Acórdão nº 100/14.0GCSRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra I - Relatório No processo supra identificado o Ministério Público deduziu acusação para julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, contra o arguido A...

, casado, nascido em 03/04/1951, em Évora, filho de (...) e (...) , residente no (...) , Proença-a-Nova, imputando-lhe a prática de um crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153.º, n.º1, do Código Penal (CP).

A ofendida / demandante civil deduziu pedido de indemnização civil, peticionando a condenação do arguido no pagamento da importância de € 1.500,00, a título de danos não patrimoniais sofridos.

* O tribunal decidiu: a) Condenar o arguido, pela prática, em autoria material, de um crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153.º, n.º1, do CP, na pena de 65 dias de multa, à razão diária de € 9, no total de € 585.

b) Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado, condenando o arguido no pagamento da quantia de € 400.

* Inconformado recorreu o arguido, o qual pugna pela sua absolvição, formulando as seguintes conclusões: «1 - A versão dos factos apresentada pela Queixosa/Demandante Civil não pode merecer credibilidade por parte do Tribunal.

2 - Tal versão foi sustentada nos depoimentos das testemunhas B... , os quais se revelaram eivados de falta de isenção e clareza e cheios de contradições e ambiguidades as quais se concretizam sinteticamente no seguinte: B...

, cujo depoimento se encontra gravado em CD e teve o seu início pelas 11h.06m e 14s., tendo terminado pelas 11h.22m e 12s., referiu que: - "Quando ele passou eu estava a apanhar cogumelos".

- "Fomos à casa da senhora mas ela não estava".

- "À volta para baixo este senhor passou com a carrinha vermelha".

A D.

C... cujo depoimento se encontra gravado em CD, teve tido início pelas 11h22m51s e fim pelas 11h33m44s., referiu que: "Não se recorda de ter parado e que não apanharam nada, disse mais não estou a mentir, não tenho razão para estar a mentir".

"Referiu que a Senhora da casa, onde iam estava em casa".

"Referiu que ainda lá estiveram algum tempo, pois ainda foram cortar as árvores, os ramos para fazer jarras".

"Referiu ainda que quando se cruzaram com o Sr. A... ainda iam para lá, ou seja para a casa da senhora".

3 - Por isso no caso subjudice o recorrente considera incorrectamente julgados os pontos 1, 2, 3, e 4 da matéria de facto dada como provada, os quais face á prova produzida em audiência de julgamento devem ser considerados como não provados.

4 - No caso concreto não existem provas que devam ser renovadas, uma vez que conforme se alegou não foi feita prova dos factos constantes da acusação.

5 - A decisão terá assim que ser alterada em consequência dos depoimentos prestados pelas testemunhas B... e C... não serem suscetíveis de merecer credibilidade, por terem sido prestados de forma não isenta e cheios de contradições e ambiguidades, pelo que, face a ausência de prova dos factos constantes da acusação terá o arguido que ser absolvido com base no princípio "in dúbio pro reo ".

6 - Como o arguido negou a prática dos factos que vinha acusado, a condenação do recorrente assentou unicamente nos referidos depoimentos e face à inexistência de outras testemunhas que tenham corroborado a versão da recorrida de forma isenta e credível, a única alternativa é a de aplicar o princípio "in dúbio pro reo", absolvendo o recorrente, não só da acusação contra si formulada como também do pedido cível deduzido; 7 - Assim, verifica-se uma subversão dos princípios de presunção da inocência na face de julgamento e "in dúbio pro reo", com a violação expressa do comando contido no artigo 62.º, n.º 2 da Constituição de República Portuguesa; 8 - O supra exposto traduz-se também em erro notório na apreciação da prova e contradição entre a fundamentação e decisão, dado que a decisão surge como conclusão ilógica e contraditória, violadora das regras da experiência comum; 9 - Mostra-se também violado o preceituado no artigo 410.º, n.º 2, alínea a) e c) do CPP.

10 - Se o Tribunal assim o não entender sempre se dirá que a frase que é atribuída ao arguido tem que ser entendida, num contexto em que as relações familiares de parte a parte se regem por conflitos e desentendimento diários, não podendo por isso a mesma ser entendida como tendo o arguido intenção de praticar um mal futuro, na pessoa da queixosa, não preenchendo a mesma, a tipicidade objetiva do crime de ameaças.

11 - Atendendo à ilicitude do facto, ao dolo do agente, às condições de vida, à situação económica e ao facto de ser delinquente primário, a pena aplicada ao recorrente, pelo Tribunal "a quo" mostra-se exagerada; 12 - Cabendo ao crime em causa, p.p. pelo artigo 153.º, do C. Penal, uma pena de multa de 120 dias, a pena de multa não deve ser superior a 50 dias; 13 - A quantia diária da multa é exagerada em função das circunstâncias e modo de vida do recorrente, devendo ser fixada em valor não superior a 5€.

14 - Nesse caso a indemnização deve ser reduzida ao montante de €250,00».

* Notificado o Ministério Público nos termos do art. 413.º, n.º 1, do CPP, sustenta que o recurso não merece provimento e que a sentença recorrida deve manter-se, uma vez que não houve errada apreciação da prova, não foi violado o princípio in dúbio pro reo e que a determinação da pena concreta l, bem como o quantitativo da taxa diária da multa obedeceram aos critérios legais aplicáveis.

* Nesta instância, os autos tiveram vista do Ex.ma Senhor Procuradora-geral Adjunta, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, a qual, em síntese, emitiu douto parecer no sentido de que acompanhava as contra-alegações do MP na 1.ª instância.

* Notificado o arguido, nos termos do art. 417.º, n.º 2, do CPP respondeu, limitando-se a dizer que mantém tudo quanto consta das alegações de recurso.

* Foi cumprido o art. 418.º, do CPP, e uma vez colhidos os vistos legais, indo os autos à conferência, cumpre decidir.

* Vejamos pois a factualidade apurada pelo tribunal e respectiva motivação: Factos provados: Da acusação pública e do pedido cível: 1) No dia 28 de Novembro de 2014, cerca das 14 horas, junto ao Pontão do Laranjeiro, no concelho de Proença-a-Nova, o arguido A... seguia no seu veículo automóvel e quando se aproximou da denunciante D..., afrouxou a marcha, abriu a janela do veículo e dirigiu-lhe a seguinte expressão “parto-te o focinho, nem que para isso me parte todo”.

2) Por causa dessas expressões intimidatórias e, porque justamente se convenceu que o arguido poderia vir a fazer o mal que anunciou, - bater-lhe, D... sentiu medo e inquietação da concretização daquela ameaça.

3) Ao dirigir a expressão supra mencionada à denunciante, do modo que o fez e o teor da expressão proferida, o arguido agiu com o propósito de tolher a liberdade de acção e decisão da denunciante, e provocar-lhe medo e inquietação, o que quis e conseguiu.

4) O arguido agiu de forma livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

Dos demais factos provados e condições socioeconómicas do arguido: 5) O arguido vive com a esposa em casa própria adquirida com recurso a crédito à habitação pelo qual paga a quantia mensal de € 350.

6) (…) é reformado e aufere a pensão mensal de € 850 e uma pensão de invalidez de € 1.800.

7) (…) gasta a quantia mensal de cerca de € 400 no crédito para aquisição de veículo automóvel.

8) (…) gasta a quantia mensal de cerca de € 400 com a empregada doméstica que necessita para prestar cuidados á esposa acamada.

9) O ora arguido como habilitações literárias possui o 5.º ano.

10) (…) do seu registo criminal nada consta.

Factos não provados:

  1. Por causa da actuação descrita a ofendida anda atemorizada e tem receio de se cruzar com o arguido.

    Motivação da decisão de facto: A formação da convicção do Tribunal teve por base, quanto aos factos descritos na douta acusação, a análise crítica da globalidade da prova, analisada à luz das regras da experiência comum e segundo juízos lógico-dedutivos.

    Assim, teve o tribunal em conta, em particular o depoimento da ofendida que mereceu toda a credibilidade pela forma que foi prestado, tendo-se pautado pela coerência, calma e isenção (não obstante ser ofendida) que relatou os factos tais como constavam da acusação.

    Cumpre mencionar que quanto às circunstâncias de tempo e lugar as declarações prestadas pelo arguido e ofendido coincidiram, inclusive no que diz respeito às pessoas que se encontravam presentes no local, as testemunhas B... (mãe da ofendida) e C... (tia da ofendida), contrapondo-se unicamente no que diz respeito às concretas palavras proferidas pelo arguido.

    No que diz tange àquele ponto em concreto, o arguido relatou ao tribunal que apenas disse à ofendida para ter atenção ao que andava a fazer que o filho lhe tinha dito que ela já tinha sido chamada, porque andava a maltratar a filha, enquanto a ofendida mencionou que aquele lhe terá dito que “lhe partia o focinho, nem que se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT