Acórdão nº 3508/13.4T2OVR-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução12 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 3508/13.4T2OVR-A.P1 Sumário da decisão: I. Da conjugação do disposto nos artigos 876.º e 877.º do CPC resulta imperativamente a existência de dois momentos no processo executivo de prestação de facto negativo: a verificação pericial; e o reconhecimento (ou não) pelo juiz da falta de cumprimento da obrigação (de non facere) do executado.

  1. Revela-se susceptível de causar alguma perturbação interpretativa a expressão “pode requerer”, inserta no n.º 1 do artigo 876.º do Código de Processo Civil.

  2. Deverá, no entanto, entender-se, que o credor exequente que pretenda, coercivamente, por via executiva, pôr termo à violação da obrigação, quando esta tenha por objecto um facto negativo, terá obrigatoriamente, no requerimento executivo, de requerer a verificação da violação por meio de perícia.

  3. Com efeito, a expressão verbal “pode”, que traduz normalmente a atribuição de uma faculdade, e não a fixação de um imperativo (traduzido na expressão: “deve”), refere-se in casu à faculdade que é conferida ao credor munido de um título executivo no qual se consubstancia a obrigação de non facere do devedor (executado), de requerer: que a violação da obrigação seja verificada pericialmente; que o juiz ordene: a) a demolição da obra que eventualmente tenha sido feita; b) a indemnização do exequente pelo prejuízo sofrido; e c) o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória.

  4. Tais providências têm como pressuposto óbvio e necessário, a verificação da violação, que terá que ser requerida com base em prova pericial.

  5. Em suma, o credor munido do título pode requerer ao juiz, no caso de violação da obrigação que tenha por objecto um facto negativo: que a violação da obrigação seja verificada por meio de perícia; e que sejam decretadas as providências enunciadas nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 876.º do CPC. Optando por requerer a diligência de demolição, terá necessariamente que requerer a prévia verificação pericial da violação da obrigação.

    *Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Relatório Correu termos no 2.º Juízo Cível do Tribunal da Comarca do Baixo Vouga a acção com processo sumário n.º 1009/03.8TBETR, instaurada por B…, contra C… e D…, no âmbito da qual, em 9 de Fevereiro de 2004, as partes celebraram transacção judicial com o seguinte teor: «1.º O A. reconhece que, nesta data, o barraco a que faz referência na p.i. não se encontra encostado ao muro que ladeia a sua casa, sua pertença, nem está a ser utilizada a parede desse muro virada para o terreno dos réus.

    1. Por sua vez, os réus comprometem-se a, no futuro, não fazerem qualquer utilização na parede do referido muro, nomeadamente não instalando currais de animais junto à referida parede.

    2. Custas a meias.».

      Em 12 de Novembro de 2013, B… instaurou contra C… acção executiva para prestação de facto, alegando no requerimento executivo: 1º.) Por douta Sentença homologatória de 9.02.2004, transitada em julgado em 19.02.2004 do 2º. Juízo do então Tribunal Judicial da Comarca de Estarreja - Processo 1009-03.8TBETR, os aqui executados C… e D… foram condenados a não fazerem qualquer utilização da parede do referido muro ( muro propriedade do exequente que ladeia a sua casa e que está virado para o terreno dos aqui executados), nomeadamente não instalando currais de animais junto à referida parede (…).

    3. ) Sucede que os executados, ao arrepio da douta sentença, passaram a utilizar o muro do exequente e sem autorização e contra a vontade do exequentes.

    4. ) Com efeito, os executados construíram um barracão de tijolo e cimento, no seu quintal mas encostado ao muro do exequente, utilizando a parede do exequente, obra essa que se mantém, apesar da sentença condenatória expressamente condenar os executados a não fazerem qualquer utilização da parede do referido muro.

    5. ) Por outro lado, os executados plantaram várias videiras, completamente encostadas à parede do mesmo muro do exequente, videiras essas que foram trepando ao longo da parede e passaram para o terreno do exequente, caindo de forma avultada, até ao chão do quintal do exequente, também neste caso, com uma utilização totalmente abusiva do muro do exequente e até de parte do seu terreno, o que tem por consequência a ocorrência de danos na rede que o exequente colocou no muro bem como a existência de muitos bichos como abelhas e aranhas (que se alimentam das uvas) e muito lixo que vai caindo das videiras, como folhas e paus, tudo para o quintal do exequente, impossibilitando a sua utilização, nessa parte 5º.) Por varias vezes o exequente contactou os executados no sentido destes cumprirem a decisão judicial e assim demolirem o barracão e cortarem as videiras mas ate ao presente nada foi feito 6º.) Para a realização de demolição do barracão e a retirada das videiras, é suficiente o prazo de 15 dias 7º.) O exequente entende ser suficiente o valor de € 7.000,00 para a demolição do barracão e a retirada das videiras e respectivo entulho, de forma a deixar o seu muro livre e desocupado, conforme a decisão judicial 8º.) Ao abrigo do disposto no artigo 868º. n.º 1 e 874 o exequente pode requerer a aplicação da sanção pecuniária compulsória pelo período de tempo de incumprimento pelos executados.

    6. ) Deixando ao prudente arbítrio de V.Exa a fixação da mesma sugerindo-se o valor diário de € 100,00 Nestes termos, após citação dos executados deve ser fixado em 15 dias o prazo para a prestação do facto a que foram condenados, com a sanção pecuniária compulsória de € 100,00 por cada dia após esse prazo sem que a prestação de facto se encontra cumprida.».

      A executada C… deduziu oposição por embargos, alegando: «1º A presente execução para prestação de facto foi instaurada com base em sentença judicial.

    7. Sendo esse o título executivo.

    8. Ora, no nº 1 do aludido título refere-se expressamente que “O A. reconhece que, nesta data, o barraco a que faz referência na p.i., não se encontra encostado ao muro que ladeia a sua casa, sua pertença, nem está a ser utilizada a parede desse muro virada para o terreno dos réus.”.

    9. No nº 2 pode ler-se que “Por sua vez, os réus comprometem-se a, de futuro, não fazerem qualquer uso da parede do referido muro, nomeadamente não instalando currais de animais junto à referida parede,” 5º A ora executada cumpre escrupulosamente o acordo homologado por sentença.

    10. Com efeito, a aqui Executada não faz, nem nunca fez, qualquer utilização do muro do Exequente, conforme se alcança das fotografias que aqui se juntam como documentos nºs 1, 2 e 3.

    11. Sendo, por isso falso o alegado em 2º e 3º pelo Exequente.

    12. Por sua vez o alegado em 4º, no...

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