Acórdão nº 2278/11.5TACBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Fevereiro de 2016
Magistrado Responsável | ALBERTO MIRA |
Data da Resolução | 03 de Fevereiro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório: 1.
No âmbito do processo comum (tribunal singular) que, sob o n.º 2278/11.5TACBR, corre termos na Secção de Competência Genérica - J1 -, da Instância Local de Gouveia, Comarca da Guarda, o Sr. Juiz proferiu, em 12 de Junho de 2015, a fls. 32/35 destes autos, decisão, sob a forma de despacho, em que, a final, em contrário da pretensão requerida A... , julgou não verificados os “pressupostos para extinção do procedimento criminal, por falta de queixa”.
* 2.
Discordando, o arguido A... interpôs recurso, tendo formulado na motivação respectiva as seguintes (transcritas) conclusões: 1.ª - O recurso tem por objecto o despacho do Tribunal Judicial da Comarca da Guarda que indeferiu o requerimento apresentado pelo ora Recorrente por julgar não verificados os pressupostos para extinção do procedimento criminal por falta de queixa.
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- Segundo o referido despacho, os números 1 e 3 do artigo 31.º da Lei da Imprensa consagram duas incriminações autónomas, a dos autores do texto/notícia e daqueles que podiam ter obstando à sua publicação, quando podiam e deviam tê-lo evitado e não o fizeram.
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- Nos termos do mesmo despacho, o Tribunal entendeu que está em causa a punibilidade por omissão, estando a cargo do director um dever de garante.
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- Conclui, argumentando que, não estando em causa uma publicação não periódica, nunca a conduta do director poderia ser criminalmente sancionada, na medida em que essa incriminação assenta no pressuposto de estarmos perante uma publicação não periódica.
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- Defende o Recorrente que tal entendimento não deve proceder, desde logo, porque os factos constitutivos da comparticipação do crime de difamação foram invocados pela Assistente, nomeadamente, no artigo 6.º do seu articulado, e constituem os elementos em que esta sustenta o seu pedido de indemnização civil.
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- Pese embora o acima alegado, a verdade é que a queixa que deu origem aos presentes autos apenas foi intentada contra o jornalista A... e não contra o Director do jornal “x...”.
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- Ora, dispõe o número 3 do artigo 115.º do Código Penal que “o não exercício tempestivo do direito de queixa relativamente a um dos comparticipantes no crime aproveita aos restantes, nos casos em que também estes não puderem ser perseguidos sem queixa”.
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- Isto porque, “Com o dispositivo do número 3, consagrou-se e generalizou-se o princípio da indivisibilidade das consequências do não exercício tempestivo do direito de queixa relativamente a um dos comparticipantes do crime. Em matéria criminal não se pode escolher quem deve ser perseguido no caso de comparticipação; o que está em causa é o crime” (Código Penal anotado, Manuel Lopes Maia Gonçalves, p. 412, Almedina).
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- Ora, embora o procedimento criminal não dependa de acusação particular quando a difamação tenha sido dirigida a uma das pessoas referidas na alínea l) do número 2 do artigo 132.º daquele Código, o artigo 188.º exige, mesmo nestes casos, se tenha de apresentar queixa.
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- Quer isto dizer que, estando em causa uma situação de “crime praticado na imprensa”, tinha a Assistente obrigatoriamente de ter também apresentado queixa contra o Diretor e não apenas contra o jornalista que assinou o artigo, tal como tem sido entendido pela jurisprudência.
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- Assim, salvo melhor opinião, uma vez que estamos perante um crime que depende de uma queixa prévia, não tendo esta sido apresentada contra o Diretor, aproveita ao Arguido.
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- Por outro lado, refere o despacho “a quo” que «da leitura do artigo 31.º, n.º 3, da Lei da Imprensa resulta com evidência que o legislador faz depender a criminalização do Diretor e demais agentes aí previstos de vários pressupostos, dos quais destacamos: “no caso de publicações não periódicas”», acrescentado, posteriormente, que «desta feita, não sendo o caso dos autos uma publicação não periódica, não está em causa a eventual aplicação do n.º 3».
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- Entende o ora Recorrente que tal entendimento não pode proceder, o qual resulta absolutamente contrário à lei, uma vez que a referência que é feita às publicações não periódicas apenas diz respeito à figura do editor, não relevando quanto ao diretor, ao diretor-adjunto, ao subdiretor ou quem concretamente os substitua. E é assim, na medida em que as publicações não periódicas não têm diretor, diretor-adjunto ou subdiretor.
Por tudo o supra exposto deve o despacho recorrido ser revogado e substituído por decisão que ordene o imediato arquivamento dos autos, por falta dos pressupostos legais para o seu prosseguimento, nos termos do disposto no número 3 do artigo 115.º do Código Penal, assim se fazendo a costumada justiça.
* 3.
Em resposta, a demandada civil “B... , SA” manifestou-se no sentido do provimento do recurso.
* 4.
Diversamente, o Ministério Público e a assistente C... preconizam seja o recurso julgado improcedente, conclusivamente, nos termos infra reproduzidos:
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Ministério Público: 1. O recorrente censura o juízo expendido pelo Mmº Juiz a quo tão-somente acerca da matéria de direito, no que concerne ao facto do princípio da indivisibilidade do direito de queixa.
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Da leitura do preceito legal resulta que o legislador pretendeu, neste caso em concreto, em que se contrapõe o exercício da liberdade de imprensa, por uma lado, e a salvaguarda da reserva da vida privada, por outro, consagrar, em primeira linha, a responsabilidade - a autoria - do crime de ofensas de bens jurídicos alheios cometidos através da imprensa, ao autor do texto (n.º 1 do art.º 31.º da Lei de Imprensa).
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Numa segunda linha responsabiliza aqueles que podendo obstar à sua publicação o não fizeram - director, o director-adjunto, o subdirector ou quem concretamente os substitua (n.º 3 do art.º 31 do referido diploma legal).
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Nos termos do citado art.º 31.º da Lei de Imprensa, o director e o autor de um determinado escrito publicado na imprensa não são co-autores no sentido estrito do termo, pois que a um e a outro cabem penas diversas.
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Não há, a nosso ver, em conformidade com a posição que já adoptamos nos presentes autos, uma responsabilidade criminal solidária/necessária. De facto o referido n.º 3 do art.º 31.º refere-se à punibilidade por omissão, dizendo que o director tem um dever de garante, pelo qual pode vir a ser responsabilizado se nada fizer, nos casos em que podia/devia agir.
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Existindo um autor identificado, só este é autor do crime.
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Assim, não estando em causa uma situação de co-autoria, mas antes de autoria singular, individual, de texto publicado em jornal, definida pela lei, não tem aplicação o princípio da indivisibilidade das consequências do não exercício tempestivo do direito de queixa.
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O autor, definido pela lei como o único responsável pelo seu conteúdo, será sempre o subscritor do artigo.
Termos em que, e nos mais que V. Excelências suprirão, não se deverá dar provimento ao recurso interposto pelo arguido A... , mantendo-se na íntegra a decisão recorrida, assim se fazendo justiça.
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Assistente: 1. Do confronto entre o n.º 1 e o n.º 3 do artigo 31.º da Lei de Imprensa não decorre uma situação de comparticipação criminosa entre o autor do texto/notícia e - no que ao caso importa - o diretor, mas antes duas incriminações autónomas, 2. a que correspondem imputações e molduras penais distintas.
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Do artigo 114.º, aplicável ex vi o artigo 117.º ambos do Código Penal, decorre que a apresentação de acusação particular contra um dos comparticipantes no crime torna o procedimento criminal extensivo aos restantes, pelo que nunca se poderia considerar, ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 115.º do Código Penal, que não foi deduzida acusação particular também contra aquele.
Deve, pois, ser mantido o douto despacho recorrido, negando-se provimento ao recurso, como é de inteira justiça.
* 5.
Nesta Relação, tendo vista dos autos, o Sr. Procurador-Geral Adjunto, sufragando a posição do MP em...
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