Acórdão nº 164/05.7TBVLF.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL SILVA
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA I - HISTÓRICO DO PROCESSO 1. S…, SA, (que entretanto alterou a sua denominação para R…, SA), instaurou ação contra I… (substituído no decurso do processo pelos seus herdeiros habilitados T…, …) e contra A…, pedindo a sua condenação a verem declarado o seu incumprimento contratual, a restituir-lhe o montante de € 37.400,00 e a pagar-lhe indemnização pelos prejuízos causados e resultantes de tal incumprimento contratual, sendo € 16.464,00 já quantificados e os restantes a liquidar em execução de sentença, bem como juros moratórios sobre tais quantias.

Para suporte de tais pedidos, invocou um contrato firmado com o Réu I…, mediante o qual ele lhe transmitiu os “direitos de replantio da vinha” em 3 prédios, pelo preço de € 37.400,00. Esse negócio foi concretizado pelo Réu A…, que atuou como procurador do Réu I…, mas também em seu nome e interesse próprios.

Condição essencial desse negócio era o arranque prévio da vinha existente nos prédios, o que os Réus nunca fizeram, o que acarretou o indeferimento da autorização definitiva para o replantio da vinha e da transmissão dos direitos por parte do Instituto da Vinha e do Vinho (organismo que tutela tal tipo de contratos), e a consequente impossibilidade definitiva de concretização do negócio.

Ambos os Réus contestaram.

O Réu I… referindo não ter celebrado qualquer contrato, uma vez que o mandato conferido ao co-Réu não comportava poderes para a dita compra e venda, mas apenas para consulta.

O Réu A… descartou qualquer responsabilidade pessoal, uma vez que agiu apenas e tão só na qualidade de mandatário do I...

As partes ainda esgrimiram argumentos em sede de réplica e tréplica.

Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença condenando os Réus a pagar à Autora a quantia de € 37.400,00, acrescida de juros de moratórios, absolvendo-os do demais peticionado.

Essa sentença foi objeto de recurso por parte das habilitadas T… e M...

Este Tribunal da Relação de Coimbra decidiu anular o julgamento “para que a 1ª instância amplie a base instrutória nos termos sobreditos e realize novo julgamento em conformidade com o artigo 712º, n.º 4 do CPC, e com atenção ao disposto no artigo 650º/3 e na 2ª parte daquele n.º 4, devendo por fim ser proferida nova sentença”.

A 1ª instância agiu em conformidade e após proceder a novo julgamento, proferiu sentença condenando “os réus …, enquanto herdeiros habilitados de I…, com fundamento em incumprimento contratual, a pagar à autora a quantia de 37.400,00 € (trinta e sete mil e quatrocentos euros), acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento”. [[1]] 2. Ainda inconformadas, apelam de novo as habilitadas T… e M… para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: … 3. A Autora contra-alegou e concluiu: … Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO 4. OS FACTOS A 1ª instância considerou provados os seguintes factos: … 5. O MÉRITO DO RECURSO O objeto do recurso é delimitado pelas questões suscitadas nas conclusões dos recorrentes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: art. 635º nº 3 e 4, 639º nº 1, 640º nº 1 e 608º n.º 2, ex vi do art. 663º nº 2, todos do Código de Processo Civil (de futuro, apenas CPC).

No caso, são as seguintes as questões a decidir: Impugnação da matéria de facto Delimitação objetiva do recurso: conhecimento das questões suscitadas no anterior recurso Se existiu vinculação contratual do Réu I… (mandato, procuração, representação sem poderes) 5.1. IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO (conclusões 27ª a 38ª) São hoje da maior amplitude os poderes conferidos aos Tribunais da Relação para proceder à alteração/modificação da matéria de facto, provada ou não provada, tida em conta na 1ª instância (cf. art. 662º do CPC).

Na verdade, permite-se-lhe agora que no processo de formação da sua própria convicção, o Tribunal da Relação possa, não só reapreciar os meios probatórios produzidos em 1ª instância, mas inclusive proceder à renovação desses meios de prova e até ordenar a produção de novos meios de prova.

Porém, essa sindicância está absolutamente dependente do cumprimento pelo Recorrente do ónus de alegação que se lhe impõe no art. 640º do CPC, do seguinte teor: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

  1. Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

    2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

  2. Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”.

    O incumprimento destas regras formais são tidas pela lei como preclusivas à possibilidade de o Tribunal da Relação se debruçar sobre a matéria de facto, impondo-se-lhe a rejeição do recurso nessa parte.

    Nas suas conclusões, designadamente as numeradas de 27 a 38, as Recorrentes questionam a credibilidade atribuída pela 1ª instância ao depoimento da testemunha C...

    Em função disso, pretendem “uma apreciação mais criteriosa dos factos” (conclusão 38).

    Ora, resulta claro das conclusões de recurso, atrás transcritas, que as Recorrentes não cumpriram minimamente o ónus de alegação que se lhe impunha.

    Na verdade, são elas totalmente omissas sobre qualquer um dos segmentos impostos nas diversas alíneas do nº 1 do referido art. 640º do CPC: não se identificam quais “concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados”, nem qual o diverso sentido em que os factos deveriam ter sido considerados; da mesma feita, referindo-se o nome de duas das testemunhas ouvidas em julgamento, não se refere qual o segmento do respetivo depoimento que impunha decisão diversa, sendo que, tendo o depoimento dessas testemunhas sido sujeito a gravação, as Recorrentes omitiram completamente o segmento imposto pelo art. 640º nº 2 al. a) do CPC, ou seja, não indicaram com exatidão as passagens da gravação.

    Como refere Abrantes Geraldes, «Importa observar ainda que as referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo. Exigências que afinal devem ser o contraponto dos esforços de todos quantos, durante décadas, reclamaram pela atenuação do princípio da oralidade pura e pela...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT