Acórdão nº 594/11.5T3AVR.P1.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução11 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

Relatório Pela Comarca do Baixo Vouga – Aveiro – Juízo de Média Instância Criminal, Juiz 2 ( actual Comarca de Aveiro, Instância Local de Aveiro, Secção Criminal, Juiz 2), sob pronúncia que recebeu a acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, o arguido A...

, casado, técnico de manutenção industrial, natural de Venezuela, nascido em 26-09-1969, filho de (...) , residente em Rua (...) , Aveiro, imputando-se-lhe a prática de factos pelos quais teria cometido, em autoria material, um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181º, 183º, nº1, al. a) e 184º, nº 1, por referência ao artigo 132º, nº2, al. l) todos do Código Penal.

O demandante B... deduziu pedido de indemnização civil contra o demandado A... pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 5.500,00 a título de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora até efectivo e integral pagamento.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Singular, por sentença proferida a 28 de Maio de 2014, decidiu: - Condenar o arguido A..., como autor material de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.º, nº 1 e 184.º, ambos do Código Penal, na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa à taxa diária de € 6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz o montante total de € 910,00 (novecentos e dez euros); e - Julgar parcialmente procedente por provado o pedido de indemnização civil deduzido por B... e condenar A... a pagar-lhe a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros), a que acrescem juros de mora desde a prolação da presente sentença até integral pagamento, absolvendo-se o mesmo do restante pedido.

Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o arguido A..., concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1.º. A falta de qualidade da gravação da prova impede a apreciação global do depoimento do arguido e do assistente.

  1. O procedimento criminal está prescrito desde 31-01-2014 e, como tal, deve ser declarado.

  2. O arguido, ora recorrente, não praticou o crime por que foi condenado porque: 3.º.1 O nome do queixoso era um dos vários nomes constantes do texto do email.

    3.º.2 O recorrente não dirigiu o email especificamente ao queixoso.

    3.º.3 Constituiu, tão só, um ato de desespero.

    3.º.4 A expressão escrita no plural não visava o queixoso concreta e especificamente.

    3.º.5 O recorrente não pretendeu ofender o queixoso que nem sequer se lembra dele.

    3.º.6 Inexiste dolo na atuação do recorrente, pelo que o elemento subjectivo não está preenchido.

  3. A imagem do queixoso como pessoa reta não ficou maculada.

    Sem prescindir.

  4. A pena imposta ao recorrente ultrapassa largamente a medida da culpa devendo situar-se perto do limite mínimo da moldura.

  5. A taxa diária aplicada não deveria ultrapassar os 5€ (cinco euros), porque o arguido não dispõe de rendimentos líquidos sequer equivalentes ao salário mínimo nacional.

  6. O arguido deveria ter sido absolvido do pedido de indemnização civil.

  7. Mas mesmo que assim se não entendesse nunca o montante deveria ultrapassar o valor de 500€ (quinhentos euros).

  8. O valor atribuído é exageradíssimo, desproporcional à situação económica do recorrente e desconforme a prática dos Tribunais e, nessa medida, violador do artigo 494.º do Código Civil ex vi artigo 496.º, n.º3 do mesmo código. 10.º. Não foi produzida prova bastante para dar como provados os factos 13, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24 e tal matéria deveria ter sido julgada improcedente.

  9. A sentença de que se recorre violou os artigos 118.º, n.º1, alínea d), 121.º n.º3, 181.º e 184.º do Código Penal, os artigos 494.º e 496.º, n.º 3 do Código Civil e os artigos 368.º n.º2, alínea a) 389.º-A n.º1, alínea c) do Código Civil. 12.º. Devendo ser revogada e substituída por outra que absolva o recorrente da condenação crime e da condenação no pedido civil fazendo-se, assim, Justiça.

    O assistente B... respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pelo não provimento do recurso e manutenção da douta sentença recorrida.

    Também o Ministério Público na Comarca do Baixo Vouga respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pelo não provimento do recurso.

    O Ex.mo Procurador-geral adjunto neste Tribunal da Relação subscreveu o douto parecer emitido na Relação do Porto, de onde vêem remetidos os autos, no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.

    Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P., não tendo havido resposta.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    Fundamentação A matéria de facto apurada e respectiva motivação constantes da sentença recorrida é a seguinte: Factos provados 1 - À data da prática dos factos que infra se descrevem, o assistente B..., era Vereador da Câmara Municipal de Aveiro, com domicílio profissional na Praça da Republica, em Aveiro; 2 - No dia 31-01-2011, pelas 18h32, o arguido A..., que era utilizador da conta de endereço electrónico, A...1@gmail.com, expediu um texto, via correio electrónico, para o endereço geral@cm-aveiro.pt, pertencente à Câmara Municipal de Aveiro, e ao qual tinham acesso não só o assistente, mas todos os restantes Vereadores e funcionários do Município; 3 - No referido texto, da autoria do arguido, este tece diversas considerações relativamente a uma construção clandestina e dirigindo-se ao assistente Vereador B..., escreveu o arguido o que a seguir se transcreve: “...

    já me dirigi…ao vereador do pelouro o Sr. Vereador B... que me disse que inclusive havia um processo de embargo e demolição das obras clandestinas o meu próximo passo vai ser o Sr. presidente da camara e de seguida a comunicação social porque os senhores são covardes e corruptos. Já agora este serviço não funciona tenham coragem de me responder.”; 4 - Ao redigir o texto acima transcrito, o arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, com a intenção de atingir o assistente B..., na sua ética profissional, honra e consideração, como efectivamente ofendeu, bem sabendo que nomeadamente as expressões “covardes e corruptos”, são objectivamente adequadas a tal propósito e que aquele era Vereador da Câmara Municipal de Aveiro; 5 - Ao enviar o texto por correio electrónico, o arguido possibilitou que o mesmo chegasse ao conhecimento de várias pessoas; 6 - Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei criminal; Da condição pessoal e económica do arguido 7 – O arguido é técnico de manutenção industrial auferindo mensalmente a quantia total de €: 1.100,00; 8 – É casado, encontrando-se em processo de divórcio; 9 – Tem três filhos a quem paga a título de prestação de alimentos a quantia mensal de €: 220,00; 10 – Reside em casa própria pagando €: 600,00 a título de empréstimo pela sua aquisição; 11 – Possui o 9º ano de escolaridade; 12 – O arguido não tem antecedentes criminais.

    Do pedido de indemnização civil: 13 – O demandado ao apelidar o demandante de “covarde” e “corrupto”, nas suas funções de vereador e através de um endereço electrónico municipal, fê-lo sentir-se muito humilhado; 14 – O demandante é uma pessoa respeitadora e respeitada junto dos munícipes de Aveiro, assim como no seu círculo social de amigos e pessoas conhecidas; 15 – Sendo-lhe reconhecido o ser carácter ético e brio profissional no exercício da sua actividade profissional como advogado na comarca de Aveiro; 16 – Em 2004 filiou-se no Partido Centro Democrático Social Partido Popular, tendo integrado os órgãos distritais do mesmo; 17 – Com 30 anos de idade foi eleito pelos seus pares Presidente da Comissão Política Concelhia de Aveiro do Partido Centro Democrático Social Partido Popular; 18 – Por acto eleitoral realizado em 11/10/2009, o demandante foi eleito para exercer o mandato de Vereador da Câmara Municipal de Aveiro; 19 – E foi empossado formalmente na sessão de instalação dos órgãos autárquicos para o mandato 2009/2013 da Assembleia Municipal de Aveiro datada de 31 de Outubro de 2009; 20 – Em 05/11/2009, e por deliberação tomada em reunião da Câmara Municipal, o demandante foi designado para exercer as funções de vereador em regime de tempo inteiro; 21 – Em 11/07/2011, o demandante viu cessado o exercício de funções de vereador a tempo inteiro com competência delegada mercê do despacho do Presidente da Câmara Municipal de Aveiro; 22 – Tendo-lhe sido retiradas as competências inerentes às atribuições dos pelouros que lhe foram delegados e subdelegados, na sequência do seu voto contra na tomada da Deliberação na Reunião Camarária de 07/07/2011, referente ao Contrato de Gestão do Estádio Municipal entre a “EMA – Estádio Municipal, E.M.” e o “S.C. Beira-Mar”; 23 – O demandante cessou, em 17/10/2011 as suas funções de vereador por renúncia e regressou ao exercício da actividade de advocacia; 24 – Devidos às palavras proferidas pelo demandado, o demandante sentiu-se durante muitos dias profundamente humilhado e revoltado bem como angustiado; 25 - O demandante exerceu o seu mandato de vereador no escrupuloso cumprimento dos seus deveres de eleito local; 26 – Tendo exercido de forma dedicada e rigorosa a sua missão pública no uso das competências inerentes aos pelouros do urbanismo, jurídico, polícia municipal, protecção civil, mercados e feiras; 27 – Despachando e praticando todos os actos administrativos inerentes à autoridade do referido cargo municipal; 28 – E nunca deixando de promover as diligências e demais procedimentos administrativos necessários à salvaguarda do interesse público da Câmara Municipal de Aveiro.

    Motivação Os factos provados assentam numa apreciação crítica e global de toda a prova produzida no seu conjunto.

    O arguido admitiu ter enviado para o endereço electrónico da Câmara Municipal de Aveiro o e-mail que consta do ponto 3 da matéria dada como provada justificando a sua conduta com o facto de, desde há vários anos, procurar junto daquele município, a resolução de um problema relacionado com umas construções...

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