Acórdão nº 90/13.6GBGVA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da comarca da Guarda – Gouveia – Instância Local – Secção de Competência Genérica – J1, mediante despacho de pronúncia, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, o arguido A...

, com os demais sinais nos autos, a quem era imputada a prática, em autoria material, de um crime de furto, p. e p. pelo art. 203º, nº 1 do C. Penal.

O demandante civil B... deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 6.000, por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Por sentença de 11 de Junho de 2015, foi o arguido absolvido da prática do imputado crime de furto e do pedido de indemnização civil contra si deduzido.

* Inconformado com a decisão, recorreu o demandante civil B... , formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1. O ora Recorrente, não se conforma de todo, com o resultado e fundamentos da M. D. Sentença que veio a absolver o arguido; 2. O ora Recorrente, em sede de queixa / inquérito, instrução, debate instrutório, acusação e julgamento, carreou para o processo, numerosa documentação que atesta a propriedade e legítimo uso e seu usufruto há largos anos, da área de terreno objecto dos presentes autos, que lhe adveio à sua esfera jurídica, por partilha hereditária ocorrida em 28 de Outubro de 2008.

  1. Antes da sua propriedade e do seu uso e usufruto, já a referida área era propriedade e usufruída pelo falecido pai do ora Recorrente, sendo que tal falecimento ocorreu em 11 de Janeiro de 2005.

  2. O ora arguido, – que é tio do ora Recorrente – mandou cortar de uma área de aproximadamente 900 m2 – novecentos metros quadrados, propriedade do ora Recorrente, sita no lugar dos Cabritos, em Melo, concelho de Gouveia, numerosas árvores, especialmente eucaliptos, pinheiros e castanheiros, com idades já avançadas e de elevado porte; 5. O ora Arguido alegou ter recebido do madeireiro, F... , por tal madeira, a quantia líquida de € 1.250,00 – mil duzentos e cinquenta euros.

  3. O ora Recorrente, entregou no presente processo nomeadamente, certidão de teor da Conservatória do Registo Predial, Caderneta Predial Rústica e mapas topográficos, com a delimitação da área e extremas do perímetro do imóvel sua propriedade.

  4. O ora Arguido, não entregou nos autos, qualquer documento que atestasse a posse, mera detenção e/ou propriedade de todo e qualquer terreno no local dos Cabritos, em Melo, tendo apenas entregue, um "rascunho" produzido pelo seu punho.

  5. Em sede de debate instrutório, o MP deduziu acusação pública pelo crime de furto.

  6. Em sede de debate instrutório, o I. Juiz de Instrução proferiu igualmente despacho de pronúncia.

  7. Ao longo da M. D. Sentença, que ora se põe em crise, o Mmo. Juiz a quo, vem a referir por diversas ocasiões o termo "enclave", termo utilizado pelo próprio ora Recorrente, no seu depoimento em sede de audiência de discussão e julgamento e que se refere à parte de sua propriedade que foi objecto do corte e do consequente furto, por parte do ora Arguido / Recorrido.

  8. Ora salvo o devido e merecido respeito – que aliás é muito – andou mal o Mmo. Juiz a quo, quando pretende colar o termo "enclave" à ideia de qualquer dúvida sobre a sua propriedade e/ou posse, por parte do ora Recorrente.

  9. Em momento algum processual, são suscitadas dúvidas sobre a propriedade e/ou posse do dito "enclave" por parte do ora Recorrente.

  10. É o Arguido e a sua filha, C... , os únicos que referem que tal terreno foi de seu uso e posse, mas que não podem muito bem determinar onde começa e acaba e, que área abrange, sendo que para além da sua palavra, não apresentam todo e qualquer documento.

  11. Saliente-se que a filha do Arguido, na qualidade de testemunha, faltou à verdade perante o Mmo. Tribunal, facto que levou a I. Magistrada do M.P. a requerer certidão com vista a eventual procedimento penal futuro.

  12. Concluída a audiência de discussão e julgamento, a I. Magistrada do M.P., concluiu em alegações pela condenação do Arguido pela prática do crime pelo qual vinha acusado.

  13. F... , madeireiro que procedeu ao corte, e que teve de ser conduzido ao M.D. Tribunal sob escolta policial, visto não ter comparecido voluntariamente no local, ainda que devidamente notificado para o efeito, testemunhou que havia sido contratado pelo Arguido para o efeito.

  14. Todas as testemunhas apresentadas pelo Arguido, não souberam informar o M.D. Tribunal sobre a titularidade do imóvel, ou dos seus frutos, alegando contudo, que conheciam tanto o ora Recorrente como o ora Arguido; 18. O ora Recorrente para além dos documentos oficiais emitidos pela Conservatória do registo predial e serviço de finanças competente, carreou igualmente para os autos, uma cópia da notificação judicial avulsa, do Tribunal da Comarca de Leiria, em que seu falecido pai, notificava o seu irmão, em princípios dos anos 90, do século passado, ora Arguido / Recorrido nos presentes autos, que a área de terreno sita em Melo, era de sua exclusiva propriedade e usufruto, e que o ora Arguido se deveria abster de realizar actos ofensivos de tal propriedade e posse.

  15. De igual forma, por acta de conferência de partilhas datada de 07 de Julho de 1993, do Tribunal Judicial da Comarca de Gouveia, o pai do ora Recorrente, K... e seu irmão, e ora Arguido / Recorrido, acordaram em atribuir o terreno objecto do presente processo ao pai do ora Recorrente.

  16. E mais referem, que nessa data, o ora Arguido / Recorrido, não era proprietário e/ou possuidor de todo e qualquer imóvel confinante com o imóvel que era adjudicado a seu irmão.

  17. O ora Arguido / Recorrido, não logrou provar – nomeadamente documentalmente – toda e qualquer propriedade e/ou usufruto / posse, no local de Melo, fosse ou não confinante com a propriedade legitimamente registada a favor do ora Recorrente.

  18. O ora Arguido / Recorrido, em 26 de Março do presente ano de 2015, junto do Serviço de Finanças de Gouveia, requereu a inscrição a seu favor de 11.212,30 m2, ou seja mais de um hectare de terreno rústico, que segundo a sua intenção, incluirá os 900 m2, da área de corte realizada.

  19. Vem assim tentar legitimar a posteriori, a sua conduta, mais de dois anos volvidos sobre os factos do crime perpetrado, e mais de 25 anos volvidos sobre ter sido notificado judicialmente para se abster de factos que ofendessem a legítima propriedade e/ou posse do imóvel, e de, em sede de conferência de partilhas judiciais, ter atestado perante Juiz de Direito que não tinha imóvel no local/zona de Melo.

  20. Tomando conhecimento de tal facto, o ora Recorrente de imediato impugnou tal inscrição.

  21. A M.D. Decisão ora recorrida e ora posta em crise, inverte-se o ónus da prova que prevê, que a posse se presume a favor do seu legítimo proprietário.

  22. O ora Arguido / Recorrido, com a presente inscrição em Março de 2015, é ele mesmo que atesta e prova, que não tinha – nem tem – todo e qualquer título relativamente ao referido terreno.

  23. Se dúvidas houvessem quanto à titularidade do referido "enclave", a testemunha que melhor afere tal situação, G... , engenheira agrónoma responsável pela gestão florestal das propriedades do ora Recorrente, em Melo, referiu que por diversas ocasiões, desde 2008, data em que foram contratados os serviços da URZE Associação Florestal da Encosta da Serra da Estrela, sempre cuidou de toda a propriedade dos Cabritos e que quanto ao local havia referido ao ora Recorrente, a necessidade de desmatação sistemática, para desenvolvimento progressivo de algumas árvores em detrimento de outras de menor porte.

  24. Nestes termos não se compreende, como foi possível concluir na M.D. Sentença, ora Recorrida, em considerar como não provado que: "Com relevo para o boa decisão da causa, resultaram os seguintes factos não provados: 1. O descrito em H. e I. seja da propriedade de B... ; 2. O arguido ao vender a madeira, eucaliptos e pinheiros, sabia que esta não lhe pertencia e que actuou com o objectivo ilegítimo de se apropriar de algo que não era seu e que sabia não o ser, pois sabe que o terreno/propriedade não lhe pertencia e que estava a efectuar tal, sem autorização e em prejuízo e contra a vontade do legítimo proprietário; 3. No descrito em K., o arguido bem sabendo que os mesmos lhe não pertenciam; 4. O arguido bem sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei e ainda assim não se inibiu de levar a cabo os seus intentos; 5. O arguido agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente; 6. O valor recebido pelo demandado no montante líquido de € 1.250,00 é reduzido face aos valores praticados e correntes nesta prática; 7. O valor mínimo adequado e corrente é de € 2.500,00, considerando o volume e a área arbórea recolhida; 8. A reposição do terreno importará um valor mínimo de € 2.000,00; 9. Só daqui a 15 anos o terreno poderá voltar a dar rendimento; 10. A dimensão do eucaliptal é de 1.200,00 m2; 11. Foram cortados cem eucaliptos e 10 pinheiros; 12. No descrito em M. tenha sido em quatro ocasiões, o que importou custos e encargos, num valor de € 1.000,00; 13. As partilhas efectuadas entre o arguido e o pai do demandante incluem o terreno onde se procedeu ao corte; 14. O arguido já vendera madeira do mesmo local a um outro madeireiro de Melo, Acácio Pita, já falecido, sem que nunca tivesse tido qualquer problema." sic.

  25. De facto, a referida matéria dada como não provada é totalmente contrária aos depoimentos realizados em sede de audiência de discussão e julgamento, se não, vejamos: a) Para além do referido pelo Arguido, que não soube em momento algum localizar exactamente o local do corte, qualquer outra testemunha conseguiu alegar que tal área, era ou não propriedade e/ou posse do ora Recorrente; b) A testemunha, G... , referiu de forma explícita a localização do terreno e que havia intervindo no mesmo desde 2008; c) Pelo menos desde a data da Notificação Judicial Avulsa e da Partilha Hereditária, ou seja...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT