Acórdão nº 0247/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelFONSECA DA PAZ
Data da Resolução20 de Junho de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: 1. “A………………, SA”, com sede no …………, …………., Torres Vedras, intentou, contra o Estado Português, acção, com processo comum sob a forma ordinária, para efectivação de responsabilidade civil extracontratual pela prática de acto ilícito, pedindo a condenação do R. a pagar-lhe uma indemnização pelos danos patrimoniais sofridos em consequência do embargo e paralisação – entre 16/7/93 e 31/10/95 – de uma obra de construção de um empreendimento denominado “……………………”.

Por sentença do TAC de Lisboa, foi a acção julgada parcialmente procedente e o R. condenado a pagar à A: “a) A quantia de € 71.662,63 (Esc. 14.367.068$00), a que se refere o ponto 3.3.1. da presente decisão, pelos juros relativos ao passivo bancário imputável ao empreendimento “………………..”, durante o período de paralisação das respectivas obras; b) A quantia de € 35.217,41 (Esc. 7.060.457$00), pelos danos relativos à substituição e reparação do material referido no ponto 3.3.2. supra, a que acrescem juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento; c) Uma indemnização a liquidar em execução de sentença pelos prejuízos consubstanciados no atraso na comercialização e venda das fracções do empreendimento, nos termos referidos no ponto 3.3.3. supra; d) Uma indemnização a liquidar em execução de sentença, para ressarcimento das despesas em que incorreu, durante o período de paralisação da obra, com a emissão do alvará n.º 13/89, a garantia bancária prestada junto da CMTV, a EDP e a emissão de licenças de construção (nos termos referidos no ponto 3.3.6. supra), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento”.

Desta sentença, foram interpostos recursos por ambas as partes.

A A., na sua alegação de recurso, enunciou as seguintes conclusões: “A – DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO PORTUGUÊS 1.ª A ora recorrente tem direito a ser ressarcida pela totalidade dos danos emergentes e lucros cessantes que suportou na sua esfera jurídica (full composition), em consequência das actuações ilícitas do Estado Português, no âmbito do instituto da responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, cujos pressupostos se encontram previstos nos artºs. 22.º e 62.º da CRP, no DL n.º 48051, de 21/11/67, aplicável “in casu”, e nos artºs. 483.º e seguintes e 562.º e seguintes do Código Civil (cf. Lei n.º 67/2007, de 31/12 – RRCEEDEP), pois no caso “sub judice” tais pressupostos foram invocados, verificam-se e foram provados – facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade – cfr. texto n.º 1; B – DOS DANOS INDEMNIZÁVEIS SUPORTADOS PELA RECORRENTE 2.ª Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, no caso “sub judice” foi demonstrada e provada a verificação dos danos suportados pela ora recorrente com remunerações que teve de pagar aos trabalhadores durante o período de paralisação da obra e da sua actividade (v. nºs. 52 e 66 dos FP), bem como o seu nexo de causalidade relativamente à prolação e manutenção em vigor, durante mais de dois anos, do embargo determinado pelo despacho do Sr. SEALOT, de 14/7/93 (v. artºs. 22.º e 62.º da CRP e artºs. 562.º a 564.º do CC), pois: a) A conclusão da douta sentença recorrida, no sentido de que “nada se provou quanto as quantias envolvidas no pagamento dessas remunerações”, integra erro de julgamento e é infirmada pela resposta aos quesitos 10º. e 25º. da BI e respectiva fundamentação (v. despacho de 5-5-2012), que assentou decisivamente na consideração da “prova documental constante dos autos, a fls. 580 a 655, que se consubstancia nas folhas dos gerentes e trabalhadores da A., e da qual se retira o processamento das suas remunerações e vencimentos, bem como a sua identificação” – cfr. texto nºs. 2 a 6; b) A paralisação da actividade da ora recorrente por um período superior a dois anos (v. nºs. 38º e 47º dos FP), em consequência da referida ordem de embargo (v. nºs. 15 a 17, 33 a 35 e 38 dos FP) integra o evento e condição que, em abstracto e em concreto, constituiu a causa efectiva e operante dos danos reclamados relativamente a remunerações pagas “medio tempori” a trabalhadores e operários de construção (v. Docs. de fls. 580 e segts. dos autos) – cfr. texto nºs. 7 a 9; c) A ora recorrente teve que continuar a pagar as remunerações em causa durante o referido período de dois anos (v. nºs. 52 e 66 dos FP), apesar de ter sido impedida de receber a prestação laboral dos referidos técnicos e operários, que não puderam continuar a trabalhar na construção do empreendimento em curso (v. nºs. 2 e 38 dos FP), face à total paralisação daquela obra e da sua actividade (v. nºs. 38, 48 e 53 dos PB) – cfr. texto nºs. 7 a 9; d) O pagamento das referidas remunerações constitui assim inequivocamente um encargo sem qualquer contrapartida ou proveito económico para a ora recorrente, por ter sido impedida de beneficiar do resultado da prestação de trabalho que, em condições normais justificaria tal despesa, em consequência directa do acto ilícito “sub judice”, traduzindo-se em custos sem qualquer retorno ou proveito, que, nessa exacta medida, oneraram e diminuíram o seu património, resultados e lucros (v. artº. 566º do CC) – cfr. texto nºs. 7 a 9; 3.ª Os encargos que a ora recorrente teve que suportar com o pagamento de contribuições autárquicas dos referidos imóveis, relativas a 1994 e 1995, constituem também despesas absolutamente injustificadas e sem qualquer rentabilização económica possível, face à paralisação da construção e da actividade da ora recorrente e ao consequente retardamento da venda dos imóveis, causados pelo acto ilícito “sub judice” (v. nºs. 15, 39, 47 e 68 dos FP), diminuindo o seu património, resultados e lucros (v. artº. 566º do CC), pelo que se impõe a condenação do Estado Português na “reconstituição da situação anterior a lesão” (v. Pires de Lima e Antunes Varela, C. Civil Anotado, I/501, nota 3), não podendo tais prejuízos deixar de ser indemnizados (v. artºs. 13º, 22º e 62º da CRP) – cfr. texto nºs. 10 a 12; 4.ª A A. tem ainda direito a ser indemnizada pelas despesas judiciais e honorários de advogados que despendeu e vai despender na defesa dos seus direitos (v. artºs. 20.º e 22.º da CRP), relativamente aos processos que se provou terem sido instaurados perante os Tribunais Administrativos, devidamente identificados nos nºs. 21 a 23 e 27 dos FP (v. art.º 566.º do CC), pois “no domínio do contencioso administrativo em que o mandato judicial é obrigatório, os honorários de advogado constituem um dano indemnizável” (v. Ac STA de 8/7/2009, Proc. 046440A; cfr. Acs. STA de 17/3/2010, Proc. 045899; de 4/3/2009, Proc. 754/08; de 3/8/2005, Proc. 39934; de 6/6/2002, Proc. 024779; de 14/03/2001, Proc. 024779; de 13/2/2000, Proc. 44761, todos in www.dgsi.pt, cujo quantitativo ou valor não é possível determinar, na sua totalidade e neste momento, de modo definitivo (v. artº. 569º do CC e artº. 609º do NCPC) – cfr. texto nºs. 13 a 16; 5.ª A douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente o disposto nos artºs. 13º, 20º, 22º e 62º da CRP, no D.L. 48051, de 21/11/67 e nos artºs. 483º e 562º e segts. do CC”.

Por sua vez, o R., na sua alegação de recurso, formulou as conclusões seguintes: “1- O tribunal recorrido, ao concluir que o embargo decretado pelo Despacho 7-I/93, de 14.07.93, do Sr. Secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, é ilegal, ilícito e culposo, não fez uma correcta leitura dos pressupostos previstos no art.º 6.º do DL n.º 48051, de 21.11.67; 2- Pois que tal despacho partiu de uma leitura possível, legal e suportada em parte da doutrina e jurisprudência, segundo a qual o Plano de Urbanização da Praia de Santa Cruz vigorava à data do loteamento e licenciamentos emitidos ao A. pela CM de Torres Vedras – artigo único do Decreto 35.931, de 4.11.46; artigo 29.º do Decreto 33.921, de 5/9; artigos 3.º, n.º 5 e 16.º, n.º 2 do DL 560/71, de 17/12, e artigo 26.º e 30.º do DL 69/90, de 2/3; 3- Loteamento aliás nulo, como se demonstrou supra, portanto com vício a todo o tempo evocável – falta de audição da CCRLVT, omissão cominada com nulidade, nos termos do art.º 65.º do DL 400/84, de 31/12 (regime do licenciamento municipal de obras), com referência aos artºs. 12.º, n.º 1 e 13.º, alíneas a) e b) do mesmo, conjugado com o DL 352/87, de 5/11; 4- Um embargo que tem por fundamento a violação de um plano de urbanização, cuja validade era e é admissível, paralisando construções num loteamento viciado de nulidade, não pode ser considerado um acto violador de normas legais ou regulamentares ou princípios gerais de direito aplicáveis, mas antes o contrário; 5- Um embargo que visa construções proibidas pelo instrumento urbanístico do local, numa localidade costeira, ainda que licenciadas pela edilidade, com base em loteamento nulo, e no seguimento de instruções em vigor no respectivo Município, não pode ser reputado de culposo; 6- Um embargo que é de imediato levantado, assim que conhecido o PDM do local, que autoriza as construções embargadas, e que no seu decurso foi limitado apenas aos dois lotes que estavam em construção, não pode ser reputado de culposo; 7- Não sendo o despacho em apreço ilegal, ilícito, nem culposo, não gera o mesmo para o Estado Português qualquer obrigação de reparar eventuais prejuízos causados pelo dono da obra, nos termos do DL n.º 48051, de 21.11.67; 8- Contudo, admitindo-se pela ilegalidade, ilicitude e culpa do despacho em causa, ao Estado Português cabe apenas a responsabilidade de reparar os prejuízos efectivamente causados pelo despacho em causa e nada mais – art.º 563.º, n.º 1 do C. Civil – e a demonstrar cabalmente pelo demandante; 9- O despacho em causa teve como consequência o embargo=paralisação de obras de construção em curso em dois dos dez lotes do empreendimento “………………”, paralisação esta ocorrida entre 16.07.1993 e 31.10.1995; 10- O Estado Português não demoliu a obra, não tomou posse da...

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