Acórdão nº 176/13.7GCGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelOLGA MAUR
Data da Resolução20 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 4ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra: RELATÓRIO 1.

Nos presentes autos o arguido A... foi absolvido da prática de um crime de ameaça agravada, dos art. 153º, nº 1, e 155º, nº 1, al. a), do Código Penal.

Foi, ainda, absolvido do pedido de indemnização deduzido pela ofendida.

  1. Inconformado, o Ministério Público recorreu, retirando da motivação as seguintes conclusões: «1ª - Face à matéria de facto dada com provada e não provada, merece o nosso reparo a decisão ora em recurso; 2ª - Já que existe uma contradição insanável entre a factualidade provada e vertida na al. D) e a factualidade dada como não provada e constante do ponto 1); 3ª - Ou seja, concretizando: ...dirigindo-se a B... , declarou em tom grave e sério que havia de matar a sua ex-mulher C... e que a seguir se matava a si; 4ª - Para logo a seguir dizer que ao proferir a expressão referida em D), o arguido se tenha dirigido à sua ex-mulher C... ; 5ª - O "busílis" parece estar no verbo "dirigir"; 6ª - Isto é, se o mesmo significa que tem de haver um "tete a tete" entre o agente ameaçador e o destinatário da ameaça, o visado; 7ª - Ou antes e bem ao invés, bastando tão somente que o meio utilizado seja idóneo, adequado, a provocar tal resultado, prescindindo-se da presença do visado a ouvir a expressão, o que no caso concreto nem sucedeu; 8ª - Sufragamos a segunda posição.

    9ª - Donde se entenda que o arguido praticou o crime por que foi absolvido, porquanto se entende que agiu o mesmo com dolo e que este tem de fazer parte da matéria de facto dada como provada; 10ª - Existe, por isso, na decisão ora em recurso o apontado vício do artº 410º nº 2-b) do CPPenal; 11ª - Tendo ainda sido feita má interpretação das normas dos art. 153º nº 1 e 155º nº 1-a), ambos do C.Penal».

  2. O recurso foi admitido.

    O arguido respondeu, defendendo a manutenção do decidido pois que as palavras que ele proferiu, embora versassem sobre a ofendida, foram dirigidas a terceira pessoa.

    Nesta Relação, o Exmº P.G.A. requereu a revogação da decisão.

    Alega que se verifica erro notório na apreciação da prova, conforme alegado no recurso, considerando os factos constantes dos pontos C), D) e E) da matéria provada e o ponto do nº 2 dos factos não provados.

    Alega, ainda, haver contradição insanável entre o facto da al. D) da matéria provada e o facto do ponto 1 dos factos não provado e as al. D) e E) e o ponto 2 da matéria não provada: o que releva para a norma é que a vítima tenha tido conhecimento da ameaça que lhe foi dirigida e, perante as palavras proferidas, não se percebe como é possível afirmar que o arguido não agiu com dolo.

    Foi cumprido o disposto no nº 2 do art. 417º do C.P.P..

  3. Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.

    Realizada a conferência cumpre decidir.

    * FACTOS PROVADOS 5.

    Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: «

    1. O arguido A... foi casado com C... , casamento esse que foi dissolvido por divórcio decretado no dia 25 de Junho de 2013.

    2. No âmbito de tal divórcio foi decidido que a casa de morada de família do ex-casal, sita em (...) , Guarda, ficou adjudicada à referida C... .

    3. No dia 31 de Agosto de 2013, pelas 20:55, o arguido dirigiu-se à residência da sua ex-mulher, em (...) , Guarda, a fim de lavar o seu veículo automóvel no respetivo logradouro.

    4. Nessas circunstâncias de tempo, modo e lugar, o arguido, dirigindo-se a B... , declarou em tom grave e sério que havia de matar a sua ex-mulher C... e que a seguir se matava a si próprio.

    5. Desde a ocasião supra relatada e em consequência das palavras proferidas pelo arguido, C... , por as ter ouvido, sente medo e receia encontrar-se com o arguido, temendo que este concretize o mal que anunciou contra a sua vida.

    6. O arguido encontra-se desempregado desde Junho de 2013 e desde então não aufere qualquer rendimento, vivendo de ajudas económicas alheias, sendo que anteriormente exercia em nome individual a profissão de comerciante de pneus, mediante o que auferia rendimentos sensivelmente equivalentes ao salário mínimo nacional.

    7. O arguido não tem quaisquer antecedentes criminais.

    8. Em consequência de ter ouvido o arguido e demandado proferir a expressão que se dá como provada, a demandante C... receia pela sua vida, encontrando-se amedrontada com o facto de o arguido e demandado se poder aproximar de si e cumprir o que anunciou.

    9. No decurso dos presentes autos, a demandante deslocou-se à GNR da Guarda, ao escritório da sua advogada e aos serviços do Ministério Público junto deste tribunal.

    10. O arguido é conhecido junto da comunidade em geral como sendo pessoa de bem, respeitada, respeitadora, considerada, honesta e humilde».

  4. E foram julgados não provados quaisquer outros factos com relevância para a causa, nomeadamente: «1) Ao proferir a expressão referida em D), o arguido se tenha dirigido à sua ex-mulher C... .

    2) O arguido tenha agido consciente e livremente, com intenção e vontade concretizadas de atemorizar a sua ex-mulher, constrangendo-a na sua liberdade pessoal, bem sabendo ser a conduta que assumiu proibida e punível por lei penal.

    3) Após os factos, o arguido e demandado se tenha revelado cada vez mais perturbado e envie (ou continue a enviar) mensagens para o telemóvel da demandante que lhe causem angústia e consternação.

    4) Os factos que se deram como provados tenham perturbado um filho da demandante e do demandado, em relação ao qual a demandante se tenha visto obrigada a procurar ajuda psicológica para tentar ultrapassar a situação.

    5) Em consequência dos factos que se deram como provados, a demandante tenha deixado por uns dias de conviver com amigos, por não estar em condições físicas e psíquicas para conviver socialmente, e até no seu local de trabalho estando sobressaltada com receio de que o arguido aí a fosse procurar.

    6) A demandante tenha despendido a quantia de €200,00 na realização das deslocações que se referem em H).

    7) O arguido sempre tenha sido muito amigo do seu filho.

    8) O arguido sempre tenha tido um comportamento moral e social exemplar, sempre tendo sido adverso a mentiras e calúnias».

  5. O tribunal recorrido motivou a sua...

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