Acórdão nº 314/14.2TAGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Abril de 2016

Data27 Abril 2016
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 4ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra: RELATÓRIO 1.

O arguido A... foi condenado na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 6 €, por cada um dos dois crimes de ameaça agravada praticados, dos art. 153º, nº 1, e 155º, nº 1, al. a), do Código Penal, tendo a pena única sido fixada em 240 dias de multa, à mesma taxa.

Foi, ainda, condenado a pagar à demandante civil B... a quantia de 1.000,00 € a título de indemnização, acrescida de juros à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da notificação para contestar o pedido até pagamento.

  1. O arguido recorreu, concluindo: «

    1. O arguido A... foi condenado pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de dois crimes de ameaça agravada p, e p. pelos artigos 153º, nº 1 e 155º, nº 1, al a), do Código Penal, nas penas parcelares de 150 (cento e cinquenta) dias de multa por cada um deles, e, após cúmulo jurídico, na pena única de 240 (duzentos e quarenta) dias de multa à taxa diária de €6,00 (seis euros), num total de € 1.440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros).

      Foi ainda o demandado civil A... condenado a pagar à demandante, sua filha, B... , a quantia de €1.000,00 (mil euros), acrescida de juros à taxa legal de 4% ao ano desde a data em que o demandado se considera notificado para contestar o pedido em causa até efectivo e integral pagamento, tudo a título de indemnização civil.

    2. A matéria que o Tribunal recorrido enumerou como provada mostra-se escassa e insuficiente para dela se concluir pela existência da prática de dois crimes de ameaça agrava, crimes pelos quais decidiu condenar o ora recorrente; c) A matéria considerada provada não permite suportar, por insuficiência, a existência da prática de dois crimes de ameaça agravada praticados pelo arguido; d) Para tal teriam que ficar inequivocamente provados factos que demonstrassem o registo da conversa telefónica que deu origem às ameaças, sendo que a prova testemunhal também não foi suficientemente conclusiva quanto à existência das referidas ameaças; e) Foi com base apenas nas declarações da assistente, as quais não foram prestadas com o devido rigor e de um modo espontâneo ou escorreito, que o Tribunal recorrido formou a sua convicção, extraindo, mesmo sem qualquer suficiência e razoabilidade, o julgamento da existência da prática de dois crimes de ameaça agravada; f) Só após grande insistência do Tribunal, a assistente acaba por dizer que o arguido lhe dirigiu expressões como: "vou aí, arrombo-te a porta e mato-te a ti e a ele", com notória evidência que a assistente só o disse porque o Tribunal assim o insistiu ao referir por diversas vezes como: "alguma vez o seu pai usou o verbo matar?" e "é que uma coisa é dizer dou-te um tiro nos cornos, outra coisa é dizer mato-te a ti e a ele".

    3. Com grande probabilidade o arguido nunca dirigiu essas expressões à assistente, bem como dificilmente o Tribunal poderia firmar a sua convicção já que não existe qualquer meio probatório que possibilite firmar com convicção a existência da conversa telefónica entre o arguido e a assistente.

    4. O Tribunal recorrido faz alicerçar a sua convicção, de forma essencial e decisiva, no depoimento da assistente, sendo certo que só com grande dificuldade a assistente referiu expressões com a palavra "mato-te" e de uma forma forçada e artificial.

    5. Esse depoimento, pela forma como foi prestado e por não se encontrar acompanhado de qualquer outro meio de prova não poderá nunca ser suficiente para dar como provado que o arguido praticou os factos pelos quais vem acusado e que se consubstanciam na prática de dois crimes de ameaça agrava.

    6. O Tribunal recorrido ao condenar o arguido, desta forma, pela prática de dois crimes de ameaça agravada está a colocar em causa as suas garantias de defesa, nomeadamente o principie in dubio pro reo.

    7. Assim o exige o princípio in dubio pro reo, o qual decorre do princípio da presunção de inocência do arguido, previsto no nº 2, do artigo 32º da CRP, que se deverá absolver o arguido "em caso de dúvida do julgador sobre a culpabilidade do acusado." l) Portanto ao Tribunal é dirigida uma imposição "no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa." m) Deste modo, ao existir insuficiência na prova produzida, não poderá ser outra a decisão senão pela absolvição do réu, com base no princípio do in dubio pro reo bem como pela decisão de considerar o pedido de indemnização cM! como improcedente na sua totalidade».

  2. O recurso foi admitido.

    O Ministério Público respondeu. Alega que o arguido se limitou a discordar com o sentido da decisão, que o tribunal retratou o que resultou do julgamento, pelo que a sentença deve ser mantida.

    Nos mesmos termos se pronunciou o Sr. P.G.A., dizendo que o arguido nem imputa à decisão qualquer dos vícios referidos no nº 2 do art. 410º do C.P.P., nem impugna a decisão da matéria de facto, nos termos do art. 412º, limitando-se a contrapor a sua convicção à convicção do tribunal, sendo certo que os factos dados como provados resultaram da prova feita, legalmente atendível.

    Foi cumprido o disposto no nº 2 do art. 417º do C.P.P..

  3. Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.

    Realizada a conferência cumpre decidir.

    * FACTOS PROVADOS 5.

    Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: «

    1. O arguido A... é progenitor de B... , nascida a 9 de Setembro de 1985 e de D... , nascida a 14 de Fevereiro de 1997.

    2. Em data não concretamente apurada, mas situada no final do mês de Fevereiro ou no início do mês de Março de 2014, num Domingo, cerca das 22:00, o arguido, a propósito de a sua filha D... se encontrar a residir com a sua filha B... , dirigiu-se a esta última através de contacto telefónico, encontrando-se a mesma na respectiva residência, sita em Avenida (...) , Guarda, e em tom sério, ao longo de uma conversa, disse-lhe, entre o mais: “eu vou aí e mato-te a ti e ao teu marido”, “se ele não se cala dou-lhe um tiro nos cornos”.

    3. Em consequência da actuação do arguido, desde a ocasião supra relatada, B... sente medo e receia que aquele arguido, em concretização das expressões proferidas, atente contra a sua vida e integridade física.

    4. O arguido agiu consciente e livremente, com intenção e vontade de atemorizar a sua filha B... e marido C... , constrangendo-os nas respectivas liberdades...

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