Acórdão nº 5471/17.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelV
Data da Resolução06 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório “Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores” (doravante, CPAS), com os sinais dos autos, intentou a presente execução para pagamento de quantia certa contra S (…), advogada, também com os sinais dos autos, no Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, Juízo de Execução de Coimbra, com base em certidão de dívida de contribuições não pagas para a CPAS, emitida pela Direção da mesma CPAS, ascendendo o pedido exequendo ao montante total de € 387,80 (correspondente a € 329,80 de contribuições em dívida e € 58,00 de juros).

Por decisão liminar datada de 21/09/2017, foi oficiosamente suscitada e conhecida a questão da “incompetência material deste Tribunal de Execuções para conhecer da presente execução”, âmbito em que logo foi decidido nos seguintes termos: «Considerando que estamos perante uma situação de incompetência absoluta do tribunal, em razão da matéria – artºs. 96 e 97 do Código de Processo Civil, indefiro liminarmente o requerimento executivo (certidão de dívida emitida pela Direcção da CPAS) – artigo 99, nº. 1, e artigo 726, nº. 1, alínea b), ambos do Código de Processo Civil.».

Decisão essa complementada em 03/11/2017, nos seguintes termos: «Lemos a exposição antes apresentada pela Exequente quanto à excepção de incompetência material deste Tribunal.

No entanto, face aos argumentos jurídicos vertidos nos acórdãos recentes citados no nosso despacho de indeferimento liminar, continuamos convictos de que essa nossa decisão é a mais acertada e assertiva, pelo que se profere a mesma sentença com a data de hoje, remetendo-se, por razões de economia processual e de celeridade, para essa decisão de 21-09-2017.».

Inconformada, a Exequente recorre do decidido, apresentando alegação e formulando as seguintes Conclusões: «1.ª O Tribunal a quo é o tribunal competente para a decisão e tramitação deste processo executivo.

  1. Pois a CPAS, não obstante prosseguir fins de interesse público, tem uma forte componente privatística. Com efeito, 3.ª A CPAS «é uma instituição de previdência autónoma, com personalidade jurídica, regime próprio e gestão privativa…» (cf. Art.º 1.º, n.º 1 do regulamento aprovado pelo Dec. Lei n. 119/2015, de 29/06) não fazendo parte do sistema público de segurança social (cf. Ilídio das Neves in “Direito da Segurança Social - Princípios Fundamentais Numa Análise Prospectiva”).

  2. A CPAS não está sujeita a um poder de superintendência do Governo, mas a um mero poder de tutela (cf. Art.º 97.º do regulamento aprovado pelo Dec. Lei n.º 119/2015, de 29/06), sendo essa tutela meramente inspectiva.

  3. A CPAS não faz parte da administração directa ou indirecta do Estado.

  4. Os seus membros directivos não são designados pelo Governo, mas eleitos «pelas assembleias dos advogados e dos associados da Câmara dos Solicitadores».

  5. Mas além disso a CPAS não é financiada com dinheiros públicos, sejam oriundos do Orçamento do Estado ou do Orçamento da Segurança Social.

  6. Pelo que a CPAS não deve ser qualificada como uma mera “entidade pública”.

  7. As contribuições para a CPAS não têm natureza tributária, mais se assemelhando a contribuições para um fundo de pensões.

  8. As contribuições para a CPAS assentam numa verdadeira relação sinalagmática entre o montante das contribuições pagas e a futura pensão de reforma a ser percebida pelo beneficiário.

  9. A este facto acresce que, nos termos do disposto no art.º 80.º, n.º 4 do regulamento aprovado pelo Dec. Lei n.º 119/2015, o montante das contribuições depende em exclusivo da opção e, portanto, da única vontade do beneficiário.

  10. Nos termos da sentença recorrida, os tribunais administrativos e fiscais seriam os competentes para a tramitação e decisão de execução fundada em certidão de dívida reportada a contribuições para instituição de previdência.

  11. Todavia, o n.º 2 do art.º 148.º do CPPT impõe, para que se possa fazer uso o processo de execução fiscal, no caso de «dívidas a pessoas colectivas de direito público que devam ser pagas por força de acto administrativo», que a lei estipule expressamente os casos e os termos em que o pode fazer.

  12. No novo regulamento da CPAS, aprovado pelo Dec. Lei n.º 119/2015, de 29/06, não existe norma que, de forma expressa, determine que as dívidas à CPAS sejam cobradas através de processo de execução fiscal a correr nos serviços de finanças ou na secção de processos de segurança social.

  13. O que foi confirmado, já depois da entrada em vigor do novo regulamento da CPAS, pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) à Direcção da CPAS. (doc.1) 16.ª E porque “não há direito sem acção”, não resta à CPAS outro caminho senão recorrer aos tribunais judiciais, como no presente caso, para cobrar as contribuições em dívida por parte dos seus beneficiários, isto sob pena de ficar sem tutela jurisdicional efectiva para o apontado propósito.

  14. Assim a interpretação das referidas normas de modo a concluir pela incompetência do Tribunal a quo, acarretaria o incumprimento de preceito constitucional, constante do art.º 20.º, n.º 1 da CRP, que estipula que «a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos…» 18.ª Tendo em conta o princípio constitucional previsto no art.º 20.º, n.º 1 da CRP que dispõe que «a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos…», a interpretação conjugada da alínea o) do n.º 1 do art.º 4.º do ETAF (aprovado pela Lei n.º 32/2002, de 19/02) e do n.º 2 do art.º 148.º do CPPT, perfilhada na sentença recorrida, ou seja, de que apenas os tribunais administrativos e fiscais seriam competentes para dirimir os litígios entre a CPAS e os seus beneficiários, é inconstitucional por violação do disposto no art.º 20.º, n.º 1 da CRP, na medida em que, como vimos, levará a um verdadeiro “beco sem saída” pois a CPAS ficaria, dessa forma, sem possibilidade de poder cobrar as contribuições em dívida pelos seus beneficiários.

  15. Pois, as dívidas à CPAS não poderão ser cobradas judicialmente nem nos tribunais administrativos e fiscais, nem por meio de execuções fiscais promovidas pela AT, nem por meio de execuções fiscais promovidas pela Segurança Social, por falta de norma habilitante para o efeito.

  16. A sentença recorrida violou, assim, o art.º 2.º, n.º 2 do C.P.C.; o art.º 179.º, n.º 1 e 2 do NCPA e o art.º 148.º, n.º 2 do CPPT; o art.º 81.º, n.º 5 do RCPAS; a alínea o) do n.º 1 do art.º 4.º do ETAF e, além disso, a interpretação normativa extraída do referido conjunto de preceitos legais é inconstitucional por violar o artigo o...

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