Acórdão nº 109/12.8TACNT-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: No processo n.º 109/12.8TACNT, veio o assistente A...

, nos termos do art.º 43.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, suscitar incidente de recusa de juiz com a fundamentação que passamos a transcrever: “1. A M. Juiz a quem foi distribuído para julgamento o presente processo é a M.J. B... .

  1. O requerente entende que a intervenção da M. J. B... nos presentes autos é suspeita, por existir motivo sério e grave, adequado a gerar a desconfiança sobre a sua imparcialidade.

  2. E por tal deve a sua intervenção ser recusada.

  3. Não pretende o requerente beliscar a dignidade da M. Juiz, adiantando-se, desde já, que o que está em questão não é a capacidade genérica da MJ1. B... , a qual deve existir sempre para que aquela possa exercer a função que lhe é confiada, mas sim a capacidade específica, a qual aqui se consubstancia na existência de motivos particulares e especiais que, na óptica do requerente, inibem a M. J. de exercer a respectiva função nos presentes autos, com a imparcialidade que lhe é exigida.

  4. Assim entende o requerente, pelos motivos e fundamentos que passa a expor e Invocar.

    - Quanto à desconfiança sobre a imparcialidade da M. J. recusada por ser mandatária do assistente a Advogada C....

  5. A mandatária do ora requerente patrocinou, no ano de 2010/2011, o seu Colega Advogado D..., enquanto réu numa acção judicial de inibição de responsabilidades parentais (Processo n° 178/10.5T6AVR da Comarca do Baixo Vouga, Aveiro-Juízo de Família e Menores) instaurada pela aqui M. Juiz, que é a mãe da filha de ambos.

  6. Como é do conhecimento público o infeliz D... foi morto a tiro, no dia 05 de fevereiro de 2011, pelo pai da M. Juiz recusada, no âmbito de um encontro entre o pai e a sua filha ( E... ) encontro esse agendado em conferência de pais realizada no dia 28 de Janeiro de 2011 no âmbito do processo de regulação das responsabilidades parentais da referida menor que correu termos pelo Tribunal de Família de Aveiro, conferência na qual estiveram presentes a M. Juiz recusada e a mandatária do aqui requerente, patrocinando o referido progenitor D... .

  7. A mandatária do ora requerente foi testemunha indicada pela acusação do Ministério Público no processo crime por homicídio em que foi arguido o pai da M. Juiz recusada, tendo prestado depoimento com autorização e dispensa de sigilo profissional pelo Conselho Distrital de Coimbra da Ordem dos Advogados.

  8. Sucede que a M. Juiz recusada apresentou queixa-crime contra a mandatária do requerente por factos extraídos das peças processuais por esta subscritas enquanto mandatária do infeliz D... e de seus pais, bem como por factos extraídos do depoimento prestado pela aqui mandatária do requerente na audiência de julgamento do processo crime por homicídio em que o seu pai foi arguido e condenado em pena de prisão efectiva que cumpre neste momento.

  9. A M. J. recusada deduziu acusação particular contra a mandatária do aqui requerente, encontrando-se o respectivo processo em fase de instrução (doc. 1 anexo) e do qual foi extraído expediente remetido ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados para efeitos disciplinares (doc. 2).

  10. No artigo 5.° da queixa crime instaurada contra a mandatária do requerente, a M. J. recusada imputa-lhe o seguinte facto (doc. 3): No decorrer de tal resposta o Ilustre Mandatário da Defesa questionou a ora participada sobre o conteúdo do artigo 87.º da petição inicial da acção de inibição de responsabilidades parentais: - MANDATARIO-DEF: - No artigo 87 da petição inicial, diz-se assim: “A autora [Dra B... ], alega que o Dr. [Dr. D...] a chamava de doente mental, criança, manipuladora,” - peço desculpa mas tenho de dizer isto tudo, estes palavrões, - “falsa, mentirosa, sem dignidade, mal-educada, incompetente, não é mulher nenhuma, não presta para nada, é uma merda, precisa de ser fodida”. - E a Sra. Dra. Na contestação que assina no artigo 194, diz: - “Hoje, não há dúvida nenhuma, infelizmente, de que a mesma é tudo o que aí se alega”.

  11. A M. J. recusada imputa tais declarações à mandatária do requerente, o que, na sua óptica, consubstancia a prática de um crime de difamação.

  12. Entendimento que, aliás, a M. J. recusada reiterou na acusação particular que deduziu contra a mandatária do requerente, acrescentando ainda, nos artigos 10°, 11º e 12° de tal arrazoado, o seguinte (doc. 4): 10° - A arguida agiu com vontade e intenção de atingir o bom nome, a honra e a consideração da participante - o que conseguiu - actuando deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    11 ° - A arguida agiu livre e conscientemente, ciente do carácter ofensivo das suas afirmações e da sua falsidade, querendo denegrir a imagem e bom nome da assistente, ciente de que a sua conduta era susceptível de consubstanciar factos ilícitos e puníveis pela nossa lei penal, o que não podia de todo desconhecer, até porque exerce a profissão de advogada, e mesmo assim não se coibiu de praticar tais factos.

    1. - A arguida agiu dolosamente bem sabendo do real alcance e consequências jurídicas dos seus actos - até atente a sua profissão, advogada - e mesmo assim persistiu na sua actuação o que só por si revela a real intenção dolosa da mesma” 14. Ou seja, a M. J. recusada entende que a mandatária do requerente a apelidou dos epítetos que identifica na queixa crime, e que essa actuação foi livre, consciente e com o propósito de denegrir a imagem e bom nome da M. J. recusada.

  13. Na sequência de tais factos imputados pela M. J. recusada à mandatária do requerente foi também deduzida por aquela contra esta, em 27 de Abril de 2015, pedido de indemnização civil (doc. 4): 16. Nessa peça, a M. J. recusada refere o seguinte: 7.º - Ao imputar-lhe tais factos que bem sabia serem falsos, a arguida ofendeu de forma grave e profunda a assistente/ofendida, ficando esta, em consequência das afirmações proferidas por aquela muito desgostosa, triste, humilhada e perturbada, o que se reflectiu no seu ambiente familiar, profissional, e até social.

    (...) 10° - Mais se diga que o comportamento da arguida apenas pretendeu atingir, como atingiu, o bom nome, honra e consideração da assistente/demandante, o que conseguiu de sobremaneira.

    1. Todas as falsas afirmações supra causaram à assistente/demandante incomensurável e indescritível dor, sofrimento atroz e revolta, com reflexos físicos vários, dificuldade em dormir, necessidade de tomar ansiolíticos, perda de apetite. Não obstante, 12. o - A arguida/demandada tivesse perfeito conhecimento de tamanha situação - como pretende ainda hoje, uma vez que não se retratou nem pública nem junto da assistente/demandante - com a prática dos actos descritos, para além de ofender a assistente/demandante na sua honra e consideração, quer dolosamente que a propalada imagem pública distorcida do seu carácter se mantenha.

    (...) 14º - A assistente/ofendida/demandante sentiu como sente vergonha e desgosto nomeadamente no seu seio social e profissional 15º - No que concerne à assistente/demandante Juiz de Direito, para além de denegrir a sua imagem enquanto pessoa a arguida quis atacar o que conseguiu o prestígio, a honra e o bom nome profissional daquela, o que lhe causou sérios danos passando a ser olhada com desconfiança, o que lhe causou perturbação e incómodo.

    16 - Tais maledicências perpetradas pela arguida tiveram o claro propósito de desacreditar a Assistente perante a opinião pública, quer enquanto cidadã, que enquanto profissional, ou seja, enquanto Pessoa! 17º - As afirmações e imputações em causa são causadoras de graves prejuízos à postura e carreira profissionais da assistente/demandante, atentando contra a sua dignidade humana e do seu bom nome e consideração.

    (...) 23º - O facto de a demandante ver a sua reputação, honra e imagem social atingida para todo o sempre de forma irremediável perante todos quantos ouviram directamente em sede de audiência quer perante todos os seus pares que tiveram a possibilidade de ler as declarações da demandada bem a sua peça processual. - todos os destaques são nossos.

  14. Considera, portanto, a M. J. recusada que a mandatária do requerente atacou o seu prestígio, honra e bom nome profissional, dolosamente, o que pretende ainda hoje, causando-lhe, dessa forma, incomensurável e indescritível dor, sofrimento atroz e revolta, com reflexos físicos vários, dificuldade em dormir, necessidade de tomar ansioliticos, perda de apetite desacreditando-a enquanto profissional, porquanto tais imputações foram causadoras de graves prejuízos à postura e carreira profissionais para todo o sempre de forma irremediável.

  15. Ambas as peças processuais supra referidas, nomeadamente queixa-crime e acusação particular/pedido de indemnização civil, se encontram assinadas pela M.J. recusada, pelo que dúvidas não há de que foi esta a autora dos respectivos conteúdos.

  16. Por outro lado, após a trágica morte do pai da filha da M. Juiz recusada a mandatária do requerente foi constituída advogada dos avós paternos da menor, filha do D... e da M. Juiz recusada, tendo instaurado acção de Processo Tutelar Comum n° 194/11.0T6AVR. contra a M. Juiz aqui recusada com vista ao estabelecimento de visitas à sua neta, com fundamento nos impedimentos e obstáculos por aquela continuamente levantados à realização de tais visitas e ao estreitamento dos naturais laços existentes entre avós e neta, acção esta que está em curso e em execução de sentença (doc. 5).

  17. Ou seja, para além de a mandatária do requerente ser arguida num processo em que é queixosa a M. Juiz recusada, esta é...

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