Acórdão nº 0351/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 04 de Outubro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 323/10.0BELRA 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A………, S.A.” (adiante Recorrente) recorre para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a liquidação de Imposto sobre o Álcool e as Bebidas Alcoólicas (IABA) que, enquanto depositária autorizada, lhe foi efectuada com referência ao período de 1 de Outubro de 2003 a 4 de Agosto de 2004, na sequência de uma acção de inspecção ao seu entreposto fiscal, que concluiu pela introdução irregular no consumo de diversas mercadorias (bebidas alcoólicas).
1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações de recurso, que sintetizou nas seguintes conclusões: «1.ª- O direito de liquidar o imposto (IABA) e respectivos juros compensatórios encontrava-se caducado há muito na medida em que os factos tributários ocorreram no período (inspeccionado pela Alfândega de Peniche) de 01-10-2003 a 04-08-2004 e a liquidação apenas foi notificada à recorrente em 11-09-2009.
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- Não tem lugar nos presentes autos a consideração de qualquer facto suspensivo do prazo de caducidade, por um lado, porque a acção de fiscalização iniciou-se em 04-08-2004, sendo que o conhecimento dos factos se terá realizado, no limite, no decurso deste mês de Agosto de 2004 (e não quando do relatório da acção de fiscalização do ano de 2007); por outro lado, porque as operações de saída de produtos do entreposto fiscal de produção da impugnante encontram-se devidamente sinalizados à alfândega de controlo (Peniche) através da documentação prevista na lei (DAA’s, se para outros entrepostos fiscais; DIC’s se para consumo e DAU’s, se para exportação), o que não foi sequer posto em causa pela autoridade aduaneira; e por outro lado ainda, porque a acção inspectiva deveria ter demorado 6 meses (prazo-regra – art. 36.º, 2, do RCPIT) e não quase 3 anos (!), data da elaboração do relatório de “varejo” (25-06-2007), razão pela qual tem aqui plena aplicação (também) o artigo 46.º, 1, da LGT que manda desconsiderar qualquer efeito suspensivo.
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- Não tendo havido qualquer prorrogação do prazo da inspecção (fiscalização) efectuada, é forçoso concluir-se que o procedimento, iniciado em 04-08-2004 deveria ter-se concluído em 04-02-2005.
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- A Acção n.º 198/2004 da Alfândega de Peniche – que teve como objectivo a verificação do cumprimento do regime fiscal relativo à produção, recepção, detenção, expedição, circulação e introdução no consumo de bebidas espirituosas e produtos intermédios – constitui uma acção de fiscalização / inspecção sujeita ao RCPIT como claramente decorre do estatuído no art. 3.º do Dec-lei 413/98, de 31/12 (que aprovou o RCPIT) e art. 2.º, 8, da Lei 41/98 de 04/08 (lei de autorização da LGT).
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- Foram ainda violados pela Alfândega de Peniche os direitos de defesa e de participação da Impugnante consagrado nos arts. 20.º, 268.º, 4, 267.º, 5, da CRP e 60.º, 7, LGT uma vez que não apreciou, nem valorou, nenhuma das muitas questões e elementos novos e essenciais colocados pela Impugnante, relativos aos pressupostos e métodos de apuramento e liquidação dos tributos impugnados, em sede de audição prévia, pelo que a sentença incorreu em omissão de pronúncia.
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- Foi ainda violada a lei – arts. 268.º, 3. da CRP e 77.º da LGT – dado que a fundamentação da liquidação se apresenta muito incompleta e com graves erros e omissões.
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- Preceitos jurídicos violados: arts. 20.º, 267.º, 5, e 268.º, 3 e 4, da CRP; arts. 45.º, 1, 46.º, 1; 60.º, 7, e 77.º da LGT; art. 36.º do RCPIT e doutrina do acórdão do STA n.º 0935/08, de 28/01/2009, e os arts. 3.º do Dec-Lei 413/98, de 31/12 e 2.º, 8, da Lei 41/98, de 04/08.
Nestes termos e nos mais de Direito, cujo suprimento se impetra a V. Exa. deverá a presente sentença ser revogada e substituída por outra que atenda e confira procedência à impugnação apresentada.
».
1.4 A Recorrida contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido e rematando com a formulação de conclusões do seguinte teor: «1. À data da análise dos factos apurados era o Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro (que se manteve em vigor até 31 de Dezembro de 2010), e em termos de competências da Alfândega o art. 18.º da Portaria n.º 349/2007, de 30 de Março (que se manteve em vigor até 31 de Dezembro de 2011).
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Legislação esta perfeitamente do conhecimento da Recorrente, considerando que é detentora do Estatuto de Depositário Autorizado desde 1 de Janeiro de 1993, sob o NIEC PT01500024286, estando assim sujeito ao regime geral de produção, detenção, circulação e controlo dos produtos sujeitos a impostos especiais sobre o consumo, de acordo com o CIEC.
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Sendo do seu conhecimento que uma das obrigações do estatuto do Depositário Autorizado é a de prestar-se a varejos e outros controlos determinados pela autoridade aduaneira, conforme o disposto na alínea d) do n.º 2 do art. 24.º do CIEC, já anteriormente estipulado na alínea d) do n.º 1 do art. 13.º do Decreto-Lei n.º 52/93 de 26 de Fevereiro.
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Citando Sérgio Vasques “...
O depositário deve apresentar os produtos sempre que tal lhe seja solicitado, obrigação elementar ao controlo da natureza e situação fiscal das mercadorias; devendo também sujeitar-se a varejos sempre que necessário, isto é, à fiscalização física das existências em entreposto, bem como aos demais controlos levados a cabo pelas autoridades aduaneiras, seja a inspecção de instalações, documentos vários, registos informáticos e contabilísticos”.
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Considerando as especificidades em termos de competências atribuídas às Alfândegas, o Varejo constitui um controlo típico das áreas aduaneiras e fiscal de primeiro nível (Circular 5/2007 Série III), ao qual não se aplica o Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), a par, aliás, de outros controlos da mesma natureza como a verificação de bagagens, a conferência de carga e descarga, a verificação documental de índole aduaneira e fiscal e a verificação física na área dos procedimentos aduaneiros e dos procedimentos fiscais.
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O diploma que aprova o RCPIT, o Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de Dezembro, dispõe no art. 3.º que este regime é aplicável à DGAIEC supletivamente, no que não for incompatível com a natureza dos procedimentos de inspecção de que está legalmente incumbida.
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E o art. 1.º do RCPIT refere expressamente que regula o procedimento de inspecção tributária, sem prejuízo de legislação especial, pelo que aquele regime apenas se aplica aos actos de inspecção.
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As inspecções estão atribuídas às divisões operacionais - Divisão Operacional do Norte (DON) e Divisão Operacional do Sul (DOS) e à Divisão de Planeamento e Controlo (DPC) da Direcção de Serviços Antifraude (DSAF) de acordo com a alínea l) do n.º 2 do art. 8.º da Portaria n.º 349/07, de 30 de Março, conjugada com a alínea b) do ponto 6.3 e com o ponto 6.2 do Despacho n.º 7624/2007, e alfândegas nas condições estabelecidas pela alínea iv) da alínea b) do art. 18.º da mesma Portaria.
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As acções de natureza inspectiva englobam as inspecções, as auditorias e as auditorias prévias pertencentes à área Antifraude.
Não estando nelas englobado o Varejo.
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Com a devida vénia, salvo melhor opinião, entende a Recorrida, que em sede de Varejo e à data, não eram aplicáveis as normas do RCPIT.
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O facto de, em 30 de Setembro de 2014, através da Lei n.º 75-A/2014, o RCPIT ter sofrido alterações passando a designar-se Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira (RCPITA), passando a englobar a parte Aduaneira e tendo sido revogado o art. 3.º do Decreto-Lei n.º 413/98, de 31 de Dezembro, vem reforçar o nosso entendimento.
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Em 04/08/2004, foi realizado um varejo à Recorrente no âmbito das competências da Alfândega verificando-se que não possuía a contabilidade de existências organizada em sistema de inventário permanente com saldo à vista, com indicação da sua proveniência, destino e elementos relevantes para o cálculo do imposto, que satisfizesse as necessidades de controlo do entreposto fiscal.
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Face ao descalabro das contas correntes apresentadas, que não continham os elementos necessários ao cálculo de imposto, violando o estipulado na alínea b) do n.º 2 do art. 24.º do CIEC, foram as mesmas reconstituídas, e rectificados os respectivos saldos, a fim de se possibilitar a sua leitura e respectiva análise, em conformidade com o estipulado no CIEC. Só depois desta reconstituição foi possível concluir o procedimento executado, cujo relatório foi a despacho do Exmo. Senhor Director em 25/06/2007.
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O relatório do Varejo fundamentou a instauração do Processo de Conferência Final (PCF) n.º 121/2007, de 3 de Julho de 2007, onde foram efectuados todos os procedimentos inerentes à liquidação e cobrança da dívida determinada em sede do controlo.
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No âmbito do PCF, foi a Recorrente notificada para o exercício do direito de audição, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 60.º da LGT. Tendo, a seu pedido, sido prorrogado o prazo concedido por mais dez dias.
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A Recorrente exerceu o direito de audição em 29 de Janeiro de 2008, nosso registo de entrada n.º 1537.
Com a concessão de um prazo adicional, a empresa beneficiou no total, de 28 dias para exercer o direito concedido, o que ultrapassa o limite máximo previsto no art. 60.º da LGT.
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No âmbito do exercício do direito de audição não foram apresentados factos novos que alterassem os fundamentos da liquidação, conforme notificação efectuada à empresa em 11/09/2009 (ofício n.º 8196).
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Na sequência da notificação de dívida a Recorrente interpôs Reclamação Graciosa, tendo sido notificada pela Direcção de Serviços dos Impostos Especiais sobre o Consumo (DSIEC), para exercer a audição prévia, direito este que não...
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