Acórdão nº 17/09.0TBPPS-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJAIME CARLOS FERREIRA
Data da Resolução07 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I Na Comarca de Coimbra - Lousã - Inst. Local - Sec. Comp. Gen. - J2, a Herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de J... e E..., representada pelos seus sucessores e co-autores, M... e marido F..., interpôs recurso de revisão da sentença proferida nos autos e transitada em julgado, invocando o art.º 696.º, als. c) e b), do Código de Processo Civil, pugnando pela revogação da sentença proferida nos autos, declarando-se que a documentação agora junta pelos Recorrentes prova que a propriedade reivindicada não é baldia, como foi pressuposto no julgamento de improcedência da ação, como demonstrado ficou que os mapas juntos pelos réus são falsos, pelo que toda a prova que neles se fundou não pode ser valorada, demonstrado ainda que a propriedade continuou privada desde o seu desaforamento até à aquisição pelo pai da co-autora, que estes herdaram por sua morte e, se assim se não entender, que seja repetido o julgamento a fim de, face aos elementos colhidos na documentação agora apresentada, ser feita a prova dos factos que autores e réus alegaram na ação revidenda.

Alegaram, em suma: - quanto à citada al. c), que a sentença transitou em julgado, confirmada que foi pelo acórdão da Relação de Coimbra proferido em 17.06.2014, tendo nessa sequência M... e marido F... recorrido ao Arquivo da Universidade de Coimbra em busca de documentação que demonstrasse que a propriedade em litígio nos presentes autos era particular privada e não baldia, tendo encontrado, nessa pesquisa, os documentos juntos sob os n.ºs 1 e 2 - Emprazamento a M ... e Emprazamento a M... ... -, dos quais tomaram conhecimento em 16 de Setembro de 2014 e com base nos quais consideram ser possível delimitar os limites do emprazamento e a transmissão da propriedade reivindicada nesta ação, desde que foi estabelecido o prazo (foro) pelo Collegio da Sapiência até chegar às mãos do pai de M... e de M..., mediante recurso aos documentos juntos sob os n.ºs 3 a 8 e 10 e ao mapa do documento n.º 9, que foram obtidos na sequência dos anteriormente referidos, propondo-se assim demonstrar que o prédio reivindicado, e que tem o antigo artigo matricial ..., fazia parte de um Prazo, propriedade do Colégio da Sapiência dos Cónegos Regrantes do Mosteiro de Santo Agostinho da cidade de Coimbra, que é uma propriedade de maior dimensão e inclui a propriedade reivindicada que na matriz de 1951 era o artigo ..., propriedade essa que após o desaforamento esteve na posse de uma só família, a qual em 1951 a vendeu aos pais de M... e de M..., tendo a área de 86 hectares na inscrição matricial em 1951 e sendo as confrontações da escritura e da matriz concordantes e não divergentes, em função do que se conclui estarmos perante uma propriedade privada particular e não propriedade baldia, como foi pressuposto na decisão revidenda; - quanto à citada al. b), que os mapas que foram juntos pelos réus na ação pretérita e que disseram ter obtido junto do Município são falsos porque são diferentes dos originais existentes no Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P., nas cores e numeração, tendo havido alteração das cores e tendo sido suprimida a numeração, com pequenos números a vermelho, que se alega corresponder à toponímia das áreas baldias do Perímetro Florestal de 1954, remetendo-se para o documento n.º 9, que se junta, mapas esses em que assentou a convicção do tribunal para concluir pelo carácter baldio da propriedade reivindicada pela autora.

II O recurso de revisão foi admitido na 1ª instância, por não se afigurar existir fundamento para indeferir ab initio o requerimento do mesmo – fls. 155.

Notificados os demandados, vieram ‘P..., L.da’, ‘Município de ...’ e ‘Freguesia de ...’ responder, pugnando pelo indeferimento do recurso de revisão, por não estar preenchido nenhum dos requisitos legais elencados pela recorrente para o dito efeito. III Realizou-se uma audiência prévia, os autos foram saneados e aí foram identificados o objecto do litígio e os temas da prova.

Teve lugar a audiência de julgamento.

Posto que foi proferida sentença que julgou improcedente o recurso de revisão e manteve nos seus precisos termos a sentença colocada em crise pelo presente recurso – fls. 211 e segs.

IV Dessa sentença interpôs recurso a Herança Requerente, em cujas alegações formula as seguintes conclusões: ...

V Contra-alegaram as Requeridas, onde também formulam as seguintes conclusões: ...

VII O recurso interposto pelos Requerentes foi admitido em 1ª instância, como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo, tendo como tal sido aceite nesta Relação.

Nada obsta a que se conheça do seu objecto, sendo que este se traduz na reapreciação da sentença recorrida, designadamente da questão de se saber se existe ou não fundamento para a revisão pretendida, por decorrência e aplicação dos requisitos das als. b) e c) do artº 696º do nCPC. Analisando essa dita sentença, dela resulta que os factos aí dados como provados assentaram na globalidade da prova produzida, quer documental, quer testemunhal, ... – fls. 1171 a 1183 da ação declarativa.

Aí se diz, como fundamentação da dita decisão de facto: ‘Concretizando, dir-se-á que atentando na prova produzida nos autos lograram os réus carrear aos mesmos elementos probatórios que confirmam de forma consistente, fundamentada e credível a versão por estes apresentada quanto ao uso e natureza do prédio onde foram instaladas as estruturas eólicas em causa nos autos, não só através da documentação junta aos autos como também da prova testemunhal produzida, a qual não se mostrou infirmada por qualquer elemento de prova suficiente e consistente que fosse susceptível de a abalar’.

Segue-se uma apreciação dos muitos depoimentos testemunhais produzidos e suas razões de ciência, bem como de vários documentos juntos aos autos, para se concluir que é na conjugação e valoração de todos os ditos elementos probatórios que foram considerados como provados e não provados os factos assim tidos.

Na dita sentença – fls. 1191 e segs.- e sob o aspecto jurídico da causa, escreveu-se: ‘Nos termos do artº 1287º do C. Civil, a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua aquisição. A posse traduz-se no exercício de poderes de facto sobre a coisa com intenção de exercer o direito real correspondente em nome e interesse próprios (artºs 1251º e 1253º do CC), envolvendo, assim, um elemento empirico e um elemento psicológico (o corpus e o animus). A situação possessória, para efeitos de usucapião, deve revestir carácter público e pacífico, sem o que não se contam os prazos para que se verifique esta forma de aquisição originária (artºs 1297º e 1300º, nº 1, do CC). A posse boa para usucapião deve, pois, ser exercida de modo a ser conhecida pelos interessados (artº 1262º CC) e se adquirida sem violência (artº 1261º CC). Impõe-se o decurso de determinado lapso de tempo que varia consoante a natureza coisa de cuja aquisição se trate e de acordo com as características da posse que lhe estejam na base. Os requisitos apontados para a aquisição por usucapião relativamente ao terreno em causa ficaram indemonstrados pela Autora. Assim sendo, recaindo sobre esta o ómus probandi, a ação não poderá deixar de improceder.

Como os Réus lograram demonstrar a versão por estes apresentada quanto ao uso e natureza do prédio onde foram instaladas as estruturas eólicas em causa nos autos e a autora alegava o contrário, ...

Pelo exposto, julgo a ação totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo os RR do pedido’.

No acórdão desta Relação proferido na sequência de recurso de apelação dessa sentença, escreveu-se no seu sumário (fls. 1937): ‘Invocando a A. a aquisição derivada e a aquisição originária (usucapião) da propriedade sobre determinada parcela de terreno, deverá demonstrar os factos correspondentes, designadamente que manteve a sua disponibilidade fáctica ou empírica (com os demais requisitos conducentes à invocada aquisição), improcedendo aquela pretensão se ficar demonstrado que se trata de um terreno comunitário (baldio) que, na falta de compartes, tem vindo a ser administrado pela respectiva Junta de Freguesia’.

E no seu desenvolvimento foi apreciada a então impugnação da decisão sobre matéria de facto, sem resultados, designadamente à luz dos depoimentos testemunhais que aí se analisam, concluindo-se pela improcedência dessa impugnação.

E uma vez mantida essa decisão, impôs-se a conclusão recursória de confirmação da sentença recorrida, aí se escrevendo: ‘Mantida a decisão de facto, nada se poderá objectar à improcedência da acção decidida em 1ª instância, pela simples razão de que a Autora não logrou demonstrar quer a aquisição derivada (em virtude do mencionado contrato de compra e venda de 1951), quer a aquisição originária (por usucapião) do trato de terreno em causa, desde logo por indemonstrados quaisquer actos dos AA. e antecessores evidenciando o exercício de poderes de facto ou empíricos sobre o terreno em apreço e corporizando a sua disponibilidade física ou empírica (eventualmente conducente, e subjacente, à usucapião)’.

Este resumo de actos processuais ocorridos na ação declarativa tem a ver com os fundamentos do presente recurso de revisão, a começar pela al. c) do artº 696º do nCPC, pois é essa também a ordem de exposição na petição deste processado, segundo a qual ‘a decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão quando se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida’.

Comentando esta disposição, diz o Cons. António Santos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT