidade processual de a arguir, na sequência de notificação pessoal dessa decisão, que não foi impugnada. Com efeito, o trânsito em julgado da decisão final sana todas as nulidades do processo e da sentença, ressalvado o regime da revisão de sentença (Ac. do Tribunal Constitucional n.º 146/2001) - neste sentido Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário ao Código de Processo penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem 3.ª edição actualizada, pág. 303.

Defende Germano M. Silva, que “A designação legal de nulidade insanável não é correta. Com efeito, a nulidade não pode ser declarada após a formação do caso julgado da decisão final que, neste aspecto, actua como meio de sanação. A declaração da nulidade insanável pode ter lugar em qualquer fase do procedimento, mas apenas enquanto a decisão final não transita em julgado. No processo, a nulidade absoluta é coberta pela impossibilidade, depois de findo aquele, de a fazer reviver, no seu todo ou parcialmente. A decisão judicial com trânsito em julgado não se anula, como se não declara a nulidade de actos de um processo que fundou com decisão irrevogável” - Curso de Processo Penal II, Verbo-1999, p. 75.

Perfilham também este entendimento M. Simas-Santos e Leal-Henriques, Código de Processo Penal Anotado, I Vol. – 199, p. 603, Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 9ª ed.-1998, p. 305 e Souto Moura, bem João Conde Correia, ao afirmarem que “… no direito processual os actos nulos só podem ser anulados até ao trânsito em julgado da decisão final. Com a formação do caso...

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