Acórdão nº 473/13.1TBOHP.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | LU |
Data da Resolução | 09 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO “E.P.(…), LD.ª”, interpôs C (…), M (…) e D (…) , S.A.
”, todos com sinais nos autos, pedindo: 1) A condenação dos Réus no pagamento à Autora, a título solidário, da quantia de 1.916.823,90€, acrescida de juros moratórios vencidos até 11.10.2013, na importância de 573.914,56€, e vincendos até efetivo e integral pagamento; 2) A condenação dos Réus C (…) e M (…) no pagamento à Autora da quantia de 7.000,00€, acrescida de juros moratórios vencidos até 11.10.2013, na importância de 1.220,95€, e vincendos até efetivo e integral pagamento.
A Autora sustenta os seus pedidos na factualidade que a seguir, e em síntese, se enuncia: a) A Autora, que se dedica à atividade de comércio, importação e exportação de vestuário, têxteis e acessórios de moda, tem como sócios a sociedade (…), com uma quota de 30.000,00€, e a sociedade M (…) SGPS, S.A., com uma quota de 20.000,00€; b) Os Réus C (…) e M (…) são legais representantes da sociedade M (…), SGPS, S.A., sendo, respetivamente, vogal e presidente do seu conselho de administração; c) Os Réus C (…) e M (…) foram os únicos gerentes da Autora durante o período que mediou entre 23.01.2009 e 22.03.2013, tendo nesta última data cessado tais funções por deliberação da assembleia geral; d) Os Réus C (…) e M (…) são acionistas e administradores da Ré D (…)sociedade que se dedica à indústria, comércio, importação e exportação de artigos de vestuário, têxteis, malhas e similares; e) A Ré D (…) apresenta a seguinte estrutura acionista: 51% pertence ao Réu M (…); 37% pertence à sociedade (…) SGPS, S.A.; 9% pertence ao Réu C (…); 3% pertence a outros; f) Em assembleia geral de sócios da Autora, realizada no dia 02.02.2012, foi deliberado realizar uma auditoria financeira às contas da própria sociedade, para o que foi contratada a P(…) ( K(...) ); g) Nessa sequência, foram produzidos dois relatórios, segundo os quais os Réus C (…) e M (…) não agiram, enquanto gerentes da Autora, com os deveres de cuidado e de lealdade a que estavam adstritos, tendo, consequentemente, lesado aquela e os respetivos sócios, colocando em risco os interesses dos credores e a própria sustentabilidade da Autora; h) Em concreto, verificou-se que os referidos Réus, na qualidade de gerentes da Autora, solicitaram a entidades bancárias a antecipação de fundos de créditos comerciais desta, por via de «confirming», os quais foram utilizados para financiar a atividade da Ré D (…).
i) Tais operações de «confirming» originaram despesas e encargos bancários que foram suportados pela Autora, no valor de global de 126.452,57€; j) Entre agosto de 2009 e setembro de 2012, os Réus C (…) e M (…) também efetuaram diversas transferências bancárias da conta da Autora para a conta da Ré D (…), desviando fundos daquela para esta sociedade terceira, onde tinham interesses; k) E fizeram-no sem proceder a qualquer registo contabilístico, até que, em 31.12.2011, introduziram os valores transferidos na contabilidade da Autora, na categoria de «Outras contas a receber»: l) Tais transferências, no valor final apurado até setembro de 2012 de 2.061.000,00€, foram realizadas sem o conhecimento dos sócios, designadamente do sócio maioritário, não foram aprovadas por qualquer deliberação social e, não se encontrando tituladas sob alguma forma, também não resultaram de qualquer contrato celebrado entre a Autora e a Ré D (…) ou de qualquer operação comercial ocorrida entre ambas; m) Em virtude de tais transferências bancárias, e considerando a restituição já efetuada da quantia de 270.628,59€, é a Autora credora dos Réus na quantia de, pelo menos, 1.790.371,40€; n) Por efeito dessas transferências bancárias, não pode a Autora pagar a dívida que tem para com o seu fornecedor (..), nem pode distribuir lucros pelos seus sócios; o) Por fim, verificou-se que os C (…) e M (…), entre 2010 e 2011, enquanto gerentes da Autora, autorizaram que se procedesse a pagamentos a C (…) a título de adiantamentos, no montante de 7.000,00€, sem que que tivessem sido comprovadas quaisquer despesas realizadas; p) Assim, e por decorrência do disposto nos artigos 72.º e 75.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), são os Réus C (…) e M (…) responsáveis pelo pagamento das quantias acima aludidas, acrescidas dos respetivos juros de mora, sendo a Ré D(…) solidariamente responsável pelo pagamento das mesmas, com exceção da importância de 7.000,00€, com base no instituto do enriquecimento sem causa.
* Citados para os termos da presente causa, vieram os Réus contestar a ação, a fls. 601 e ss., arguindo a exceção de ilegitimidade dos representantes da Autora para a sua interposição e propugnando pela improcedência dos pedidos formulados.
Para tanto, e em síntese, alegaram o seguinte: a) A Autora encontra-se representada na presente lide por (…) cuja legitimidade, enquanto gerentes daquela, encontra-se a ser posta em causa no processo n.º 243/13.7TBOHP; b) Tal matéria constitui-se como questão prévia ao conhecimento dos pedidos a apreciar nestes autos; c) Em meados de 2007, o Grupo A (...) manifestou junto dos Réus C (…) e M (…), representantes da 3.ª geração do Grupo (..) interesse em estabelecer um acordo de entendimento comercial entre ambos os grupos, considerando que este último mantinha relações estáveis com o principal grupo têxtil europeu, a I (...) (proprietária das marcas Z (...) e M MM(...) ); d) Nessa sequência, em 30.07.2007, foi outorgado por ambos os grupos um Memorando de Entendimento, prevendo, por um lado, a constituição de uma empresa (veículo) comum na zona franca do Egito, por onde transitasse a comercialização do vestuário formal masculino encomendado pelo Grupo B (…) e manufaturado pelo Grupo (…)a, obtendo-se benefícios fiscais de incentivo à exportação, e, por outro lado, a constituição de uma outra empresa (veículo) comum, em Portugal, com a finalidade de efetuar encomendas à empresa egípcia, mas também para controlar as vendas, o markting, a administração e as finanças do comércio comum (para além de ainda controlar a qualidade de fabrico das encomendas manufaturadas no Egito); e) A partir de setembro de 2007, iniciaram-se relações comerciais entre estes dois grupos, tendo a Ré D (…) encomendado à (…) Co (doravante, S (...) ) a manufatura de fatos de homem (destinados à M MM(...) ), os quais foram entregues em novembro seguinte; f) Até ao termo do ano de 2007 e durante todo o ano de 2008, este tipo de cooperação foi-se desenvolvendo da seguinte forma: a Ré D (...) angariava as encomendas e colocava-as em produção na S (...) , sendo que previamente escolhia, comprava, fornecia e faturava as matérias-primas necessárias à produção; depois, a S (...) manufaturava as mercadorias sob a supervisão técnica local de funcionários da Ré D (...) ; após, a S (...) entregava-as à Ré D (...) , faturando e recebendo o pagamento devido; subsequentemente, a Ré D (...) entregava os produtos acabados aos seus clientes, faturando-lhes os valores respetivos; g) No decurso do ano de 2008, a Ré D (...) passou também a encomendar mercadorias destinadas ao seu cliente C C(...) ; h) Nesses dois primeiros anos, a Ré D (...) faturou nesse negócio cerca de 2.800.000,00€, com um ganho de cerca de 300.000,00€; i) No decurso do ano de 2008, o Grupo A (...) pretendeu solidificar a relação comercial então existente, tendo sido outorgado, em 17.09.2008, um «Frame Work Agreement» (Acordo-Quadro) entre a A (...) Company e a W (...) SGPS, S.A., por meio do qual se previa a constituição das tais sociedades veículo, com participação maioritária em ambas da A (...) (60/40); j) As duas sociedades veículo vieram a ser constituídas em 2008/2009, sendo uma egípcia, a (…)(doravante, EP Egito), e uma portuguesa, a E. W (...) (…)Ld.ª, aqui Autora (doravante, EP Portugal); k) Nos termos do aludido Acordo-Quadro, a EP Portugal destinava-se a substituir a Ré D (...) no exato procedimento que esta levou a cabo no decurso dos anos de 2007 e 2008, sendo que, durante o período de vigência do acordo (10 anos), deveria ser sempre a empresa W (...) a dirigir o órgão executivo daquela; l) Por efeito desse Acordo-Quadro, a partir de 2009, passou a ser a EP Portugal a encomendar diretamente à S (...) a produção das mercadorias e, subsequentemente, a entregar as mesmas aos clientes M MM(...) , Z (...) e C C(...) , procedendo à respectiva faturação junto destes; m) A EP Egito não teve neste processo quase nenhuma intervenção, uma vez que foi desativada pelo Grupo A (...) , tendo passado por ela, ao todo, apenas 4 faturas de fornecimentos de bens, no valor total de 493.444,40€; n) Por esse facto, não se registaram proveitos resultantes dos benefícios fiscais de incentivo à exportação que haviam motivado a constituição de tal sociedade egípcia numa zona franca; o) O procedimento acima aludido perdurou até meados de 2012, sendo que o volume total de negócios em causa ascendeu a 25.500.000,00€; p) A EP Portugal funcionava nas instalações da Ré D (...) , sendo que os administradores e funcionários de ambas as empresas eram comuns; q) Era a Ré D (...) que respondia perante fornecedores e clientes da EP Portugal, fosse pela garantia de pagamento, fosse pelo cumprimento dos prazos de entrega, fosse, ainda, pela garantia de qualidade dos produtos manufaturados; r) A Ré D (...) , por diversas vezes, retificou e emendou, na sua fábrica de Oliveira do Hospital, defeitos de produção decorrentes de erros praticados no Egito, tendo, não obstante, perdido um cliente, a sociedade Caramelo, que não aceitou o produto defeituoso produzido pela S (...) ; s) Pela confiança que havia adquirido junto de fornecedores e a pedido da própria S (...) , passou a ser a Ré D (...) a adquirir as matérias-primas necessárias à produção das mercadorias que a EP Portugal encomendava àquela S (...) ; t) Para fornecer as matérias-primas à S (...) , a Ré D (...) adquiria-as aos seus fornecedores, pagando-lhes em prazos médios nunca superiores a 90 dias e...
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