Acórdão nº 323/12.6TUPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução06 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 323/12.6TUPRT.P1 4.ª Secção Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:II1. Relatório 1.1. B…, intentou a presente acção declarativa com processo especial emergente de acidente de trabalho patrocinado pelo Digno Magistrado do Ministério Público contra C… – Seguros Gerais, S.A., e D…, S.A., peticionando que: 1.1.1.

a Ré C… – Seguros Gerais, S.A., seja condenada a pagar à Autora as seguintes quantias: ● a quantia de € 10,00 a título de despesas de transporte; ● a quantia de € 509,25 a título de indemnização pelo período de Incapacidade Temporária Absoluta entre 17.03.2012 e 30.04.2012, relativo aos 45 dias não pagos dos 112 de ITA; ● a quantia correspondente à sua quota-parte de responsabilidade do capital de remição de uma pensão anual de € 293,21 com início em 01-05-2012; 1.1.2.

a Ré D…, S.A., seja condenada a pagar à Autora as seguintes quantias: ● a quantia de € 45,42 a título de indemnização pelo período de Incapacidade Temporária Absoluta entre 10.01.2012 e 30.04.2012, num total de 112 dias, relativo ao subsídio de alimentação não transferido para a seguradora; ● a quantia correspondente à sua quota-parte de responsabilidade do capital de remição de uma pensão anual de € 293,21 com início em 01-05-2012; Para tanto alegou, em síntese: que foi vítima de um acidente de trabalho no dia 9 de Janeiro de 2012, que lhe causou as lesões descritas nos autos, que lhe determinaram, como consequência directa e necessária, 112 dias de Incapacidade Temporária Absoluta entre 10 de Janeiro de 2012 e 30 de Abril de 2012 e, após alta, ficou a autora afectada de uma Incapacidade Permanente Parcial de 6 %; que na ocasião se encontrava ao serviço da ré D…, S.A., ao tempo sua entidade empregadora, no respectivo local de trabalho e também dentro do seu horário de trabalho; que auferia então o salário base de € 485,00 vezes 14 meses/ano mais € 17,38 vezes 11 meses/ano a título de subsídio de alimentação, encontrando-se a responsabilidade infortunística transferida, através de contrato de seguro titulado pela apólice n.º …………./., mas apenas pelo salário de € 485,00 vezes 14 meses/ano.

Ambas as RR contestaram – a R. empregadora a fls. 92 e ss. e a R. seguradora a fls. 121 e ss.

A R. empregadora aceitou a relação laboral e a verificação do acidente, mas impugnou a sua caracterização como acidente de trabalho e a factualidade relativa às consequências do acidente (lesões, incapacidades e despesas), invocando o seu desconhecimento, e alegando, também, que a transferência de responsabilidade para a ré seguradora através do contrato de seguro abrange a totalidade da retribuição auferida pela autora.

A R. seguradora aceitou na contestação a transferência de responsabilidade quanto ao salário de € 485,00 X 14 meses/ano e impugnou a matéria reportada à ocorrência do acidente pela forma narrada na petição inicial, alegando factos tendentes a demonstrar que o acidente ocorreu porque a sinistrada actuou à revelia da sua entidade patronal e da própria empresa onde desempenhava as suas funções de trabalhadora de limpeza, tendo sido a sua desobediência e desrespeito pelas ordens superiores a causa directa do sinistro e, consequentemente, das suas lesões, pelo que tal constituiu um comportamento negligente, logo, descaracterizador do acidente, nos termos do artigo 14, nº 1 al. b) da Lei 98/2009 e, de qualquer forma, agiu de forma temerária e violadora não só das mais basilares regras de cuidado como do mais elementar bom senso, pelo que o acidente não é reparável como acidente de trabalho, estando descaracterizado. Impugna ainda que a autora esteja afectada de IPP no grau que alega e, bem assim, a factualidade respeitante à invocada despesa. Requereu, a final, a realização de exame por junta médica.

Foi proferido despacho saneador, e foram, também, seleccionados os factos assentes e organizada a base instrutória, que não foram objecto de reclamação.

Organizado o apenso relativo à fixação da incapacidade da A. (apenso A) e ordenada a realização de junta médica, o Mmo. Juiz a quo proferiu decisão final no apenso, fixando à sinistrada ITA desde a data do acidente até 30 de Abril de 2012, data da alta, e uma IPP de 6% desde então.

Procedeu-se ao julgamento com observância das formalidades legais e foi decidida a matéria de facto em litígio (fls. 224 e ss.), que não foi objecto de reclamação.

Após, o Mmo. Juiz a quo proferiu sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Nos termos e fundamentos expostos, julgo a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, condenando as ré C… - Seguros Gerais, S.A. (1.ª demandada), a pagar à autora o capital de remição correspondente a uma pensão, no valor anual de € 293,21, com início em 01 de Maio de 2012, assim como a pagar-lhe a quantia (global) de € 554,67, a título de diferenças de indemnização por incapacidade temporária, todas essas quantias acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a data da alta até efectivo e integral pagamento.

Absolve-se a 2.ª ré, D…, S.A., do pedido.

Custas pela seguradora.

Valor da acção: € 4.488,38.

Oportunamente, proceda-se ao cálculo do capital de remição e remeta-se os autos ao M.º Público.» 1.2.

A R. seguradora, inconformada, interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: “1. O presente recurso sobre a douta decisão proferida quanto à matéria de facto funda-se na convicção da Seguradora Apelante de que o Douto Tribunal “a quo” terá efectuado uma incorrecta apreciação da prova testemunhal e documental e, concretamente, na instrução da matéria plasmada nos QUESITOS 8º, 9º, 10 e 14º da douta base instrutória fixada, e que foram, no seu essencial, considerados NÃO PROVADOS.

  1. Ora, perante a prova produzida, impunha-se decisão diversa da proferida quanto à supra aludida matéria de facto pois, dos depoimentos testemunhais, conjugados com a prova documental, resultou prova bastante para se considerar provada a factualidade inserta nos supra referidos quesitos.

  2. Os concretos meios probatórios que se entende terem sido erradamente apreciados e cujo reexame se solicita agora em sede recursiva são os seguintes: a. DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS: • E... (gravado em CD único, produzido em audiência de 17/03/2014, de 11:04:45 a 11:14:21) • F... (gravado em CD único, produzido em audiência de 17/02/2014, de 11:16:28 A 11:48:50) • G... (gravado em CD único, produzido em audiência de 17/03/2014, de 12:06:58 A 12.30:35) b. PROVA DOCUMENTAL: • Depoimentos escritos colhidos em sede de averiguação do sinistro e junto aos autos como docs. 2 a 4 da contestação da seguradora R.

    • Relatório médico e relatório de alta do Centro Hospitalar São João, EPE e juntos aos autos a fls….

  3. Pois bem, salvo o devido respeito por diverso entendimento, dos citados elementos probatórios resulta à saciedade que as lesões (queimaduras químicas nas mãos) de que padece a sinistrada, nunca poderiam ter sido causadas pela utilização de um dos produtos de limpeza que a D... providencia para que a sinistrada desempenhasse as suas funções.

  4. Resulta ainda inequívoco que a concreta tarefa de desentupir canos não estava acometida à sinistrada e que, portanto, extrapolava as funções desta e que a sinistrada bem sabia que não devia e não podia utilizar outros produtos que não aqueles que a D... lhe fornecia e, bem assim, que não devia e não podia desentupir os canos, sobretudo sem conhecimento e sem autorização da D..., sua entidade empregadora.

  5. Todos estes elementos probatórios – que se entende terem sido erradamente apreciados pelo Mmo Tribunal “a quo” – convergem no sentido de que a sinistrada utilizou, sem o conhecimento, sem a anuência e contra as instruções da sua entidade empregadora, o produto químico destinado a desentupir canos, e por seu livre alvedrio, bem sabendo que tal concreta tarefa – desentupir o poliban – não lhe tinha sido incumbida, seja pela D..., seja pela H....

  6. Face a tais evidências, e sempre com o máximo respeito por diverso entendimento, podia e devia o Mmo. Tribunal, legitimamente considerar provado que, efectivamente, a sinistrada utilizou o produto desentupidor de canos, o que lhe provocou as queimaduras químicas nas mãos e antebraço.

  7. Face ao supra aludido, e reexaminando as supra indicadas provas testemunhais e documentais, aliadas à regra da experiência e, bem assim, recorrendo as presunções judiciais, deveria, pois, o Mmo. Tribunal “a quo” ter julgado PROVADOS os factos constantes dos quesitos 8º, 9º, 10 e 14º da douta base instrutória 9. Ao contemplar diverso entendimento, a douta sentença proferida incorre em verdadeiro erro na apreciação da prova e, consequentemente, erro de julgamento.

  8. Por esse motivo deverá ser revogada, nos termos supra expostos.

    O DIREITO: 11. Da propugnada alteração da decisão sobre a matéria de facto resulta, necessariamente, a drástica modificação da decisão de mérito da causa.

  9. A matéria de facto considerada provada é suficiente e adequada para que se considere descaracterizado o acidente de trabalho em apreço nos presentes autos, e por via da aplicação do vertido no art. 14º n.º 1 da NLAT (Lei 98/2009, de 4 de Setembro) 13. Resulta incontroverso que o evento em apreços nos presentes autos se verificou no local e tempo de trabalho, e ainda que o mesmo constitui um acidente de trabalho, estando igualmente demonstrada a existência de nexo de causalidade entre o acidente e as lesões e sequelas de que a sinistrada ficou a padecer.

  10. Todavia, a Seguradora R. declinou a responsabilidade pela reparação do danos emergentes do acidente, considerando que o mesmo ocorreu por força da violação, sem causa justificativa, por parte do sinistrada, das condições de segurança estabelecidas pela entidade empregadora e/ ou previstas na lei, e pela negligência grosseria pela mesma protagonizada.

  11. Volvendo ao acidente que constitui a causa de pedir nos presente autos, temos que, por força da ora pugnada alteração da decisão quanto à matéria de facto...

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