Acórdão nº 0146/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução27 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 2077/14.82BESNT 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A……………, S.A.” (adiante Impugnante ou Recorrente) recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida, após indeferimento da reclamação graciosa prévia, contra a autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) que efectuou com referência ao exercício do ano de 2012, que considerou que não pode aceitar-se como custo fiscal do exercício os montantes correspondentes às tributações autónomas que autoliquidou no mesmo exercício.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1ª) A ora recorrente, em sede de autoliquidação do IRC de 2012, efectuou tributações autónomas sobre despesas de representação, viaturas de passageiros ou mistos, ajudas de custo e despesas confidenciais, nos termos do art. 81.º do CIRC [ (A Recorrente quer referir-se ao art. 88.º do CIRC, na redacção aplicável, e que corresponde ao art. 81.º na versão anterior à republicação do Código operada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho.

)]; 2ª) A ora recorrente, em sede de autoliquidação de IRC de 2012, não considerou, erradamente, esses quantitativos pagos como tributações autónomas como custo fiscal, nos termos do art. 23.º do CIRC; 3ª) Ora, a alínea f) do n.º 1 do referido art. 23.º do CIRC, considera, expressamente, como custo, os gastos de natureza fiscal – as tributações autónomas são gastos de natureza fiscal; 4ª) Por outro lado, à época dos factos, estabelecia o art. 45.º do CIRC que não eram dedutíveis o IRC e quaisquer outros impostos que, directa ou indirectamente, incidam sobre os lucros; 5ª) Ora, como é entendimento da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e da doutrina, as tributações autónomas sobre despesas de representação, viaturas de passageiros ou mistos, ajudas de custo e despesas confidenciais incidem, não sobre lucros, mas sim sobre despesas; 6ª) Na medida em que tais tributações autónomas incidem sobre despesas, não lhes é aplicável a norma de exclusão de tais tributações como custo fiscal, estabelecida no art. 45.º do CIRC; 7ª) Aliás, a recente alteração ao Código do IRC, efectuada pela Lei 2/2014, de 16/1, ao estabelecer que as tributações autónomas não são custo fiscal (art. 23.º-A, n.º 1, a)), só reforça esse entendimento, isto é, antes dessa alteração legislativa, as tributações autónomas eram custo fiscal; 8ª) Houve, deste modo, um erro cometido pela recorrente na sua autoliquidação, ao não considerar, na determinação do seu lucro tributável, as tributações autónomas como custo; 9ª) Por isso, e salvo o devido respeito, a douta sentença interpretou e aplicou erroneamente o disposto no art. 23.º, n.º 1, f), do CIRC.

[…] Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente e, em consequência, ser a douta sentença revogada e substituída por outra que julgue procedente a impugnação judicial […]».

1.3 A Impugnante não contra-alegou.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida, com a seguinte fundamentação: «[…] A questão controvertida consiste em saber se as tributações autónomas sobre despesas de representação, encargos com viaturas, ajudas de custo e compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador são custos fiscais, nos termos e para os feitos do disposto no artigo 23.º/1/f) do CIRC.

Nos termos do estatuído do no artigo 23.º do CIRC consideram-se como custos/gastos fiscais ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Para que os custos enumerados no artigo 23.º do CIRC sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais é necessário, pois, que se verifiquem dois requisitos cumulativos, a saber: 1. Que sejam comprovados através de documentos emitidos nos termos legais; 2. Que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos.

Nos termos do disposto no artigo 23.º/1/f) consideram-se custos fiscais os encargos de natureza fiscal e parafiscal.

Será o caso, por exemplo, do ISP, IEC, IMI, CSS, IS, etc. (Apontamentos ao IRC, Rui Duarte Morais, páginas 92 e 93).

Já não será o caso, a nosso ver, das tributações autónomas, como pretende a recorrente.

De facto, nas tributações autónomas «… está em causa uma tributação que incide sobre certas despesas dos sujeitos passivos, as quais são havidas como constituindo factos tributários.

É difícil descortinar a natureza desta forma de tributação, e, mais ainda, a razão pela qual aparece prevista nos códigos dos impostos sobre o rendimento.

O objectivo parece ser o de tentar evitar (atenuando ou “anulando a vantagem” delas resultante em IRC) que, através dessas despesas, o sujeito passivo utilize para fins não-empresariais bens que geraram custos fiscalmente dedutíveis; ou que sejam pagas remunerações a terceiros com evasão aos impostos que seriam devidos por estes. A realização de tais despesas implica um encargo fiscal adicional para quem nelas incorre porque a lei supõe que, assim, outra pessoa deixa de pagar imposto» (obra citada, páginas 202/203).

Ora, por certo que só se pode alcançar tal objectivo com a não dedutibilidade dessa tributação como custo/gasto fiscal, sob pena da sua subversão.

As tributações autónomas só surgem com a tributação de determinadas despesas, pelo que atenta a sua natureza não podem ser aceites como encargo fiscalmente dedutível.

A aceitar-se a dedutibilidade de tais despesas verificar-se-ia uma evidente contradição no processo de determinação do imposto a pagar.

Na verdade, por um lado tributa-se a despesa que se pretende dissuadir de realizar, acrescendo-se a tributação autónoma ao IRC, por outro lado, ao aceitar-se como custo fiscal essa tributação, ir-se-ia diminuir o valor do IRC a pagar.

O legislador não quis, seguramente, esse resultado.

Como bem refere a sentença recorrida a actual norma do artigo 23.º-A/1 do CIRC não tem carácter inovatório mas sim interpretativo.

Na verdade, antevendo a controvérsia sobre a inclusão ou não das tributações autónomas no artigo 45.º/1/ a) do CIRC, após inflexão da jurisprudência dos tribunais superiores, o legislador decidiu resolvê-la pela via normativa.

A sentença recorrida, a nosso ver, não merece censura».

1.5 Colheram-se os vistos dos Conselheiros adjuntos.

1.6 Cumpre apreciar e decidir.

* * * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra procedeu ao julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: «1. A Impugnante dirige um grupo de empresas que optou pelo “Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades” (cfr. prints informáticos, a fls. 22 e 23 do PAT, em apenso); 2. No dia 31 de Maio de 2013, a Impugnante entregou a declaração de rendimentos do grupo, referente ao ano de 2012, onde apurou IRC a recuperar, no valor de € 32.198,64 (cfr. declaração modelo n.º 22 de IRC, a fls. 15 a 17 do procedimento de reclamação graciosa, o qual faz parte integrante do PAT, em apenso); 3. Na declaração descrita no ponto n.º 2 do probatório, foram apuradas «Tributações autónomas», no valor de € 57.290,53, referentes a “Encargos com viaturas”, “Despesas de representação” e “Encargos com ajudas de custo e de compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador” (cfr. declaração modelo n.º 22 de IRC, a fls. 15 a 17 do procedimento de reclamação graciosa, o qual faz parte integrante do PAT, em apenso); 4. No dia 19 de Junho de 2013, os serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira emitiram a liquidação de IRC n.º 2012500239614, onde foram mantidos os valores apurados pela Impugnante, conforme descrito nos pontos n.ºs 1 e 2 do probatório (cfr. print informático, a fls. 25 do PAT, em apenso) 5. No dia 09 de Abril de 2014, a Impugnante contestou...

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