Acórdão nº 1/13.9GBFVN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução20 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

Relatório Nos presentes autos que correm termos na Comarca de Leiria, Instância Central – Secção de Instrução Criminal ( Juiz 3), em que é arguido José Teixeira Pacheco , a Ex.ma Juíza de Instrução, por despacho 28 de Maio de 2015, decidiu rejeitar, por inadmissibilidade legal, o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente A... .

Inconformado com o douto despacho de 28 de Maio de 2015 dele interpôs recurso o assistente A... , concluindo a sua motivação do modo seguinte: A - O inquérito tem por finalidade investigar a existência de um crime, bastando a mera notícia do mesmo para que possa ser feita a respectiva denúncia, devendo o Ministério Público proceder ao registo de todas as denúncias, que lhe forem transmitidas (artigos 244.º, 247.º e 262.º do CPP).

B - A instrução, por seu lado, visa comprovar judicialmente a decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito e o requerimento para a abertura de instrução deve conter os factos, que o Requerente espera provar, através das diligências a realizar e dos meios de prova a produzir na instrução (artigos 286 ° e 287 ° C. P. P.).

C - A decisão instrutória só pode, validamente, pronunciar o arguido por factos descritos na acusação do Ministério Público ou do Assistente, ou no requerimento para a abertura de instrução, ou que não constituam uma alteração substancial deles, sendo nula em caso contrário (n.º 1 do artigo 309.º do Cód. Proc. Penal).

D - Nesta conformidade, pois, a fase de instrução não é um segundo inquérito e, para que haja abertura de instrução, é indispensável que um crime esteja descrito numa acusação ou no requerimento de abertura de instrução, não bastando a mera notícia ou imputação de crimes em abstracto, sendo essencial a data da prática dos factos, a identificação do (s) arguido (s), o elemento subjectivo da infracção e uma correcta articulação dos factos imputados.

E - O assistente requereu a abertura de instrução em tempo; F - O Requerimento de Abertura de Instrução apresentado, contem a identificação do arguido, G - O dia e local da prática dos factos, H - A identificação das disposições legais violadas, I - Os elementos objectivos e subjectivos dos crimes imputados, J - A indicação dos actos de instrução que o assistente pretende que o Juiz leve a cabo, e que não foram considerados em inquérito, além de permitir o direito de defesa e do arguido, K - Preenche os requisitos legais 287.º n.º 2 do CPP e 283 n.º 3 alíneas b) e c) do CPP.

L - Nomeadamente: 1) As indicações tendentes à identificação do arguido; (art. l.º do RAI) 2) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada; (art. 11.º a 39.º do RAI;) 3 ) A indicação das disposições legais aplicáveis; (art.17.º; 26.º, 27.º e pedido de abertura de instrução no RAI) M - O Requerimento de Abertura de Instrução apresentado pelo assistente preenche os requisitos legais, permite o direito de defesa e do arguido, preenche os requisitos legais 287.º n.º 2 do CPP e 283.º n.º 3 alíneas b) e c) do CPP. Pelo que, deveria ter sido admitido.

N - Ao decidir em sentido contrário a decisão recorrida violou, entre outras, as normas estatuídas nos artigos art.283.º n.º 3 alínea b) e 287.º n.º 2 ambos do Cód. Processo Penal.

Termos em que, Venerandos Desembargadores, em conformidade com o exposto e requerido e pelo mais que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao recurso e a douta decisão recorrida, ser revogada e substituída por outra que admita o Requerimento de Abertura de Instrução apresentado pelo Assistente, por legal e tempestivo, assim se fazendo Justiça.

O Ministério Público na Comarca de Leiria, Instância Central, de Instrução Criminal , respondeu ao recurso interposto pelo assistente, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do despacho recorrido.

A Ex.ma Procuradora-geral Adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso deverá ser julgado improcedente.

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do C.P.P., não tendo o assistente respondido ao parecer da Ex.ma PGA.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação O Despacho recorrido tem o seguinte teor: « Nos presentes autos foi proferido despacho de arquivamento pelo Ministério Público, nos termos do disposto no artigo 277º, nº. 2 do Código de Processo Penal, por se ter concluído pela falta de indícios suficientes da participação do arguido nos factos indiciados (fls.193 a 196).

Não se conformando com tal despacho, veio o assistente requerer a fls. 203 e ss. a abertura de instrução, pelos fundamentos que constam no requerimento de abertura de instrução e que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

Impõe-se, pois, apreciar e decidir se o requerimento apresentado para a abertura de instrução cumpre os requisitos exigidos para ser admitido nos autos.

De acordo com o disposto no artigo 287º do Código de Processo Penal: “ 1 - A abertura de instrução pode ser requerida, no prazo de 20 dias a contar da notificação da acusação ou do arquivamento: a) (…) b) Pelo assistente, se o procedimento não depender de acusação particular, relativamente aos factos pelos quais o Ministério Público não tiver deduzido acusação.” De acordo com o disposto no artigo 286º, nº. 1 do Código do Processo Penal “ A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento”.

De acordo com o disposto no artigo 287º, nº. 2 do Código de Processo Penal, o requerimento para abertura da instrução “não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como sempre que for caso disso, a indicação dos atos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e outros, se espera provar, sendo ainda, aplicável ao requerimento do assistente o disposto no artigo 283.º, n.º 3, alíneas b) e c) (...) ”.

Dispõe a alínea b) do n.º 3 do artigo 283.º do Código de Processo Penal que “a acusação contém, sob pena de nulidade a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada”.

Sendo que de acordo com a al. c) do artigo 283º, nº. 3 do Código de Processo Penal a acusação contém, sob pena de nulidade “A indicação das disposições legais aplicáveis.”.

Do cotejo dos preceitos legais citados resulta que o requerimento da abertura de instrução apresentado pelo assistente tem de conter a indicação dos factos que fundamentam a sujeição do arguido a julgamento, assim como a indicação das disposições legais aplicáveis.

Deve assim ser semelhante a uma acusação pública, por força da remissão operada pelo art. 287.º, n.º 2 para o art. 283.º, n.º 3, alíneas b) e c), ambos do Código de Processo Penal.

Importa referir que abstendo-se o Ministério Público de acusar, o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente terá de conter uma verdadeira acusação, para possibilitar a realização da instrução, fixando os termos do debate e o exercício do contraditório, bem como a elaboração da decisão instrutória.

Compreende-se tal exigência já que, não havendo acusação pública, cabe ao assistente no requerimento de abertura da instrução delimitar os factos que serão objeto de apreciação em sede de instrução.

Tal exigência impõe-se em nome de princípios fundamentais do processo penal que têm também assento constitucional, nomeadamente o direito de defesa e a estrutura acusatória do processo penal.

Desta delimitação do objeto do processo resulta o estabelecido nos art. 303º, nº. 3 e 309º, nº. 1, ambos do C.P.P., que proíbe a pronúncia do arguido por factos que constituam...

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