Acórdão nº 1550/11.9TBLRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelEMIDIO FRANCISCO SANTOS
Data da Resolução09 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra A..., SA, instaurou execução para pagamento de quantia de 16 597,02, que compreende capital em dívida e juros, contra B... , Lda, C... e D... .

A execução teve por base a livrança junta a fls. 71. Nos termos do requerimento executivo, tal título foi assinado pela executada B... na qualidade de subscritora e por C... e D... na qualidade de avalistas da subscritora. A executada D... opôs-se à execução pedindo: 1. Se declarasse inepto o requerimento inicial; 2. Se declarar-se que ela, executada, era parte ilegítima; 3. Se declarasse sem força executiva o título; 4. Se julgasse procedente a oposição e que, em consequência, se absolvesse a executada da instância e dos pedidos.

Sustentou estas pretensões alegando em resumo: 1. Que não se depreendia do requerimento executivo qual o título executivo apresentado; 2. Que a livrança que servia de base à execução não foi assinada por ela, executada.

O exequente contestou, pedindo se julgassem improcedentes os embargos. Alegou que a livrança foi assinada pela executada; que a executada foi notificada de que ia ser feito o preenchimento da livrança.

No despacho saneador, o tribunal a quo julgou improcedente tanto a arguição de ilegitimidade como a de ineptidão do requerimento executivo.

O processo prosseguiu os seus termos e após a realização da audiência final, foi proferida sentença que julgou improcedentes os embargos.

A embargante não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo “a revogação da sentença com todas as consequências daí resultantes”.

Os fundamentos do recurso consistiram, em resumo, no seguinte: 1. Na impugnação da decisão relativa à matéria de facto; 2. Na imputação à sentença da violação dos seguintes artigos: 342.º e 374.º, ambos do Código Civil; 154.º, 668.º (actual 615.º), n.º 1, alíneas b), c) e d), do Código de Processo Civil; 13.º, 20.º, 202.º, 204.º e 205.º da Constituição da República Portuguesa.

A recorrida respondeu, pedindo se julgasse improcedente o recurso. Alegou, em resumo, que devia manter-se a decisão de facto e que a decisão recorrida não violou os artigos indicados pela recorrente.

* Considerando que o recurso suscita questões de facto e de direito e que a resolução daquelas questões tem precedência lógica sobre a resolução destas, iremos começar o julgamento do recurso pelo conhecimento da impugnação da decisão relativa à matéria de facto.

A recorrente começa por impugnar a decisão de julgar não provados os factos enunciados na decisão relativa à matéria de facto sob números 1, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9. Estão em causa as seguintes alegações feitas na oposição à execução: 1. Que o nome e a assinatura da executada não constam na livrança dada a execução; 2. Que a executada não apôs a sua assinatura na livrança; 3. Que a executada nunca foi notificada do preenchimento da livrança; 4. Que a executada nunca assinou nem nunca autorizou que assinasse por si nenhuma convenção de preenchimento da livrança em branco; 5. Que a executada nada deve ao exequente, nem se obrigou a pagar ao exequente qualquer dívida; 6. Que o título apresentado à execução nunca foi do conhecimento da executada; 7. Que nunca foi dado conhecimento à executada do preenchimento da livrança; 8. Que a executada nunca assinou qualquer compromisso com o exequente; 9. Que a executada esteja divorciada do executado C... ; que estejam há muito separados; que não façam vida em comum desde 2003 e que desde essa data que, em conjunto com o executado C... , não assina qualquer documento ou garantia, nomeadamente a livrança que serve de base à execução.

A recorrente pede se julguem provados estes factos.

Os fundamentos da sua pretensão foram os seguintes: 1. Que do exame feito à letra da executada apenas resultou como provável que tenha sido a mesma a apor a sua assinatura e que o provável não significa certeza; que o exame não deu a certeza absoluta porque, na realidade, não foi a executada quem assinou o título dado à execução; 2. Que resultava do depoimento da executada D... que a mesma não assinou nenhum documento relativo à sociedade gerida pelo seu ex-marido (o executado); 3. Que resultou do depoimento da testemunha E... que a executada nunca interveio em qualquer assunto relacionado com a empresa, nem assinava documentos relacionados com a mesma; 4. Que o tribunal firmou-se exclusivamente no relatório pericial.

Antes de entrarmos na apreciação da argumentação da recorrente, importa dizer que ela versa apenas sobre a questão de saber se foi a executada quem escreveu no verso da livrança, por baixo dos dizeres “dou o meu aval à firma subscritora”, o seu nome ( D... ). Daí que, apesar de a recorrente ter declarado o seu inconformismo em relação a vários segmentos da decisão de facto, a questão de facto essencial é aquela que indicámos acima: saber se foi a executada quem escreveu no verso da livrança, por baixo dos dizeres “dou o meu aval à firma subscritora”, o seu nome ( D... ).

Entrando, agora, na apreciação da mencionada argumentação, importa começar por dizer que é exacto que o perito que procedeu à comparação da escrita que se sabe pertencer à executada [escrita constante de fls. 75 a 78] com a escrita “suspeita” [constituída pela assinatura com o nome de D... , aposta no verso da livrança, e pela assinatura com o mesmo nome, aposta no documento de fls. 73, da proposta de concessão de uma abertura de crédito] foi de parecer que, numa escala com vários graus de probabilidade [pouco provável, pode ter sido, provável, muito provável, muitíssimo provável e praticamente provada], era apenas provável que a letra suspeita fosse da executada.

E é exacta ainda a alegação da recorrente de que o parecer do perito não significa uma certeza absoluta quanto à autoria da assinatura. Com efeito, de acordo com a tabela de significância usada pelo perito, “provável” significa, em termos de percentagem, uma percentagem acima de 50%, mas inferior a 70%.

Esta circunstância não determina, no entanto, que se julgue não provado que foi a executada quem escreveu o seu nome no verso da livrança, nem muito menos, como pretende a recorrente, se julgue provado que não foi ela quem escreveu o seu nome no verso da livrança.

É que a prova, qualquer que ela seja, não tem por função demonstrar a certeza absoluta de um facto. Segundo o artigo 341.º do Código Civil, as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos. Socorrendo-nos das palavras de Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, Limitada, página 420, “… a demonstração da realidade de factos … não pode visar um estado de certeza lógica, absoluta, sob pena de o Direito falhar clamorosamente na sua função essencial de instrumento de paz social e de realização da justiça entre os homens. A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade, essenciais à aplicação da prática...

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