Acórdão nº 0262/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução15 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 77/15.4BEPNF 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente), em representação do “Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P.”, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade denominada “A…………, S.A.” contra as autoliquidações da taxa para financiamento do Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos nas Explorações (SIRCA), referentes aos meses de Agosto, Setembro e Outubro de 2014.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que sintetizou em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «A. As liquidações impugnadas, bem com as instruções para a sua execução, dão cumprimento estrito ao disposto na Lei, designadamente ao determinado no DL 19/2011, de 07/02, mais concretamente ao disposto no art. 2.º, n.º 1, deste diploma.

  1. A Administração Fiscal está vinculada ao princípio da legalidade, pelo que não poderia proceder de modo diferente daquele que procedeu.

  2. Considera a Fazenda Pública que a taxa “SIRCA”, deve ser considerada uma taxa em sentido próprio e não qualquer outra espécie de tributo e muito menos, como pretendeu a impugnante, um imposto.

  3. A taxa “SIRCA” constitui, em conjunto com os demais tributos referidos no art. 4.º do Decreto-Lei n.º 119/2012, de 15 de Junho, receita do “Fundo de Segurança Alimentar Mais”, e se destina, como as restantes, a assegurar o financiamento de acções que têm em vista a garantia de segurança alimentar.

  4. Em 15 de Junho de 2012, através do Decreto-Lei n.º 119/2012 foi criado o “Fundo de Segurança Alimentar” ao qual foram afectos (cfr. o art. 4.º) diversas taxas e receitas cobradas pela DGAV, de entre estas e para o que aqui interessa, a taxa ora em discussão.

  5. Pelo que, a Fazenda Pública entende haver similitude na natureza jurídica da taxa “SIRCA” e da Taxa de Segurança Alimentar “TSAM”.

  6. Se se reconhecer que não se verifica, senão parcialmente, o carácter comutativo directo, entre a taxa “SIRCA” e algumas das prestações que em parte, se destina a custear, entende a Fazenda Pública que a taxa “SIRCA”, a não ser considerada uma taxa em sentido próprio, deverá ser qualificada como uma Contribuição Financeira usando a terminologia constitucional actual.

  7. Idêntica qualificação jurídica, no que diz respeito à TSAM, encontra-se plasmada no Acórdão n.º 539/2015 do Plenário do Tribunal Constitucional, proferido a 20/10/2015 nos autos de recurso n.º 27/15, publicado a páginas 33623 e seguintes do Diário da República, 2.ª série – N.º 227 de 19 de Novembro de 2015.

    I. Considera a Fazenda Pública que todas conclusões jurídicas a que se chegou no acórdão citado no que diz respeito à “TSAM” são extensíveis “mutatis mutandis” à taxa “SIRCA” em análise.

  8. A Administração Fiscal não pode recusar a aplicação de norma alegadamente inconstitucional, uma vez que não lhe é permitido formular um juízo sobre essa constitucionalidade ou recusar a aplicação de norma por força de uma qualquer interpretação sobre a sua legalidade face à LGT.

  9. Ao anular as liquidações com fundamento em erro nos pressupostos de direito, a sentença recorrida violou, genericamente, o regime legal instituído no DL 19/2011, de 07/02, e, especificamente, o disposto no art. 2.º, n.º 1 (deste mesmo diploma legal).

    L. A douta sentença em crise fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 2 do art. 4.º da LGT.

  10. O n.º 2 do art. 4.º da LGT contém uma definição legal, não é uma norma autónoma pelo que, e atendendo a que nomen juris não vincula o intérprete, nunca poderia por si só fundamentar uma violação de lei.

  11. A impugnante alegou que a taxa “SIRCA” é um imposto ou um tributo equivalente, sujeito ao princípio da legalidade, que por isso seria organicamente inconstitucional, este vício, o único que a impugnante invocou, não foi apreciado pelo Tribunal a quo.

  12. As liquidações impugnadas estão em conformidade com a lei em vigor, não existindo “erro” que constitua a Administração Fiscal na obrigação de pagamento de juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º da LGT conforme já decidido pelo STA nos Acórdãos de 21/01/2015, Processo n.º 0703/14, e de 04/03/2015, Processo n.º 01529/14.

  13. A norma posta em causa pela impugnante, aqui Recorrida, não foi ainda sequer, julgada inconstitucional.

  14. Mesmo na hipótese da norma vir a ser julgada inconstitucional, não pode ser imputável aos serviços da Administração Fiscal qualquer “erro”, porquanto a Administração Fiscal não pode fazer qualquer julgamento de conformidade constitucional.

  15. Pelo exposto, considera a Fazenda Pública, que não poderá deixar de se revogar a sentença em análise por enfermar de erro de julgamento de direito, consubstanciado na violação do disposto no DL n.º 19/2011, de 07/02, bem como por errada interpretação e aplicação do disposto no art. 43.º da LGT.

    Termos em que, deve ser concedido, provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências».

    1.3 A Recorrida contra-alegou, sustentando a manutenção da sentença.

    1.4 Remetidos os autos a este Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, revogada a sentença recorrida e julgada improcedente a impugnação judicial, com a seguinte fundamentação: «1. A recorrente Fazenda Pública imputa à sentença omissão de pronúncia sobre questão suscitada na impugnação judicial, embora sem expressa arguição da correspondente nulidade, nem formulação do pedido de declaração de nulidade do julgado (conclusão N.). Na economia da fundamentação da sentença, a apreciação da questão da inconstitucionalidade orgânica do DL n.º 19/2011, 7 Fevereiro (diploma que define as regras de financiamento do SIRCA) ficou prejudicada pela apreciação da questão da natureza do tributo previsto no art. 2.º do diploma citado e pela conclusão de que não assume a natureza de taxa constante da designação legal (embora sem eleição da sua classificação como imposto ou contribuição financeira especial, cf. art. 4.º n.ºs 1 e 3 LGT).

    Neste contexto não se justifica a devolução do processo ao tribunal recorrido, por inexistência de expressa arguição da nulidade da sentença pela recorrente (art. 617.º n.ºs 1 e 5 CPC vigente / art. 2.º al. e) CPPT).

    1. Inconstitucionalidade orgânica O acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 539/2015, 20 Outubro 2015 (Diário da República, 2 série – n.º 227 – 19 Novembro 2015) procedeu à análise da constitucionalidade das normas constantes do art. 9.º DL n.º 119/2012, 15 Junho e dos arts. 3.º e 4.º Portaria n.º 215/2012, 17 Julho que regulam o regime da taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM).

      Sobre a distinção entre as figuras da taxa, imposto e contribuição financeira, a caracterização e classificação do tributo em apreço, discursou o acórdão nos seguintes termos: “O imposto constitui uma prestação pecuniária, coactiva e unilateral exigida com o propósito de angariação de receitas que se destinam à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, e que, por isso, tem apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais. O que permite compreender que os impostos assentem essencialmente na capacidade contributiva dos sujeitos passivos, revelada através do rendimento ou da sua utilização e do património (artigo 4.º n.º 1, da Lei Geral Tributária). A taxa constitui uma prestação pecuniária e coactiva, exigida por uma entidade pública, em contrapartida de...

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