Acórdão nº 9/13.4GCFLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelNETO DE MOURA
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 9/13.4 GCFLG.P1 Recurso Penal Relator: Neto de Moura Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto I - Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 9/13.4 GCFLG, corria termos pelo 2.º Juízo de Competência Criminal do (entretanto extinto) Tribunal Judicial de Paredes (agora, Secção Criminal da Instância Local de Paredes, Comarca do Porto Este), mediante acusação do Ministério Público que lhe imputou a prática, em autoria material, de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições previsto e punível pelo artigo 353.º do Código Penal, foi B… submetido a julgamento em tribunal singular.

Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, foi proferida sentença datada de 02.05.2014 (fls. 163 e segs.) e depositada na mesma data, com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decide-se condenar o arguido B… pela prática de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. pelo artigo 353º do Código Penal, na pena de 5 (cinco) meses de prisão, a cumprir em dias livres durante 30 (trinta) períodos de 39 (trinta e nove horas) cada um, com início às 21 horas de Sexta-feira e termo às 12 horas do Domingo seguinte”.

Inconformado, almejando a sua absolvição, o arguido interpôs recurso da decisão condenatória para este Tribunal da Relação com os fundamentos explanados na respectiva motivação que “condensou” nas seguintes “conclusões” (em transcrição integral): 1. No dia 18.04.2013, encontrando-se para tanto proibido por determinação de Sentença penal, a título de pena acessória, o Recorrente foi intercetado a conduzir veículo a motor.

2.Desde logo em sede de Contestação, e posteriormente em audiência de julgamento, o Recorrente alegou (e provou) as circunstâncias determinantes da sua atuação.

3. Alegou, com efeito, que naquele dia 18.04.2013 se encontrava no seu local de trabalho (empresa C…, localizada na Rua…, …, no concelho de Paços de Ferreira) e que o seu pai lhe telefonou a pedir auxílio porque estava a ter mais uma "crise de rins".

4. Perante a aflição do pai, e na impossibilidade de contactar o seu irmão, dirigiu-se ao parque de estacionamento da empresa, entrou num dos veículos que aí se encontravam, e dirigia-se para casa do seu pai, para lhe prestar auxílio, quando foi intercetado pela GNR.

5. Nenhuma destas circunstâncias foi dada como provada na sentença condenatória, com a qual o Arguido não pode conformar-se. Desde logo, com o julgamento da matéria de facto, por manifesta a incongruência de tal decisão com a prova produzida.

Contudo, 6. Revela-se evidente a Nulidade da Sentença do Tribunal a quo.

7. Desde logo, porque não cumpre a exigência normativa ínsita no n.º 2 do artigo 374.º do CPP, do qual se retira que a fundamentação da Sentença penal é composta por dois grandes segmentos: a enumeração dos factos provados e não provados e a; exposição completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para a formação da convicção do julgador.

8. Na Sentença de que se recorre não é possível encontrar nem qualquer exame crítico da prova nem, por outro lado, é alcançável o processo racional, lógico e reflexivo da formação da convicção do Tribunal a quo.

9. Limita-se o Tribunal a quo ora a fazer juízos conclusivos (o que faz relativamente às testemunhas D… e E…), ora a omitir por completo a apreciação de prova produzida (o que faz quanto às demais testemunhas, pois mesmo em relação à testemunha F…, embora a mencione, não faz qualquer exame crítico ao seu depoimento).

10. A exigência normativa de fundamentação (ínsita no artigo 374.º, n.º 2 do CPP e elevada a princípio constitucional - artigo 205.º da CRP) cumpre-se quando os destinatários da Sentença sabem o porquê da decisão, quando lhes é disponibilizada, de forma clara, a razão de ser da formação da convicção do Tribunal.

11. A inexistência, que se constata na Sentença de que se recorre, de suficiente justificação da decisão sobre a matéria de facto, para além de impedir o Recorrente de conhecer a concreta apreciação da prova feita pelo Tribunal a quo, também veda ao Tribunal superior a possibilidade de reapreciar a decisão sobre a matéria de facto, pois também nessa sede seria necessário conhecer o que motivou a decisão.

12. A Sentença de que se recorre é omissa na exposição dos motivos e dos cânones valorativos prosseguidos, pelo que não há como não a considerar arbitrária, com gritante extrapolação da liberdade de apreciação da prova atribuída ao Tribunal a quo pelo artigo 127.º do CPP.

13. A deficiente justificação, consubstanciada na falta de exame crítico da prova (exigido pelo artigo 374.º, n.º 2 do CPP), gera a nulidade da Sentença em crise, nos termos do artigo 379.º, n.? 1 a) do CPP, impondo-se a substituição da Sentença por outra que, se necessário com a repetição da prova, colmate as lacunas vindas de constatar.

Por outro lado, 14. O Tribunal a quo socorre-se do Relatório Social para relacionar uma das conclusões nele constantes com a "postura" (sendo que se desconhece em que consiste tal "postura") das testemunhas E… e E….

15. O Relatório Social visa a personalidade do Arguido e os factos relativos à sua pessoa, a avaliar em sede (e apenas) da determinação da pena concreta a aplicar, não se traduzindo numa prova que possa ser valorada para aferir da credibilidade de depoimentos prestados, não tem por objeto os factos imputados ao Arguido, nem é uma prova produzida e examinada em audiência.

16. Ao valorar o Relatório Social como prova (no caso, de forma incompreensível, para descredibilizar depoimentos de testemunhas!), sem que o mesmo constitua prova produzida e examinada em audiência, verifica-se a violação de uma proibição de prova, nos termos do artigo 355.º do CPP, situação que determina a nulidade da decisão.

De igual sorte, 17. A valoração feita na decisão recorrida da informação do IMT junta a fls. 9 é proibida, quer porque se trata de um documento não produzido nem examinado em audiência, quer porque os factos que lhe subjazem não se incluem no objeto dos autos.

18. A valoração daquele documento leva a concluir que concorreram para a condenação do Arguido factos que não constam da Acusação e que, como tal, extravasam o objeto do processo, o que por si só acarreta a nulidade da Sentença, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP.

19. A Sentença sob censura é, pois, nula: - Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, por violação da exigência normativa ínsita no n.º 2 do artigo 374.º do CPP: exposição dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram de base para a convicção do Tribunal; - Nos termos da alínea b), do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, porquanto concorreram para a condenação do Arguido factos não constantes da Acusação e como tal excluídos do objecto do processo; - Nos termos da alínea e), in fine, do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, na medida em que, por se apoiar em provas cuja valoração a lei proíbe - Relatório Social e Informação do IMT a fls. 9, provas não produzidas nem examinadas em audiência (artigo 355.º do CPP) -, conclui-se que o Tribunal conheceu de questões de que não poderia conhecer.

Sem prescindir, 20. Não se conforma o Recorrente com a decisão sobre a matéria de facto por ser manifesto que o Tribunal a quo se alheou por completo da prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, ao dar como provado que o Arguido ''Agiu de forma voluntária, livre e consciente, com o propósito de violar tal proibição, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei". - vide ponto 6 da matéria de facto dada como provada, Assim como, 21. Ao fazer constar da matéria de facto não provada que: "1. No dia 18 de Abril de 2013 o pai do arguido lhe telefonou porque estava a ter mais uma "crise de rins"; 2. Que perante a aflição do seu pai o arguido, sem pensar, entrou num dos veículos da empresa que se encontrava estacionado no parque da mesma e dirigiu-se para casa daquele, situada a pouca distância." Com efeito, 22. Satisfazendo a exigência normativa do artigo 412.º, n.º 3 alínea a) do CPP, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto concretamente quanto aos pontos 6 da matéria de facto dada como provada e 1 e 2 da matéria de facto dada como não provada, Porquanto, 23. Resulta necessariamente decisão diversa da seguinte prova: Declarações prestadas pelo Arguido na sessão de julgamento realizada no dia 27.03.2014, que não mereceram qualquer juízo valorativo, pelo menos alcançável, como se impunha, pela leitura da Sentença, em que o Recorrente apresentou, de forma consistente, lógica e coerente, a sua versão dos factos, apontada nos artigos 3.º e 4.º das presentes conclusões; Depoimento da testemunha D…, prestado no dia 27.03.2014 [início gravação 15:34:08 - fim gravação 15:39:08], que veio confirmar as circunstâncias em que ocorreram os factos; Depoimento de G… [prestado no dia 27.05.2014 - início gravação 15:42:14 - fim gravação 15:46:17], por seu turno, para além de prestar depoimento acerca da personalidade do Recorrente, veio, em consonância com o que já este havia dito, afirmar que durante o período em que o Recorrente se encontrou proibido de conduzir, era ele que o transportava de … para Paços de Ferreira; Depoimento de E… [27.03.2014 - início gravação 15:46:18 - fim gravação - 15:51:20], irmão do Recorrente, cujo depoimento, que o Tribunal a quo reputa de constrangido, confirma, de forma lacónica mas consistente e coerente, as circunstâncias dos factos imputados ao Recorrente Depoimento de F… [31.03.2014 - início gravação 14:29:35 - fim gravação - 14:35:53], Militar da GNR que intercetou e fiscalizou o Recorrente no dia 18.04.2013, e que veio afirmar que o Recorrente lhe referiu que "tinha o pai doente", situação que mereceu acolhimento por esta testemunha que, pedindo-lhe os elementos de identificação (sem que o...

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