Acórdão nº 2392/12.0TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Fevereiro de 2015

Data24 Fevereiro 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório A...

, Lda., com sede no Bairro (...) , Viseu, NIPC (...) , instaurou contra B...

,, SA, com sede na Estrada (...) , Viseu, e C....

, C.ª de Seguros, SPA, com sede na Rua (...) , em Lisboa, acção declarativa de condenação, a seguir a forma sumária do processo comum, pedindo a final a condenação solidária das demandadas no pagamento da quantia de 7.729,54€ (sete mil, setecentos e vinte e nove euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescida dos juros à taxa legal contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Após convite ao aperfeiçoamento alegou, em síntese útil, ser a proprietária da viatura da marca Citroen, modelo Berlingo, com a matrícula (...) RX, a qual utilizava no desenvolvimento da sua actividade comercial. O veículo em causa foi interveniente num acidente de viação no dia 3 de Abril de 2010, cerca das 05:05horas, na Auto-Estrada A25, ao Km 98,2, no sentido Viseu/Mangualde, ocasião em que era conduzido pelo funcionário da demandante D... , o qual foi surpreendido com a presença em plena via de um animal da raça canina, que efectuou o atravessamento da esquerda para a direita, atento o sentido de marcha da viatura, tornando inevitável o embate. Da descrita colisão resultaram a morte do animal e estragos no veículo, nomeadamente ao nível do motor, cuja substituição por um outro, usado, foi suportada pela demandante, tendo importado em €1312,50. Ao referido dispêndio acresceram os custos do parqueamento cobrado pela oficina e aluguer de um veículo de substituição, devendo ainda ser considerada a desvalorização sofrida pela viatura sinistrada, tudo ascendendo a €2 729,54, reclamando a título de indemnização pelo dano de privação do uso a quantia de € 5 000,00 (200 dias x €25,00 por dia).

A responsabilidade da primeira ré fundamentou-a no facto desta não ter cumprido com os seus deveres de concessionária da aludida auto-estrada, não se mostrando as vedações colocadas no aludido troço adequadas a evitar a entrada do animal na via, tendo ainda violado o dever de as vistoriar regularmente conforme se encontrava obrigada; a demanda da segunda ré foi alicerçada na celebração do contrato de seguro titulado pela apólice n.º 008410333662, com cobertura de danos próprios, o qual se encontrava em vigor à data do acidente. * Regularmente citadas, contestaram ambas as RR: A demandada B... , invocando desconhecimento sobre o modo como o acidente ocorreu, impugnou a factualidade a este respeito alegada. Mais fez notar que a referida concessão, denominada A25, tem as características (perfil) de uma auto-estrada, mas era à data uma SCUT, donde não serem fechados os nós de entrada e saída da aludida infra-estrutura viária. Alegou por último que as vedações ali existentes à data, no que respeita à sua dimensão, extensão e localização, observavam os termos do contrato celebrado com o Estado Português, encontrando-se em perfeito estado de conservação e segurança, sendo certo ainda que sempre cumpriu de forma escrupulosa e cabal as suas obrigações de vigilância, efectuando patrulhamentos regulares, tudo para concluir que nenhuma responsabilidade lhe pode ser assacada. Invocando ter transferido para a seguradora F... , SA, sucursal em Portugal, a responsabilidade civil decorrente de sinistros da natureza do relatado nos autos através de contrato de seguro em vigor à data, requereu a intervenção acessória provocada da aludida seguradora, incidente que veio a ser admitido.

Quanto à demanda C... Companhia de Seguros, S.P.A., aceitou que o sinistro lhe foi participado, razão pela qual assumiu a reparação dos danos provocados pelo embate no animal verificados na chapa e pintura, tendo liquidado a este título o valor de €2509,60. Mais reconheceu ter rejeitado suportar a reparação dos danos no motor, dado que das averiguações a que procedeu concluiu que os mesmos só ocorreram devido ao facto do condutor da viatura segura não a ter imobilizado logo após o embate, tendo ainda percorrido cerca de 150 a 200 mt. Invocou finalmente ter fornecido à autora uma viatura de substituição pelo período contratualmente convencionado, donde nada poder ser-lhe exigido a este título, impondo-se a sua total absolvição.

Também a interveniente F..., SA, actualmente FF... , apresentou contestação autónoma, na qual fez notar que no termos do contrato celebrado com a ré B... , SA esta suportaria uma franquia por sinistro de € 5.000, tendo feito sua, quanto ao mais, a contestação apresentada por esta sua segurada.

* Fixado valor à causa e tabelarmente saneado o processo, prosseguiram os autos para julgamento, findo o qual foi proferida sentença que, na parcial procedência do pedido formulado, condenou as rés “ B... SA e C... Companhia de Seguros SPA a pagarem solidariamente à autora A... , Lda, a título de indemnização, a quantia de € 2964,54€ (dois mil novecentos e sessenta e quatro euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação”, absolvendo-as da parte sobrante do pedido.

Inconformadas com o decidido, apelaram a A e ambas as RR e, tendo apresentado as suas alegações, remataram-nas com as seguintes necessárias conclusões: A ré B... , SA: I. Entende a R./apelante, que o Tribunal a quo não analisou correctamente a prova produzida pelas partes, incorrendo em erro de apreciação da prova no que se refere à matéria do artigo 23º da contestação; II. De facto, e como se alcança designadamente do depoimento de H... transcrito nestas linhas, a vedação envolvente foi vistoriada em todo o sublanço (situado entre dois nós abertos ou não fechados da A25) onde eclodiu o acidente e encontrava-se em boas condições, sem qualquer anomalia, tal como alegado pela co-R.; III. Por isso, este item dos factos provados devia ter merecido a seguinte resposta: “a vedação da A25 encontrava-se, na data do sinistro, e em toda a extensão do sublanço compreendido entre os nós do Caçador e de Fagilde, em que se integra o local do sinistro, considerando, ademais, ambos os sentidos de marcha (ou seja, numa extensão total de cerca de 12 Km), em boas condições de segurança e de conservação, i. e., sem quaisquer falhas, rupturas, aberturas, deficiências ou anomalias de qualquer espécie”; IV. Depois, e quanto ao artigo 24.º (supõe-se que seja esse) da contestação da co-R. que o Tribunal entendeu considerar não provado, cremos que essa análise/decisão lhe estava vedada, na medida em que é evidente (percebe-se bem do teor daquele item) que a R. não alegou, muito menos se propôs provar, que o animal ingressou na via através de um dos nós da A25; V. Por isso, a sentença violou, salvo o devido respeito, o artigo 342º do Cód. porque não considerou a prova cabalmente produzida pela R. quanto ao bom estado das vedações, mas também violou o disposto no artigo 5º nº 2 alíneas a) e b) do NCPC, neste caso por não ter considerado – e devia tê-lo feito – factos importantes e/ ou instrumentais que resultaram da produção de prova (referimo-nos p. e. à extensão de vedação verificada que apesar de não alegada na contestação da co-R. resultou provada); Dito isto, VI. Não se vê qualquer razão válida e/ou atendível para que se chame à colação, em matéria de acidentes ocorridos em AE (e particularmente, para o que interessa, nesta A25) - e antes ou depois da entrada em vigor da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho (LN) -, o instituto da responsabilidade contratual, como faz a sentença; VII. Na verdade, não só a Base LXXIII do DL nº 142-A/2001, de 24 de Abril (ainda hoje em vigor) contraria essa ideia de uma forma absolutamente cristalina, mas também porque não havia cobrança de portagens na data do acidente (e ainda que houvesse, acrescente-se) e portanto o A. não pagou qualquer taxa de portagem naquela ocasião (cfr., aliás, o número 26 dos factos provados); VIII. Mais: a concessionária R. não podia - e não pode (mesmo com a introdução das chamadas “portagens virtuais” situadas em plena via) -, com ou sem cobrança de taxa de portagem, recusar o acesso à AE a quem quer que seja, não tem liberdade de celebração e/ou estipulação do conteúdo de um tal e pretenso contrato, além de que essa solução contratualista não explica a protecção que se estende a todos os ocupantes dos veículos e a quem, sem pagar taxa de portagem, circule em AE; IX. Por outro lado, e como também o parece sustentar a sentença, também não faz sentido que se convoque o contrato a favor de terceiro para este âmbito dos acidentes da AE, posto que o utente da via não tem qualquer direito subjectivo que possa autonomamente exercer (e exigir) da concessionária; X. De modo que a única opção possível para solucionar juridicamente esta matéria dos acidentes de viação ocorridos em AE – e particularmente nesta A25, como se vê da Base LXXIII já citada que não deixa margem para outra interpretação - é a do instituto da responsabilidade extracontratual (e isto tanto antes como depois do advento da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho); XI. Ora, é verdade que com o advento da referida Lei se procedeu a uma inversão do ónus da prova que agora impende sobre as concessionárias de AE, assim se criando um regime especial e inovador para este tipo de acidentes, embora – insista-se – sempre filiado na responsabilidade extracontratual; XII. Todavia, e como bem se percebe do espírito e do texto da Lei (dos nºs. 1 e 2 do artigo daquela Lei), mas também do elemento histórico de interpretação (vide projecto de lei nº 164/X do BE), já não corresponde à verdade que com essa Lei se tenha estabelecido uma presunção de culpa (ou de incumprimento) em desfavor das concessionárias, pois que se assim fosse a redacção do citado artigo 12.º nº 1 seria seguramente outra, mais próxima daquela constante do artigo 493º nº 1 do Cód. Civil; XIII. Efectivamente, e quanto às ditas presunções de culpa e/ou de incumprimento, nem tal decorre da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho, nem tal resulta do Decreto-Lei nº 142-A/2001, de 24 de Abril, concluindo-se tão-só que com o advento da Lei citada passou a impender um ónus de...

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