Acórdão nº 4087/03.6TBPRD.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelJOÃO BERNARDO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1 . A contradição com a resposta de “não provado” a um ponto da B.I. só pode ter lugar se, noutro ponto da fixação factual, se deu como provada a matéria naquele perguntada.

2 . Estando provado que uma sociedade “encarregou” outra da mão de obra das estruturas de betão e que, para a realização de tais trabalhos lhe “cedeu” a utilização duma grua que a outra passou a utilizar para realização da estrutura de “betão armado que lhe tinha sido cometida”, estão preenchidos todos os requisitos da relação de comitente-comissário, prevista no artigo 500.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil.

3 . É de subsumir no regime de presunção de culpa do artigo 493.º, n.º1, deste código, a queda dessa grua devida a falência da sua fixação ao solo.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – Na acção principal, AA e sua filha menor, por si representada, BB, intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra: 1 . CC– Companhia de Seguros, S.A.; 2 . DD – Construções, Lda; 3 . EE – Companhia de Seguros, S.A. e 4 . Construções FF, Lda.

Alegaram, em síntese, que: No dia 31.10.2000, GG, marido e pai delas, trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização da 2ª ré, como condutor – manobrador de gruas, no âmbito da construção dum prédio da 4ª ré; A dado passo, a grua caiu, produzindo-lhe ferimentos dos quais resultou, directa e necessariamente, a morte; A 2ª ré havia transferido a sua responsabilidade para a 1ª ré e a 4.ª para a 3.ª ré.

Relativamente aos danos patrimoniais já se encontram indemnizadas, mas subsiste a indemnização relativamente aos não patrimoniais.

Pediram, em conformidade, a condenação, solidária, das rés a pagarem-lhes € 142.500,00, acrescidos de juros à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

A ré “CC– Companhia de Seguros, S.A.”, contestou, em termos que já não interessam.

A 2ª ré, “DD – Construções, Lda.”, não contestou.

A ré EE contestou, impugnando os factos alegados quanto à responsabilidade pela ocorrência do acidente e quanto aos danos daí resultantes e alegando que a 4ª Ré, sua segurada, era a empreiteira da obra, a qual tinha dado de subempreitada à 2ª Ré a obra de pedreiro, tendo cedido a grua no âmbito desse contrato à 2ª Ré, pelo que foi esta quem passou a manobrar a grua e a ter o ónus da vigilância das suas condições de funcionamento e eficácia.

A 2ª Ré, “DD – Construções, Lda.”, não apresentou contestação.

A 4ª Ré , “Construções FF, Lda.”, contestou, sustentando na parte que agora importa, que os factos alegados na petição inicial não são suficientes para se concluir pela sua responsabilização.

Houve réplica e tréplica.

...................

II – Na acção n.º 4392/03.1TBPRD HH, mulher, II, e JJ intentaram a acção declarativa de condenação, em processo comum ordinário, contra: EE – Companhia de Seguros, S.A. e Construções FF, Lda.”.

Alegaram, em síntese, que a queda da grua danificou um prédio de que são comproprietários.

Pediram, em conformidade: A condenação destas a pagarem: Aos 1ºs autores € 60.000,00, bem como o montante que se vier a liquidar em execução ulteriormente; À 3.ª autora € 1.651,00, tudo acrescido de juros legais desde a citação até integral pagamento.

A Ré “Construções FF, Lda.” contestou, nos termos constantes de fls. 26 a 41, impugnando parte dos factos alegados pelos AA. relativamente aos danos resultantes da queda da grua, aduzindo que o prédio ficou valorizado após a conclusão das obras realizadas pela Ré e que os danos não patrimoniais alegados não merecem a tutela do direito, e defendendo ainda que os factos alegados na petição inicial não são suficientes para concluir pela verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, por factos ilícitos, prevista no art. 483º do Código Civil, ocorrendo até que empregou todas as providências exigidas para prevenir eventuais danos decorrentes da utilização da grua e que a queda desta foi originada por uma situação de força maior.

A Ré II contestou, sustentando não serem alegados factos que levem à sua responsabilização e impugnando grande parte dos alegados.

Houve réplica e tréplica.

………………………..

III Na acção n.º 4455/03.3TBPRD, KK e mulher, LL, intentaram a acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra: Construções FF, Lda. e II, Alegaram, em síntese, que são proprietários da fracção H do prédio onde caiu a grua, tendo tido os prejuízos que descrevem.

Pediram, em conformidade, a condenação das rés a pagarem-lhes € 19.700,00, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal até integral pagamento.

A ré Construções FF, Lda contestou, invocando a excepção de cumprimento, na medida em que fez um acordo com os autores para ressarcimento dos prejuízos a estes causados pela queda da grua e impugnou grande parte dos factos alegados.

A ré II impugnou também a grande maioria dos factos provados.

IV – As acção, com as suas apensas, prosseguiu a sua tramitação, tendo, na altura própria, sido proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor: “- Julgando-se parcialmente procedente a acção e declarando-se que a responsabilidade da R. “Construções FF, Lda.” se encontra transferida, pelo contrato de seguro aludido nos pontos 6 a 8 da matéria de facto, para a Ré “EE – Companhia de Seguros, S.A.”, garantindo assim esta a obrigação daquela dentro dos limites de âmbito e de montantes da respectiva apólice: a) condena-se a Ré “Construções FF, Lda.” a pagar às AA. AA e BB a quantia de € 92.500,00 (noventa e dois mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a citação até integral pagamento; b) condena-se a Ré “Construções FF, Lda.” a pagar aos AA. HH e II a quantia de € 45.963,29 (quarenta e cinco mil novecentos e sessenta e três euros e vinte e nove cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a citação até integral pagamento; - condena-se a Ré “Construções FF, Lda.” a pagar à A. JJ a quantia de € 1.651,35 (mil seiscentos e cinquenta e um euros e trinta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a citação até integral pagamento; - absolvem-se as RR. do restante pedido; c) condena-se a Ré “Construções FF, Lda.” a pagar aos AA. KK e LL a quantia que vier a ser liquidada até ao limite de € 7.700,00, respeitante à indemnização global dos danos patrimoniais aludidos nos pontos 79, 84, 85 e 86, 87 e 88 e 90 da matéria de facto, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a data em que o crédito dos AA. se tornar líquido até integral pagamento; - condena-se a Ré “Construções FF, Lda.” a pagar aos AA. KK e LL, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por si sofridos, a quantia de € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, ou outra que legalmente venha a estar em vigor, desde a data em que o crédito dos AA. se tornar líquido até integral pagamento; - absolvem-se as RR. do restante pedido.” V – Apelaram as rés FF, Lda e II, mas sem êxito, porquanto o Tribunal da Relação do Porto confirmou a decisão.

VI – Ainda inconformadas, pedem revista.

Vamos examinar primeiro o recurso de Construções FF, Lda.

Conclui as alegações do seguinte modo: 1 - No quesito 11° da base instrutória do processo 4392/03.1TBPRD, perguntava-se: "Sucede que essa drenagem foi deficientemente efectuada", sendo o quesito antecedente deste do seguinte teor: 10.° Na construção desse maciço a 2.ª Ré efectuou um sistema de drenagem de águas, destinado a impedir a infiltração de águas? Ao aludido quesito a Sentença em 1.ª Instância respondeu - NÃO PROVADO.

2 - O douto Acórdão sob Revista ao decidir que a matéria contida neste quesito é conclusiva, devendo considerar-se "não escrito", fez uma errada interpretação e aplicação do artigo 646.°, n.º 4, do Código de Processo Civil.

3 - A matéria perguntada no quesito 11° está ajustada aos factos alegados e antes questionados pelos recorridos, dela não resultando qualquer questão de direito ou necessidade de recurso a norma legal para interpretar e apurar a verdade de facto, se a drenagem foi ou não deficientemente efectuada.

4 - Sendo comunemente reconhecida a difícil distinção entre questão de facto e questão de direito, a matéria contida no quesito 11.º trata de factos alegados pelos Autores/Recorridos, que importava apurar, como se apurou.

5 - Mesmo a considerar-se que a matéria constante do aludido quesito 11.º se trata de um juízo valorativo, a verdade é que o mesmo foi aceite pelas partes, que o entenderam como um facto (ocorrências da vida real), devendo, por isso, ser havido como matéria de facto.

6 - A matéria contida no dito quesito 11.º integra-se no thema decidendum, não devendo também por isso considerar-se não escrita a resposta.

7 - A sentença proferida em 1.ª instância não considerou o elemento básico da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, qual seja, o facto do agente, um facto voluntário, pois só quanto a factos dessa natureza tem cabimento a ideia da ilicitude, o requisito da culpa e a obrigação de reparar os dano nos termos impostos por lei.

8 - Porém, outro foi o entendimento do Tribunal da Relação do Porto. No douto Acórdão sob Revista considerou-se, em síntese, o seguinte: "(. . .) A grua foi instalada e foi construída a plataforma sobre a qual aquela estava instalada na sequência de instruções da Ré "Construções FF, Lda. ", no âmbito do acordo referido no ponto 13 (ponto 16) sendo certo que por virtude de tal facto e da sua execução e da omissão de meios imputáveis necessariamente à Ré FF que era a empreiteira e por ser a entidade a quem competia a coordenação geral dos trabalhos de construção o dever de providenciar pela instalação e manutenção da grua em condições de...

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