Acórdão nº 0786/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução10 de Novembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

I. Relatório 1. O MUNICÍPIO DE MONÇÃO [MM] demandou neste Supremo Tribunal [STA], e em acção administrativa especial [AAE], a PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS [PCM] pedindo a anulação dos actos administrativos ínsitos no DL nº45/2014, de 20.03, e na Resolução do Conselho de Ministros 30/2014, de 08.04, e indicando como contra-interessados os municípios de MELGAÇO, VALENÇA, VILA NOVA DE CERVEIRA, CAMINHA, PAREDES DE COURA, a sociedade B............

, S.A., e a A…………, S.A.

[A…………].

A solicitação do tribunal, o autor veio identificar os actos administrativos postos em causa, como sendo os seguintes: a) Acto administrativo do Conselho de Ministros de 08.04.2014 [DL nº45/2014, de 20.03, e RCM 30/2014, de 08.04], que determina a alienação de 100% das acções da A............, e decide que o concurso público previsto no nº2, do artigo 2º, do DL nº45/2014, de 20.03, tenha por objecto acções representativas de 95% do capital social da A............; b) Acto administrativo do Conselho de Ministros de 08.04.2014 [DL nº45/2014, de 20.03, e RCM 30/2014, de 08.04], que determina a abertura do concurso público e originou a publicação do respectivo anúncio de procedimento nº1988/2014; c) Acto administrativo do Conselho de Ministros de 08.04.2014 [DL nº45/2014, de 20.03, e RCM 30/2014, de 08.04], que determina a oferta pública de alienação de 5% das acções da A............ aos trabalhadores desta.

Para tanto, alega fundamentalmente, que tais «actos administrativos» padecem dos seguintes vícios que motivam a sua anulação: a) Violação de lei, dado que qualquer alteração estatutária da B............, a ocorrer, teria de ser levada a cabo ao abrigo do regime previsto no Código das Sociedades Comerciais [CSC], ou, pelo menos em resultado de modificação, constitucionalmente conformada, do artigo 36º do DL nº133/2013, de 03.10, de acordo com o qual a alteração dos estatutos das empresas públicas sob a forma de sociedade anónima é realizada nos termos do CSC [ver artigos 26º a 28º, 86º a 89º, e 91º, da petição inicial]; b) Inconstitucionalidade orgânica, por alteração unilateral dos estatutos de empresa pública - a B............ - sendo que se trata de matéria relativa a «bases gerais das empresas públicas», que é da exclusiva competência legislativa da Assembleia da República [AR], conforme estipula o artigo 165º, nº1 alínea u) da CRP [ver artigos 29º a 43º da petição inicial]; c) Inconstitucionalidade material, por violação dos preceitos que garantem a «autonomia local» - artigos 6º, 235º, nº2, e 242º, nº1, da CRP - e, ainda, por violação dos princípios da segurança jurídica, protecção da confiança, e dever de lealdade - artigos 2º e 18º, nº2, da CRP - [ver artigos 45º a 48º, 55º a 67º, e 90º, da petição inicial].

2. Apenas a PCM contestou defendendo-se por excepção e impugnação. Quanto à primeira, excepcionou a «incompetência material da jurisdição administrativa para conhecer da pretensão deduzida pelo autor» [folhas 124 a 140 dos autos]. Quanto à segunda, impugnou as inconstitucionalidades apontadas ao DL nº45/2014, de 20.03, e à RCM nº30/2014, de 08.04.

3. Ouvido o MM sobre a «matéria da excepção» [artigo 87º, nº1, alínea a), do CPTA], veio o mesmo «reiterar tudo o que alegou na petição inicial, onde advoga estarmos perante verdadeiros actos administrativos cuja legalidade deverá ser apreciada e decidida pelos tribunais administrativos» [folha 287 dos autos].

4. Foi proferido «saneador» onde se deixou claro que a pretensão impugnatória deduzida pelo MM se reconduzia, somente, à anulação dos «actos» contidos na RCM nº30/2014, de 08.04, não envolvendo eventuais actos contidos no referido DL nº45/2014, de 20.03, e face a esta delimitação do objecto da acção decidiu julgar improcedente a excepção de incompetência absoluta deduzida pela PCM.

5. O autor, MM, não apresentou alegações escritas. E, perante esta ausência de alegações do autor, a PCM limitou-se a reafirmar as razões apresentadas na sua contestação em abono da total improcedência da AAE.

6. Colhidos que foram os «vistos» legais, cumpre apreciar e decidir o objecto da acção.

II. De Facto Por articulados, pertinentes, e provados, consignamos os seguintes factos: 1. O DL nº113/96, de 05.08, criou o «sistema multimunicipal de triagem, recolha selectiva, valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos do Vale do Minho», integrando, como seus utilizadores originários, os municípios de CAMINHA, MELGAÇO, MONÇÃO, PAREDES DE COURA, VALENÇA e VILA NOVA DE CERVEIRA - artigo 1º - bem como aprovou os Estatutos da respectiva concessionária; 2. A «exploração e gestão» desse sistema multimunicipal foram adjudicadas, em regime de concessão exclusiva, à B............, SA, por um período de 25 anos, nos termos do DL nº294/94, de 16.11 [que estabelece o regime jurídico da concessão da exploração e gestão de resíduos multimunicipais de tratamento de resíduos sólidos urbanos] - artigo 3º, nº1, do DL nº113/96, de 05.08; e artigo 1º, nº1, do DL nº294/94, de 16.11; 3.

A B............ rege-se pelo DL nº113/96, de 05.08, lei comercial e respectivos «Estatutos» publicados em Anexo a este diploma legal - artigos 2º, nºs 1 e 2, e 5º, nº1, do DL 113/96, de 05.08; 4.

O autor, MM, é accionista, juntamente com a A............ e mais cinco municípios - CAMINHA, MELGAÇO, PAREDES DE COURA, VALENÇA e VILA NOVA DE CERVEIRA - da B............ - artigo 6º, nº1, do DL nº113/96, de 05.08; 5. O capital social da B............ divide-se em acções «classe A» e «classe B», devendo as acções da «classe A» representar, no mínimo, 51% do capital social com direito a voto, e delas apenas poderiam ser titulares os municípios utilizadores do referido sistema multimunicipal de tratamento de resíduos sólidos urbanos e os entes públicos, entendidos estes nos termos da alínea e) do nº2 do artigo 1º da Lei nº71/88, de 24.05 - artigo 6º, nº3, do DL nº113/96, de 05.08; e artigos 6º, nº2, e 9º dos Estatutos da B............

; 6.

A A............ é uma sociedade de capitais integralmente públicos, «sub-holding» do grupo C………… [C............], que tem como objecto a gestão integrada dos resíduos sólidos urbanos [RSU], assegurando o tratamento e valorização dos resíduos, em regime de parceria com os municípios que fazem parte integrante de diversos sistemas multimunicipais criados para o efeito pelo DL nº294/94, de 16.11 [entretanto alterado pelo DL nº221/2003, de 20.09, e pelo DL nº195/2009, de 20.08]; 7.

A C………… é, presentemente, titular da totalidade do capital social da A............; 8.

Em 03.10.2013, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei nº18/2013, de 18.02, foi publicado no DR, 1ª série, nº191, o DL nº133/2013, aqui dado por integralmente reproduzido, o qual estabelece os princípios e regras aplicáveis ao sector público empresarial, incluindo as bases gerais do estatuto das empresas públicas; 9. Em 20.03.2014, foi publicado no DR, 1ª série, nº56, o DL nº45/2014, aqui dado por integralmente reproduzido, que aprovou o processo de «reprivatização» da A............ e definiu os respectivos trâmites de procedimento; 10.

O processo de reprivatização da A............ ocorre mediante alienação das acções representativas de até 100% do seu capital social - artigo 2º, nº1, do DL nº45/2014, de 20.03; 11. A alienação das acções da A............ efectua-se através de um concurso público e de uma oferta pública de venda dirigida aos seus trabalhadores, a realizar nos termos previstos na Lei nº11/90, de 05.04 [alterada pelas Leis nºs 102/2003, de 15.11, e Lei nº50/2011, de 13.09], e no DL nº45/2014, de 20.03; 12.

Em 08.04.2014, foi publicada no DR, 1ª série, nº69, a RCM nº30/2014, que igualmente aqui se dá por integralmente reproduzida, de onde se extrai, nomeadamente, o seguinte: Nos termos do nº1 do artigo 14º do DL nº45/2014, de 20.03, e das alíneas c) e g) do artigo 199º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve: 1- Determinar que são alienadas 100% das acções da A............ e que o concurso público previsto no nº2 do artigo 2º do DL nº45/2014, de 20.03, tenha por objecto acções representativas de 95% do capital social da A.............

2- Aprovar o caderno de encargos do concurso público, constante do anexo I à presente resolução, da qual faz parte integrante, no qual se estabelecem os termos e condições específicos a que obedece o concurso público previsto no número anterior.

3- Aprovar os termos do exercício pelos municípios da opção de alienação das participações sociais por aqueles detidas no capital das entidades gestoras de sistemas multimunicipais nas quais a A............ é accionista, bem como do exercício do direito de preferência pelos restantes municípios da mesma entidade gestora, relativamente à referida alienação, os quais constam do caderno de encargos a que se refere o número anterior.

4- Determinar a abertura do concurso público previsto no nº2 do artigo 2º do DL nº45/2014, de 20.03, através do envio para publicação do anúncio no Jornal Oficial da União Europeia e no Diário da República.

5- Aprovar, no anexo II à presente resolução, da qual faz parte integrante, algumas condições da oferta pública de venda de acções da A............, dirigida exclusivamente a trabalhadores da A............, no âmbito da qual os referidos trabalhadores podem adquirir acções representativas de 5% do capital social da A.............

6- Determinar que as acções que não sejam vendidas a trabalhadores, assim como aquelas cuja transmissão não se concretize, acrescem automaticamente às acções a adquirir pelo vencedor do concurso público, obrigando-se este a adquirir tais acções pelo preço por acção constante da sua proposta vinculativa.

7- Determinar que ao abrigo do artigo 16º do DL nº45/2014, de 20.03, compete à Ministra de Estado e das Finanças, com faculdade de subdelegação no Secretário de Estado das Finanças, aprovar o convite e todos os aspectos que, nos termos do caderno de encargos, devam ser fixados no mesmo.

8- Constituir uma comissão especial nos termos do artigo 20º da Lei nº11/90, de...

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