Acórdão nº 656/13.4TBPNF.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelELSA PAIX
Data da Resolução17 de Setembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 656/13.4TBPNF.P2 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Paredes Acordam, em Conferência, as Juízas desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório No processo de impugnação judicial de decisão de autoridade administrativa nº 656/13.4TBPNF, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Paredes, foi submetida a julgamento a arguida B…, S.A., com sede na …, …, Penafiel, e proferida sentença com o seguinte dispositivo: Em conformidade e, em consequência, mantenho a condenação da arguida pela prática da contra-ordenação p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 12º e 18º, nº2, al. h) e nº4 do D.L. nº46/2008, de 12 de Março e da Portaria nº417/2008 de 11 de Junho, na coima de €15.000,00 (quinze mil euros).

Custas pela arguida, fixando-se a taxa de justiça em 3 Ucs.

Notifique.

Comunique à autoridade administrativa.

***Inconformada com tal condenação, a arguida recorreu para este Tribunal da Relação que, por acórdão de 05.02.2014, decidiu “julgar procedente o recurso interposto pela arguida B…, S.A., declarar nula a sentença recorrida, por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, e determinar ao Tribunal a quo que em nova sentença supra tal nulidade.” ***Foi proferida nova sentença com o seguinte dispositivo: Em conformidade e, em consequência, mantenho a condenação da arguida pela prática da contra-ordenação p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 12º e 18º, nº2, al. h) e nº4 do D.L. nº46/2008, de 12 de Março e da Portaria nº417/2008 de 11 de Junho, na coima de €15.000, 00 (quinze mil euros).

Custas pela arguida, fixando-se a taxa de justiça em 3 Ucs.

Notifique.

Comunique à autoridade administrativa.

*** Inconformada com tal condenação, a arguida recorreu para este Tribunal da Relação terminando a motivação com as seguintes conclusões: A- O Tribunal a quo não se pronunciou sobre o cúmulo jurídico, imposição legal, que a recorrente invocou em sede de impugnação, e que requereu em sede de defesa.

B - O Tribunal a quo ao não ordenar a agregação do presente processo de contra-ordenação aos outros dois que a Recorrente tinha a decorrer contra si, admitiu uma manifesta e inadmissível limitação das garantias de defesa da Arguida.

c - Termos em que, salvo melhor entendimento deve ser julgada nula a douta sentença recorrida, ou, caso assim não se entenda ser declarada irregular, por omissão de pronúncia.

D - No exercício da sua actividade profissional, no passado dia 13 de Novembro de 2008, pelas 16H40, o motorista da Recorrente foi incumbido de levar uma carga da obra de empreitada de "Construção da Via de Ligação VL 2-4 e beneficiação da Rua … e Concepção/Construção da reformulação da passagem superior ao caminho de ferro em …", em Vila Nova de Gaia, para a obra empreitada de "Execução de Infraestruturas de fibra óptica e passeios na Rua … - …", em Paredes, ambas a ser executadas pela Recorrente.

E - A carga de resíduos inertes transportada era constituída por terra e restos de tapete da estrada, não tóxicos, nem nocivos para o meio ambiente.

F - Ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, resultou da prova testemunhal produzida pela Recorrente, em sede de Defesa e de Impugnação Judicial, que a carga transportada pelo seu motorista era predominantemente constituída por terra, e residualmente por bocados de tapete betuminoso e bocados de cimento, o que tornava aquela carga ideal para ser reutilizada em enchimento de passeios e ruas.

G - A já falecida testemunha C…, Director Técnico da obra da Recorrente em …, depôs que essa obra necessitava de aterros nos passeios, e visto que na obra da Recorrente em …, Vila Nova de Gaia, se estava a escavar e era necessário dar vazadouro ao material escavado, nomeadamente terra e inertes.

H - A testemunha C… depôs nos autos que solicitou essa terra e inertes da obra de Coimbrões, para o enchimento de passeios na obra de … e em momento algum, encontrou entre a carga recebida RCD.

I - A testemunha D… depôs exercer as funções de encarregado na obra da Recorrente em …, Paredes, na qual recebia material proveniente de outras obras da Recorrente, nomeadamente da de Vila Nova de Gaia, e que entre esse material se contava saibro, misturado com pequenas quantidades de "tout venant" e pequenas pedras, ou seja material em condições de ser reaproveitado em obra, nomeadamente no enchimento de passeios.

J - A testemunha E…, motorista da Recorrente aquando do levantamento do auto-de-notícia, depôs, com precisão que a carga transportada era constituída por 20 toneladas de terra, misturada com pedaços de tapete betuminoso e de pedaços de cimento, proveniente de uma obra da Recorrente de demolição e renovação de estrada em …, Vila Nova de Gaia e se destinava ao enchimento de passeios e ruas na obra da Recorrente em …, Paredes.

K - A testemunha E… informou ter conhecimento da necessidade de se fazer acompanhar da guia de transporte de RCD quando transportava resíduos de construção para o F…, porém, visto tratar-se de transporte de terra e outros pequenos resíduos, entre duas obras da Recorrente, desconhecia ser necessário fazer-se acompanhar daquele género de guias.

L - Os depoimentos, isentos e esclarecidos, das mencionadas testemunhas, foram prestados em sede de Defesa e de Impugnação Judicial, e estão de acordo com a descrição da Guia de Transporte n.º ….. onde se refere a quantidade de terra transportada, e atestam que a Recorrente pretendia reciclar e valorizar a carga transportada, através da sua reutilização em obra, prevenindo a proliferação de resíduos e de danos para o meio ambiente, evitando a aquisição de novos materiais, em consonância com os princípios do Decreto-Lei n.º 46/2008, e que o Tribunal a quo menciona na douta sentença recorrida.

M - Quanto às fotografias juntas aos autos, as mesmas apenas reforçam o que a Recorrente entende e defende: que a carga transportada era constituída na sua quase totalidade por terra.

N - Porém, o Tribunal a quo limitou-se a considerar o depoimento do agente da autoridade que levantou o auto-de-notícia, ignorando o detalhe dos conhecimentos técnicos demonstrados pelas demais testemunhas nos seus depoimentos.

O - Resultou de forma inequívoca da prova produzida que a carga transportada foi reutilizada na obra licenciada da Recorrente em …, após uma triagem rigorosa, porquanto não se apurou nem se provou a insusceptibilidade de os materiais transportados serem reutilizados, bem pelo contrário, o que afasta a sua classificação como RCD's.

P - A Recorrente agiu em conformidade com o disposto no artigo 6º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-lei n.º 46/2008, de 12 de Março, que estipula no n.º 1 a obrigatoriedade de se reutilizar no trabalho de origem de construção, ampliação, alteração, reparação, conservação, reabilitação, limpeza e restauro, etc, ou noutra obra sujeita a licenciamento os solos e rochas que não contenham substâncias perigosas provenientes de actividades de construção.

Q - Errou o Tribunal a quo, ao considerar que uma carga predominantemente de terra, e uma quantidade residual de tapete betuminoso e cimento não podiam ser reutilizáveis em obra, porquanto a reutilização daqueles materiais em obra, nomeadamente, no enchimento de passeios, não é prática nociva para o meio ambiente.

R - Errou o Tribunal a quo ao dar como não provado o mencionado facto, estribando-se no argumento, manifestamente insuficiente, de que o percurso percorrido pelo motorista da Arguida era pouco utilizado, ainda que sobejamente explicado e objecto de prova.

5 - A Recorrente não preencheu nem deu instruções ao seu motorista para se fazer acompanhar de outra guia, porque a carga transportada não se tratava de ReD e destinavas a ser reutilizada em obra, pelo que não era necessário o preenchimento da guia a que se refere o auto de notícia, encontrando-se acautelados os bens jurídicos protegidos pela norma punitiva o meio ambiente, e o controlo de resíduos de construção.

T - Pela simples leitura dessa guia desde logo se constata, a mesma tem de ser assinada pelo destinatário dos resíduos, ou seja pelo responsável pelo depósito autorizado, pelo que sempre se encontraria incompleta.

U - A Recorrente, e nomeadamente o seu motorista, agiram sem consciência da ilicitude da sua conduta, pelo que nos termos do artigo 12º da Lei n.º 50/2006, agiu sem culpa, afastando a aplicação de qualquer sanção.

v - Caso assim se não entenda, o que só por mera questão de patrocínio se admite, deve ser aplicada à Recorrente uma mera admoestação, em substituição da coima em que foi condenada.

W - A simples troca de guia, não constitui falta tão grave que justifique a aplicação de uma sanção tão pesada, porquanto a Recorrente não retirou qualquer benefício económico da mesma, atenta a reduzida e desculpável gravidade da infracção e a inexistência de culpa, pode e deve ser proferida uma mera admoestação, nos termos do artigo 51º do Decreto-lei nº 433/82, de 27 de Outubro.

x - Errou o Tribunal a quo ao não aplicar à Recorrente uma mera admoestação, em substituição da aplicação da coima, que sempre se consideraria violar o princípio da proporcionalidade e da adequação, consagrados constitucionalmente.

Y - A coima que concretamente foi aplicada à Recorrente é manifestamente desproporcional à infracção concretamente cometida, em violação do princípio da proporcionalidade previsto no artigo 18º, n.º 2 da CRP.

Z - Deve existir um nexo de proporcionalidade entre a coima a aplicar e o dano causado e o benefício retirado do mesmo.

AA - Como resulta do exposto, e de toda a prova levada aos autos, não se apurou nem o dano para o bem protegido, meio ambiente, nem qual o benefício que a Recorrente retirou, ou visava retirar com a prática da infracção.

BB - "Qualquer sanção só cumpre eficazmente as suas finalidades de orientação de condutas de eliminação de infracções, quando há proporcionalidade entre a gravidade do facto e a sanção" - neste sentido, O. Mendes e S. Cabral, in RGCO, anotação ao artigo 182. CC -...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT