Acórdão nº 0138/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GON
Data da Resolução27 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.

A………………………, Lda., com sede na …………., n° ………….., Porto, recorre sentença proferida no TAF do Porto em 06/09/2016, que julgou improcedente a impugnação de duas liquidações de taxa, no montante de € 5.000,00 cada uma, operadas pela Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, com vista à instalação e funcionamento do posto de abastecimento de combustíveis duplo, junto aos dois sentidos da Estrada Nacional 1, Km 292,4, ………………, freguesia de Pedroso, Vila Nova de Gaia.

1.2.

Alega e termina com a formulação das conclusões seguintes: A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a impugnação apresentada contra o indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as liquidações da taxa devida pela instalação e funcionamento de postos de abastecimento de combustível, referentes a 2012, no montante global de € 10.000.

  1. A Recorrente considera que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, derivado do incorrecto enquadramento jurídico resultante da valoração que dos factos provados foi efectuada e, bem assim, da decisão perfilhada pelo Tribunal a quo.

  2. Ao contrário do decidido, a Recorrente é parte ilegítima nos procedimentos de liquidação subjacentes aos presentes Autos já que — conforme se reconhece na sentença recorrida — não é titular de qualquer direito de propriedade ou parcelar deste sobre o imóvel no qual se encontram os postos de abastecimento em causa nem tampouco das licenças de exploração emitidas pela Direcção Regional da Economia do Norte relativamente a esses mesmos postos, pelo que não pode ser sujeito passivo da relação tributária in casu.

  3. Na verdade, o Regulamento Municipal que cria a taxa em crise limita-se a tributar a actividade dos postos de abastecimento com fundamento no seu potencial poluente, sem esclarecer quem é o sujeito passivo do tributo em causa pelo que a ora Recorrente não compreende — nem o Tribunal a quo fundamenta — qual a base legal para que possa ser considerada, em vez da titular do direito de exploração dos postos de abastecimento em causa, como sujeito passivo das taxas em crise.

  4. Os órgãos do Município de Vila Nova de Gaia não têm competência para o licenciamento e fiscalização dos postos de abastecimento em causa, por falta de atribuições, ao que acresce que a Recorrente não requereu qualquer renovação ou alteração à autorização de exploração dos postos de abastecimento em causa.

  5. Nem se diga que a ora Recorrente confundiu as atribuições de licenciamento e fiscalização da DRE Norte, com as competências tributárias atribuídas pelo RTGAL aos Municípios em matéria de actividades dos particulares susceptíveis de causar impacto ambiental negativo nos termos do artigo 6°, n° 2 do RTGAL — cfr. p. 6 da sentença proferida — pois que nem a Recorrente as confundiu nem pretende, no contexto dos presentes Autos, negar que os Municípios detenham as referidas competências tributárias na mencionada matéria.

  6. Todavia, é indefensável e contraditório, no plano do Direito aplicável, que se reconheça, por um lado, que a actividade de fiscalização da actividade dos postos de abastecimento em causa, também quanto ao impacto ambiental eventualmente causado, é competência da DRE, a quem incumbe o controlo do cumprimento das normas ambientais em vigor por parte dos postos de abastecimento — como o faz a sentença recorrida — e, por outro, que o Município se encontra legitimado, perante este quadro legislativo e no caso concreto a liquidar e cobrar um tributo em função de uma pretensa «actividade de vigilância e de acções de prevenção, não só para dar cumprimento à lei, como principalmente para evitar riscos quanto à segurança das pessoas e bens, os riscos para a saúde pública e os riscos ambientais associados à existência e funcionamento daqueles postos de combustíveis se concretizem» — cfr. parecer do Ilustre Magistrado do Ministério Público, citado na página 8 da sentença recorrida (cit.).

  7. Se, porventura, o Município desenvolve actividades preventivas e de vigilância em matéria que compete a outra entidade à DRE Norte, como reconhecido nos Autos, não pode pretender valer-se do exercício dessas competências que lhe são alheias, para liquidar uma taxa em virtude de ‘serviços’ que não lhe cabe prestar.

    I. O artigo 133°, n° 2, al. b) do CPA sanciona os actos administrativos feridos de incompetência por falta de atribuições com a nulidade, padecendo, desta feita, os actos de liquidação em crise deste vício e devendo a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que reconheça a aludida nulidade.

  8. A taxa em crise é um tributo que não visa compensar o Município de Vila Nova de Gaia pela realização de uma qualquer prestação pública, nem assenta em qualquer dos pressupostos previstos no artigo 3° do RGTAL e no artigo 4° da LGT.

  9. O tributo em causa não assenta na remoção de um obstáculo jurídico à instalação e exploração dos postos de abastecimento, uma vez que os mesmos já se encontram instalados e a sua actividade devidamente licenciada, pelo menos, até 2028.

    L. O tributo em causa não assenta na utilização de qualquer bem do domínio público municipal, pois, como aludido supra, os postos de abastecimento estão totalmente implantados em propriedade privada.

  10. E, por fim, ao contrário do que parece estar implícito na sentença recorrida, o tributo em causa não assenta em qualquer prestação concreta de um serviço público local, uma vez que o Município de Vila Nova de Gaia não tem, tão-pouco, competência para a fiscalização da actividade — mormente no que respeita ao seu impacto ambiental — dos postos de abastecimento em causa, nem demonstrou ou procurou demonstrar que tenha efectuado quaisquer prestações à Recorrente neste domínio.

  11. Exigir que fosse a ora Recorrente a demonstrar a realização das concretas prestações públicas que fundamentam o direito do Município a liquidar o tributo em crise, constituiria uma inadmissível inversão do ónus da prova legalmente previsto.

  12. Na sentença recorrida não se deu, aliás, como provada qualquer prestação do Município de Vila Nova de Gaia, no que respeita às mencionadas vigilância e prevenção dos riscos alegadamente causados pela actividade dos postos de combustível em causa, pelo que cabia ao Tribunal a quo retirar daí as devidas consequências de Direito... O que, erroneamente, não fez.

  13. Ao contrário, conforme se demonstrou ao longo do presente processo, os postos de abastecimento relevantes são objecto de inspecções periódicas, vistorias e de acções de fiscalização regulares por parte da entidade competente para o efeito — que não é, pois, o Município — e caso as condições de instalação e de exploração gerassem impacto ambiental negativo, a exploração dos mesmos deveria cessar de imediato nos termos da Lei.

  14. Não sendo o tributo previsto nos artigos 100° do Regulamento e 29° da respectiva Tabela anexa justificado por qualquer contrapartida específica, carecendo de caracter bilateral, este assume a natureza de verdadeiro imposto conforme entendimento já adoptado pelo Tribunal Constitucional, em termos similares, para uma norma regulamentar do Município de Sintra, no acórdão n° 24/2009, da 3ª Secção, de 14 de Janeiro de 2009, proferido no âmbito do processo n° 990/079.

  15. É por tudo quanto se evidenciou no caso dos Autos — e não por considerar, como poderia resultar implícito da sentença recorrida, que a taxa cobrada pelo Município de Gaia deve abstractamente ser classificada como um imposto — que, configurando-se as taxas concretamente liquidadas à Recorrente e aqui em crise como verdadeiros impostos, já que não assentam em qualquer dos pressupostos legalmente previstos no RTGAL para o efeito, é manifesto que o respectivo regulamento viola frontalmente a alínea i) do n° 1 do artigo 165° da CRP, já que aos municípios não é lícito criar este tipo de tributos.

  16. O indeferimento da reclamação apresentada e, bem assim, as liquidações da taxa que a motivaram devem ser anulados por violação de lei ordinária e constitucional.

  17. As normas contidas no artigo 100° do Regulamento e no artigo 29° da respectiva Tabela anexa são orgânica e materialmente inconstitucionais, por violação dos artigos 103°, n° 2 e 165°, n° 1, alínea i) da CRP.

    Termina pedindo a revogação da sentença, com as demais consequências legais, designadamente a sua substituição por decisão que dê por verificados os vícios de ilegitimidade da ora Recorrente e de violação de Lei ordinária e/ou constitucional alegados.

    1.3.

    A recorrida Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia contra-alegou, terminando com as seguintes conclusões.

    1 - A douta sentença recorrida que julgou improcedente a impugnação considerando a impugnante parte legítima, que o Município é competente para proceder à liquidação da taxa de impacto ambiental negativo e que o tributo exigido consubstancia uma taxa e não um imposto, não merece qualquer reparo, encontra-se devidamente fundamentada e fez correcta interpretação da lei aos factos, não violando quaisquer normativos legais nem padecendo de inconstitucionalidade, pelo que deve ser mantida.

    2 - De acordo com o n° 3 do artigo 18° da Lei Geral Tributária e o artigo 7° n° 2 do regime geral das taxas das autarquias locais, consagrado na Lei nº 53-E/2006, de 29 de Dezembro, e que fundamenta a taxa em questão, o sujeito passivo identifica-se pela sua vinculação ao cumprimento da prestação tributária.

    3 - Ora, sendo a prestação tributária devida pelo exercício de uma actividade de impacto ambiental negativo e sendo a recorrente quem exerce essa actividade, independentemente de ser titular ou não da propriedade ou da licença de exploração, é a recorrente que está vinculada ao cumprimento da prestação tributária e, por isso, é o sujeito passivo e parte legítima.

    4 - As atribuições e competências das autarquias para criação de taxas decorrem do disposto no artigo 15° da Lei das Finanças Locais e...

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