Acórdão nº 3321/12.6TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução01 de Julho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 3321/12.6 TDPRT.P1 Recurso de decisão instrutória Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 3321/12.6 TDPRT, corre, agora, termos pela Instância Central, 1.ª Secção de Instrução Criminal (J2), da Comarca do Porto, “B…, L.da”, pessoa colectiva n.º ………, com sede social na Rua …, …/…, da cidade do Porto, que requereu e foi admitida a intervir como assistente (despacho de admissão a fls. 341), não se conformando com o despacho de arquivamento (despacho a fls. 299 e segs.) com que o Ministério Público encerrou a fase de inquérito, requereu a abertura de instrução (requerimento a fls. 316 e segs.), no termo da qual foi proferida decisão instrutória de não pronúncia (fls. 369 e segs.) do arguido C….

Ainda irresignada, a assistente recorreu dessa decisão para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes conclusões (em transcrição integral): 1. “No despacho de pronúncia ou não pronúncia deve-se identificar concreta e correctamente o arguido.

  1. Ao indicar-se pessoa diversa do arguido nos autos existe NULIDADE.

  2. Assim violou-se o disposto na al. a do nº 3 do art. 283º do CPP.

  3. Os documentos quando não impugnados pelo arguido fazem prova plena do seu conteúdo.

  4. No despacho dito em 1) deve efectuar-se a indicação dos factos provados e não provados, bem como o respectivo exame crítico das provas devidamente fundamentado.

  5. Essa omissão viola pelo menos o disposto nos artgs. 374 nº2, 379 nº 1 e) do CPP e art.515 do CPC”.

*Admitido o recurso (despacho a fls. 408) e notificados os sujeitos processuais por ele afectados, quer o Ministério Público, quer o arguido apresentaram resposta à respectiva motivação, ambos concluindo pela sua improcedência.

*Ordenada a remessa dos autos ao tribunal de recurso, e já nesta instância, na intervenção a que alude o n.º 1 do art.º 416.º do Cód. Proc. Penal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer em que, considerando que, aquando da decisão instrutória, os autos não forneciam indícios suficientes da prática, pelo arguido, dos crimes que o assistente lhe imputa, entende que deve ser negado provimento ao recurso, mas que o Ministério Público deverá providenciar pela extracção de certidão de todo o processado para instauração de novo inquérito, “já que os elementos de prova supervenientemente carreados aos autos demandam a realização de novas diligências de investigação”.

*Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, com resposta do arguido a reafirmar as posições que expressou na resposta à motivação do recurso.

*Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II - Fundamentação O assistente pretende que o arguido seja pronunciado para ser submetido a julgamento pelos factos que enuncia no requerimento de abertura de instrução (RAI) e que, na sua perspectiva, preenchem a previsão das normas incriminadoras dos artigos 256.°, n.º 1, al. a), 205.°, n.º 4, al. a), e 258.º do Código Penal, configurando-se, assim, os crimes de falsificação de documento, abuso de confiança e falsificação de notação técnica.

São as conclusões pelo recorrente extraídas da motivação do recurso que, sintetizando as razões do pedido, recortam o thema decidendum (cfr. artigo 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, disponível em www.dgsi.pt/jstj) e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso.

Tal como acontece com o encerramento do inquérito[1], normalmente, a questão central do despacho que encerra a fase de instrução é a de saber se foram recolhidos indícios suficientes (pressuposto fundamental, quer da dedução de acusação, quer da prolação de despacho de pronúncia, pois, de contrário, terá de ser arquivado o inquérito e proferido despacho de não pronúncia) da existência de crime e, na afirmativa, quem foi o seu agente e se este é punível.

Lendo a motivação do recurso, facilmente se constata que nela se reproduz o conteúdo da denúncia e do RAI, o que, convenhamos, não é a melhor forma de pôr em crise uma decisão de não pronúncia.

Mas a recorrente, também, manifesta a sua discordância relativamente à análise e avaliação dos indícios recolhidos nas fases de inquérito e de instrução feita na decisão instrutória e, ainda que incipientemente, fundamenta essa divergência: sustenta que, devidamente ponderadas e conjugadas a prova documental que os autos contêm e a prova por declarações dos seus dois gerentes, teria de ser outra a conclusão sobre a suficiência dos indícios para uma decisão de pronúncia (“levam inevitavelmente à conclusão de fortíssima probabilidade de os crimes terem sido praticados e a fortíssima probabilidade de condenação do arguido”).

Aliás, a recorrente termina pedindo que, no provimento do recurso, seja o despacho recorrido substituído por despacho de pronúncia.

Daí poder dizer que a questão essencial a apreciar e decidir neste recurso seria a de ponderar se os indícios probatórios recolhidos nas fases preliminares do processo (inquérito e instrução) são de molde a justificar que se leve o arguido a julgamento pelos factos descritos no RAI e com o enquadramento jurídico-penal que a assistente lhes deu.

Porém, nada disso está reflectido nas conclusões do recurso.

Justificava-se, assim, um despacho convidando ao aperfeiçoamento (artigo 417.º, n.os 3 e 4, do Cód. Proc. Penal).

Porém, não foi essa a nossa opção pelas razões que adiante explicitaremos.

O que das conclusões do recurso decorre com meridiana clareza é que a recorrente argui a nulidade da decisão instrutória: - porque nela não está “concreta e correctamente” identificado o arguido e é indicada pessoa diversa deste; - porque a Sra. Juiz de instrução não considerou nenhum dos documentos que constam dos autos e por isso ocorreria omissão de pronúncia; - porque na decisão instrutória devia “efectuar-se a indicação dos factos provados e não provados, bem como o respectivo exame crítico das provas devidamente fundamentado” e a omissão dessa indicação “viola pelo menos o disposto nos artgs. 374 n.º 2, 379 n.º 1 c) do CPP e art. 515 do CPC” (conclusões V e VI).

É sobre essa arguição de nulidades que nos deteremos.

*A lei estabelece os parâmetros a que devem obedecer os actos processuais, designadamente as exigências de fundamentação dos actos decisórios.

Mas as exigências do cumprimento desse dever e as consequências da sua inobservância não são as mesmas para todos os actos decisórios: existe um regime geral (definido nos artigos 97.º e 118.º a 123.º do Cód. Proc. Penal) e regimes específicos para as sentenças (artigos 374.º e 379.º) e para os despachos que aplicam medidas de coacção (artigo 194.º do mesmo compêndio normativo).

A primeira arguição de nulidade da decisão instrutória alicerça-se na falta de identificação do arguido e na indicação de pessoa diversa deste.

Concretamente, o que terá suscitado a reacção da assistente foi o seguinte trecho da decisão instrutória: “quanto à...

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