Acórdão nº 01019/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2017

Data20 Dezembro 2017
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na formação a que se refere o actual nº 6 do art. 150º do CPTA, da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.

A…………, com os demais sinais dos autos, recorre nos termos do art. 150º do CPTA do acórdão do TCA Sul, datado de 09/03/2017 (fls. 460/479 – com reforma a fls. 533/539) que deu provimento ao recurso jurisdicional que a Fazenda Pública interpusera da sentença proferida em 23/12/2015 pelo TAF de Sintra e, consequentemente, julgou improcedente a oposição que aquele deduzira à execução fiscal nº 1503201101029622 instaurada no serviço de finanças de Cascais-1, contra a sociedade B………….., S.A. e contra aquele revertida, para cobrança de dívidas de IVA (referente aos anos de 2006, 2007 e 2008) e IRC (referente a 2006), no montante total de € 1.264.617,84.

1.2.

Termina as alegações formulando as Conclusões seguintes: A. É firme convicção do Recorrente que, no caso dos presentes autos, se verificam os requisitos da relevância social da questão e a sua clara necessidade para a melhor aplicação do direito para que possa o presente recurso ser admitido.

B. A questão central do presente recurso prende-se com a presunção legal de culpa ínsita no Artigo 24º, nº 1, alínea b) da LGT, designadamente, quais os elementos de prova a carrear para os autos para que se possa ter por ilidida a presunção legal estabelecida no referido normativo legal, atenta a inexistência de uma concretização, seja legal ou jurisprudencial, das condutas presumivelmente culposas, quer tendo em conta a dificuldade de prova de um facto negativo, por parte do revertido neste caso, quer considerando necessidades de equilíbrio proporcional do ordenamento jurídico tributário, sob pena de a falta de concretização, ou de um critério interpretativo sólido, coerente, proporcional e de aplicação uniforme, conduzir a resultados como o dos presentes autos, em que o revertido A…………., ora Recorrente, responde com base numa culpa que não teve.

C. Por outro lado, é igualmente convicção do Recorrente, que a questão jurídica suscitada, para além de se revestir de uma complexidade superior ao comum, em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, padece de um grau de incerteza incompatível com as exigências de certeza e segurança jurídicas necessárias para o instituto da responsabilidade tributária subsidiária.

D. Uma presunção de culpa, à semelhança de qualquer outra presunção, representa uma situação excepcional, na exacta medida em que derroga as regras gerais do ónus da prova, constantes do artigo 487º do Código Civil, tendo subjacente ao seu estabelecimento no ordenamento jurídico a ideia de segurança e certeza jurídicas.

E. No caso sub judice constatamos a existência de uma presunção de culpa do gestor quando haja falta de pagamento das dívidas tributárias da sociedade que aquele representa.

F. É redutor afirmar-se que, regra geral, quando a sociedade não cumpre as suas obrigações fiscais, a responsabilidade por tal incumprimento é do seu gerente ou administrador.

G. Bem sabemos que, do ponto de vista prático, tal não sucede, pois, por um lado, nem sempre uma actuação diligente dos órgãos executivos das empresas conduz a resultados económicos positivos e conducentes ao atempado cumprimento de todas as obrigações fiscais e, por outro lado, não pode ser ignorado todo o ambiente macro e micro económico envolvente e os riscos de contexto decorrentes do exercício de qualquer actividade económica.

H. Não é razoável justificar tal presunção legal de culpa com a maior facilidade do gestor em provar a sua não culpa do que a Autoridade Tributária em provar a sua culpa, sendo na comunidade jurídica amplamente reconhecida a dificuldade de prova de factos negativos, ao ponto de a doutrina considerar o ónus do gerente com uma verdadeira diabolica probatio, o que, aliada à indefinição quanto aos factos negativos a provar, faz com que possamos falar de responsabilidade objectiva em sentido próprio.

I. É mais difícil para o gerente ou administrador provar a sua não culpa, do que para a Autoridade Tributária provar a sua culpa.

J. O interesse público, na sua vertente de eficácia na arrecadação de receita tributária, não é suficiente para justificar a consagração de presunção em causa, na exacta medida em que a globalização da sociedade e economia hodierna acentuam o peso de circunstâncias exogéneas, fora do controlo dos gestores, que levam a situações de crise empresarial e a sucessivos incumprimentos cujas causas subjacentes não decorrem da actuação dolosa ou negligente do gestor e, em consequência, a violação do interesse público não é, igualmente, culposa.

K. Partindo de uma presunção legal de culpa, nestes casos, não se está a proteger o interesse público mas antes a obter o efeito inverso, desprotegendo os direitos legalmente protegidos dos cidadãos.

L. Acresce que, a presunção legal de culpa ínsita no Artigo 24º, nº 1 alínea b) da LGT, para além de gerar uma situação de tratamento desigual de situações semelhantes, do ponto de vista sistémico, é manifestamente desproporcional.

M. Do Artigo 78º nº 1 do Código das Sociedades Comerciais (CSC) resulta que são os credores sociais onerados com a prova da culpa dos gerentes da sociedade, sendo que a Fazenda Pública é, para os devidos efeitos, credora! N. Por último, o princípio da proporcionalidade também é, na óptica do Recorrente, violado com o estabelecimento de tal presunção legal de culpa.

O. Por outro lado, a prevalência do credor Estado, como decorrência da prossecução do interesse público subjacente à boa cobrança de impostos, está salvaguardada, por via da possibilidade de a Autoridade Tributária poder chamar ao processo de execução fiscal os gestores, através do mecanismo da reversão da execução fiscal, não necessitando de obter prévia decisão judicial, ao contrário dos demais credores sociais, para além dos meios cautelares de que a Autoridade Tributária dispõe.

P. E, por último, a presunção legal de culpa do artigo 24º, nº 1, alínea b) da LGT não sacrifica o interesse dos particulares da menor forma possível, na medida em que, a prova da sua não culpa é uma verdadeira prova diabólica.

Q. Basta atentar no supra exposto, para se concluir que se trata de uma questão manifestamente complexa e de importância jurídica e social fundamental, cuja subsunção jurídica impõe um importante e detalhado exercício de exegese, em ordem a obter-se um consenso em termos de servir de orientação, quer para as pessoas que possam ter interesse jurídico ou profissional na resolução de tal questão a fim de tomarem conhecimento da provável interpretação em termos de exigências probatórias para ilidir a presunção legal de culpa do Artigo 24º nº 1, alínea b) da LGT, quer para as instâncias jurisprudenciais por forma a obter-se uma melhor aplicação do direito às situações fácticas submetidas ao crivo judicial.

R. Por outro lado, extravasa o mero interesse das partes a solução a dar a tal questão, e mostra-se ainda necessária a clarificação da futura aplicação do direito a situações de facto semelhantes, ou seja, o interesse público e impõe a necessidade de apreciação de tal questão em via de Revista para uma melhor aplicação do direito.

S. O objecto do presente recurso cinge-se a aferir se, de acordo com a matéria de facto dada como provada, andou bem o Acórdão recorrido ao considerar que “...

não está demonstrado que o Recorrido tenho afastado a sua culpa pela falta de pagamento das dívidas, uma vez que a prova produzida é manifestamente insuficiente para dar como verificado o pressuposto legal que conduz à ilegitimidade do Opoente, nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 204º do CPPT.” T. Bem andou o Tribunal Tributário de Lisboa quando, em primeira instância, julgou que, em face da prova documental e testemunhal produzidas, resultou suficientemente provado que a falta de pagamento da dívida exequenda não foi imputável ao aqui Recorrente.

U. Com efeito, bem andou o Tribunal de Primeira Instância ao julgar que ficou comprovado que o aqui Recorrente não contribuiu para a diminuição do património da devedora originária e que os actos de gestão relativos à imunização do património societário não estavam nem estiveram a seu cargo.

V. A culpa que está aqui em causa é a de que o Recorrente tenha contribuído para a diminuição patrimonial da devedora societária original — nem mais, nem menos.

W. Não está aqui em causa saber o que poderia ou não ter sido diligenciado pelo Recorrente, como membro do órgão representativo da devedora originária, tanto mais que, como resulta provado nos autos, a sociedade devedora originária era...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT