Acórdão nº 01233/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução20 de Dezembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:*1.1.

A………….., Lda., reclamou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, do despacho de venda judicial, por leilão eletrónico, do bem penhorado no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2704200401005022, tendo peticionado a anulação do citado despacho.

*1.2.

Aquele Tribunal, por sentença de 19/09/2017 (fls.154/178), concluiu: «Nestes termos, com os fundamentos expostos: i) Absolve-se da presente instância a Fazenda Pública no que tange ao pedido de suspensão da execução fiscal por impropriedade do meio processual para o efeito; ii) Julga-se improcedente o pedido de anulação do despacho que determinou a venda do imóvel por inverificação da nulidade invocada; iii) Custas do incidente pela Recorrente, nos termos do disposto no art.º 527, n.º 1, do CPC e n.º 4 do artigo 7º e Tabela 11 do RCP (Execução).».

*1.3.

É dessa decisão que a recorrente interpõe recurso, terminando as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo: «1. O presente processo respeita a uma reclamação apresentada pela A…………, Lda. (doravante “A………”) contra o despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Tondela que determina a marcação da data para venda judicial, por meio de leilão eletrónico, do terreno para construção sito na Rua ……….. e Avenida ………., Lugar ………., 4415-….., União de Freguesias de Pedroso e Seixezelo, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º 12727 e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o n.º 5169, no âmbito do processo de execução fiscal n.°s 2704200401005022 e os identificados na Impugnação Pauliana n.º 208/09.3TBTND-A.

  1. O Tribunal a quo fez tábua rasa na aplicação do Direito na sentença recorrida, nomeadamente quando indefere a arguida nulidade do despacho por falta de audição do executado previamente à venda.

  2. Em concreto, o Tribunal a quo considerou que o CPPT regula detalhadamente o procedimento de venda dos bens penhorados em execução fiscal, apenas sendo subsidiariamente aplicável o regime previsto no artigo 812.º do CPC na parte em que obriga à notificação dos credores reclamantes do despacho que determina a venda judicial e respetivas condições.

  3. Salvo o devido respeito, não pode a A………., concordar com o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, uma vez que o CPPT permite que o órgão de execução fiscal possa optar por uma modalidade diferente da venda, nos termos do nº 5 do artigo 248.º e al. e) do n.º 1 do artigo 252.º, ambos do CPPT.

  4. Concedida a faculdade ao órgão de execução fiscal de poder optar por qualquer das modalidades de venda previstas no CPC, em derrogação do regime geral da venda por leilão eletrónico, torna-se, assim, imperioso ouvir o executado e credores reclamantes com garantia real, para salvaguardar os seus interesses e direitos constitucionalmente protegidos, nomeadamente o direito de participação nas decisões que lhe digam respeito, nos termos dos artigos 20º, n.º 1, e 267.º, n.º 5, da CRP.

  5. Audição que era obrigatória nos termos do artigo 812.º do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo de execução fiscal, também na parte em que obriga o órgão de execução fiscal a ouvir o executado e os credores reclamantes com garantia real sobre modalidade da venda e eventual formação de lotes.

  6. Ao não ter ouvido a A………. antes de determinar a venda do imóvel por meio de leilão eletrónico o órgão de execução fiscal omitiu uma formalidade que a lei prescreve, sendo certo que a irregularidade influiu na decisão da causa, nomeadamente no regime da venda do imóvel penhorado, ficando, assim, inquinado de nulidade o despacho que determina a modalidade de venda por leilão eletrónico, nos termos do n.º 1 do artigo 195.º do CPC.

  7. Pelo que mal andou o Tribunal a quo ao julgar improcedente a reclamação apresentada pela A………. na parte em que argui a nulidade do despacho que determina a marcação da data para venda judicial por meio de leilão eletrónico do terreno para construção sito na Rua ………… e Avenida …………, Lugar ………, 4415-….., União de Freguesias de Pedroso e Seixezelo, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º 12727 e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o n.º 5169, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2704200401005022 e os identificados na Impugnação Pauliana n.º 208/09.3TBTND-A.

  8. Requerendo-se a este Venerando Tribunal que revogue a sentença Recorrida, declarando nulidade do referido despacho por preterição de formalidades legalmente prescritas, nos termos do n.º 1 do artigo 195.º do CPC, com todas as consequências legais.».

    *1.4.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    *1.5.

    O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia: «1. Objecto do recurso 1. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Viseu que julgou improcedente a reclamação intentada contra o ato do órgão de execução fiscal que determinou a venda judicial por leilão eletrónico do imóvel penhorado nos autos e pertença da executada, com base em nulidade processual decorrente da violação do disposto no artigo 812º do CPC, por remissão da alínea e) do artigo 2º do CPPT.

  9. Considera a Recorrente que a sentença padece do vício de erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação da lei, uma vez que se impunha a sua audição, ao abrigo do disposto no artigo 812° do CPC, pelo que essa omissão configura nulidade processual, por preterição de formalidade legal e influir na decisão da causa, nos termos do artigo 195º, nº 1, do CPC.

    E termina pedindo a revogação da sentença.

    1. Fundamentação de facto e de direito da sentença 1. Na sentença deu-se como assente que no âmbito de execução fiscal em que a reclamante figura como executada, em 15/04/2016 foi determinada a venda de um imóvel – terreno para construção – penhorado nos autos e na titularidade da sociedade “B……….., S.A.”, tendo sido designado o dia 11/07/2017 para a abertura das propostas, e sendo indicado como valor base, ao abrigo do disposto no nº 4 do artigo 250º do CPPT, o valor de € 561.064,60 euros, correspondente a 70% do seu valor patrimonial tributário (VPT).

  10. Para se decidir pela improcedência da ação considerou o tribunal “a quo” que no âmbito da execução fiscal e atentos os princípios da igualdade e da proporcionalidade que exigem uma maior objetividade na fixação dos termos em que a venda se realiza, não há lugar à auscultação do executado sobre a modalidade de venda e à aplicação do disposto no nº 1 do artigo 812º do CPC, pelo que concluiu o tribunal que a omissão de tal auscultação não configura a nulidade processual que lhe foi assacada pela reclamante.

    No entendimento vertido na sentença recorrida, considerou o tribunal “a quo”: «no que tange aos imóveis...a distinta regulação não configura necessariamente uma lacuna, mas sim uma diferente ponderação dos interesses em litígio que, no entender do legislador, justifica um diverso enquadramento legislativo, porquanto, ao contrário do CPC em que se atribui às partes alguma amplitude de conformação no que tange à forma como irá ser realizada a venda, atentos os interesses eminentemente privados em jogo».

    Por outro lado considerou igualmente o tribunal “a quo” que mesmo admitindo a aplicação de tal normativo do CPC e a verificação da apontada preterição de formalidade legal, a mesma só teria efeitos invalidantes se pudesse influir no exame ou na decisão da causa, tendo o tribunal concluído pela negativa.

    1. Análise do Recurso.

    A questão que a Recorrente coloca a este tribunal consiste em saber se há ou não lugar à audição do executado em ato prévio à prolação da decisão sobre a modalidade de venda de bem imóvel por parte do órgão de execução fiscal, e no caso afirmativo se a preterição de tal formalidade consubstancia nulidade processual.

    Defende a Recorrente que tal formalidade legal é imposta pelo artigo 812º do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo de execução fiscal invocando em apoio de tal tese a jurisprudência do acórdão do STA de 02/10/2013, proc. 01385/13.

    No referido aresto, cuja jurisprudência se entendeu consolidada( Fazendo-se referência aos acórdãos de 30/04/2008, proc. 0117/07, de 14/07/2008, proc. 022/08, de 02/04/2009, proc. 0805/08, de 07/07/2010, proc. 0188/10, de 03/11/2010, proc. 0244/10, de 22/06/2010, proc. 03535/11, de 20/06/2012, proc. 016/12, de 05/07/2012, proc. 0180/12, e de 23/01/2013, proc. 0667/12. Cfr. tb. acórdão de 29/01/2014, proc. 01961/13.

    ), entendeu-se ser de aplicar subsidiariamente o regime do artigo 886º-A do CPC (correspondente ao atual 812º), no qual se deixou exarado o seguinte: «...porque o princípio da subsidiariedade de aplicação das normas do Código de Processo Civil, imposto pelo art. 2º, alínea e), do CPPT, exige uma omissão ou lacuna de regulamentação legal acerca da matéria em causa na legislação processual tributária, e essa omissão é patente no caso, na medida em que o CPPT não possuí qualquer dispositivo que estabeleça ou defina o objecto da decisão que o órgão da execução fiscal tem de emitir sobre a venda nem contém qualquer norma que aponte ou defina quem deve intervir na formação dessa decisão, posto que também aqui, na execução fiscal, carecem de ser observados os princípios da cooperação e da boa-fé e respeitado o direito de cada indivíduo intervir na formação das decisões que o atinjam, ou possam atingir, não obstante serem diversos os interesses que subjazem na execução comum e na execução fiscal».

    Atenta a consolidação da referida jurisprudência (cfr. acórdão do Pleno de 15/10/2014, proc. 01463/13), a cuja fundamentação se nos afigura indiferente a natureza do bem penhorado (móvel ou imóvel), importa aferir se a omissão de tal diligência por parte do órgão de execução fiscal consubstancia ou não nulidade processual.

    Decorre do artigo 195º do CPC que a omissão de uma formalidade que a lei prescreva só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.

    Resulta igualmente do...

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