Acórdão nº 353/14.3PBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Janeiro de 2015

Data21 Janeiro 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 353/14.3 PBMAI.P1 Recurso penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I – Relatório No âmbito do processo especial sumário que, sob o n.º 353/14.3 PBMAI, corria termos pelo 2.º Juízo de Competência Criminal do (entretanto extinto) Tribunal Judicial da Maia (e agora corre pela Secção Criminal da Instância Local de V.N. de Gaia, Comarca do Porto), B…, devidamente identificado nos autos, foi submetido a julgamento, acusado pelo Ministério Público da prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro.

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, foi proferida sentença escrita, datada de 20.06.2014 (fls. 56 e segs.) e depositada na mesma data, com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo a acusação provada e procedente e, em conformidade, condeno o arguido B… como autor de um crime de condução de veículo Sem Habilitação legal, p.p. pelo artº 3º, nº 1 e 2 do DL 2/98, de 2/01 na pena de 1 (um) ano de prisão efectiva”.

Inconformado, visando a revogação da decisão recorrida, o arguido interpôs recurso da sentença condenatória para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes “conclusões” (em transcrição integral): 1. “Não pode o recorrente conformar-se com o subscrito na douta sentença.

2. Não vislumbra o recorrente e com o devido respeito face aos factos dados como provados que haja sido condenado pela prática, como autor material de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. art. 3°, nº 2 do Decreto-Lei nº 2/98, de 03/01, na pena de 1 (um) ano de prisão efectiva.

3. Sob pena de comprometer o embasamento das diligências adotadas e seus resultados, cumpre afirmar que, não se questionando a verosimilhança das ilações retiradas de uma apreciação crítica das provas, tem-se como inadequada, face aos factos apurados, a medida da pena concretamente aplicada.

4. O dever de fundamentação de uma decisão só se cumpre quando esta contiver os elementos, que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos, constituíram o substrato racional que conduziu a que a convicção do Tribunal se formasse num sentido e não noutro.

5. Colocam-se em crise os termos em que se procedeu à determinação da medida concreta da pena.

6. No caso sub júdice e com o devido respeito não foram convenientemente valoradas pelo Tribunal a quo as circunstâncias que determinaram a pena aplicada, 7. concretamente a confissão integral e sem reservas, a respetiva inscrição e frequência numa escola de condução para posteriormente ser sujeito a exames na vertente teórica e prática que habilite definitivamente o recorrente com o título que lhe permita conduzir.

8. O recorrente encontra-se integrado socialmente, sendo o seu agregado familiar constituído pela sua companheira, três filhos menores e sogra, dedicando-se à venda ambulante.

9. A nível económico o recorrente e o seu agregado familiar sobrevivem com o auferido no âmbito do RCI, 350,00€ acrescido de 105,00€ pela prestação familiar a crianças e jovens, 10. montante este a que adiciona as quantias que recebe de um seu irmão a troco do trabalho que realiza com o mesmo nas feiras, 11. e que é um complemento importante às prestações sociais auferidas dada a situação restritiva em que o seu agregado familiar vive.

12. Assim sendo considera-se e com o devido respeito, estarem reunidas condições para aplicação de uma medida direccionada para formação e promoção de condições que habilitem o recorrente com título válido para conduzir.

13. Por tal considera-se e com o devido respeito, que a douta sentença devia ter determinado a suspensão da execução da pena de prisão efetiva em que o recorrente foi condenado, 14. mediante a imposição de deveres e regras de conduta, concretamente a obrigação do recorrente durante o período de suspensão habilitar-se com o título válido para conduzir 15. ou caso Vossas Excelências assim não o entendam e com o devido respeito, deve o recorrente cumprir a pena de prisão que lhe venha a ser fixada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, 16. a que desde já manifesta o consentimento para a aplicação da mesma, situação esta que lhe permitiria manter o contacto com o seu agregado familiar, principalmente com os descendentes com quem mantém uma forte relação de afeto e de quem habitualmente cuida.

17. Pelas expostas razões e reafirmando as elevadas qualidades de inteligência, cultura jurídica, sensatez e suficiente experiência da vida, da Mma. Juíza a quo, a limitação resultante da incontornável subjetividade da justiça, 18. impõe-nos a conclusão que se lamenta dum desrespeito da concordância prática dos valores em causa, valores imperativamente atendíveis por nenhuma sanção poder ser aplicada afora da teleologia especifica imanente do Direito Penal, 19. convergente com a regeneração pessoal e social do recorrente, o que afetou a ponderação de meio e fim ínsita no principio da proporcionalidade.

20. Ora tal não foi respeitado desequilibrando-se desrazoavelmente o princípio jurídicoconstitucional da proporcionalidade entre a conduta e a consequente determinação do cumprimento da pena de prisão efetiva em que o recorrente foi condenado, 21. que um outro igualmente ponderoso da igualdade de todos perante a Lei também impõe, 22. pela circunstância decorrente da personalidade do recorrente e do justificativo racional que esta oferecia para as condutas imputadas.

23. São os inpunts referidos por Max Weber que não inquinam pela compreensão que merecem mas afetam pela injustiça que possibilitam é contra esta que se protesta, nesta vertente da violação dos aludidos princípios jurídico-constitucionais da igualdade, da proporcionalidade e do exercício do contraditório de todos perante a lei.

24. Pelo exposto, tem-se como excessiva a pena em que foi condenado pela prática, como autor material de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3°, nº 2 do Decreto-Lei nº 2/98, de 3/01, na pena de 1 (um) ano de prisão efetiva, bem como, foram violados os princípios da proporcionalidade, igualdade e garantias de defesa, estatuídos nos artigos 13º, 18º e 32º da Constituição da República Portuguesa.

25. Por tal, foram violados, o art. 3°, nº 2 do Decreto-Lei nº 2/98, de 03/01 e os artigos 40°, 70º e 71° do Código Penal e 13°, 18° e 32° da Constituição da República Portuguesa”.

*Admitido o recurso (despacho a fls. 75) e notificado o Ministério Público, veio este responder à respectiva motivação (fls. 78 e segs.), concluindo que deve ser-lhe negado provimento e mantida a decisão recorrida.

*Ordenada a subida dos autos ao tribunal de recurso, já nesta instância, na intervenção a que alude o n.º 1 do art.º 416.º do Cód. Proc. Penal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer em que, sufragando a posição assumida na resposta do Ministério Público na primeira instância, considera a pena imposta “proporcional, justa e adequada ao fim visado com a aplicação da pena concreta fixada” e pronunciou-se pela improcedência do recurso.

*Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, sem resposta do recorrente.

*Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência e, realizada esta, cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação São as conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.º, n.º 1, e 417.º, n.º 3, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj)[1] e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso.

Embora o recorrente comece por afirmar que “a decisão agora impugnada não consubstancia uma opção justa e correta em sede de apreciação e valoração da prova e se afasta do melhor enquadramento jurídico dos pressupostos fácticos sobre que assenta”, certo é que não impugna a decisão sobre matéria de facto nem questiona a sua condenação pelo crime de que estava acusado.

O seu inconformismo tem por alvo a pena que lhe foi aplicada e se o recorrente remata a motivação do seu recurso dizendo ser “excessiva a pena em que foi condenado” (conclusão 20.ª), a verdade é que se insurge, sobretudo, contra a espécie de pena aplicada. Melhor dizendo, o recorrente não questiona a opção do tribunal pela pena de prisão, mas entende que se justificava a sua substituição pela medida de suspensão da execução da pena, ainda que condicionada, ou a sua execução em regime de permanência na habitação.

As questões a apreciar e decidir são, pois, as seguintes: ● se na determinação da pena foram respeitados os critérios legais aplicáveis; ● se estão reunidos no caso os requisitos da aplicação de uma pena de substituição, designadamente a suspensão da execução da pena de prisão ou a sua execução em regime de permanência na habitação.

*Identificado o objecto do recurso, para uma...

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