Acórdão nº 551/13.7TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Data da Resolução26 de Março de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso de Apelação Processo n.º 551/13.7TVPRT.P1 [Comarca do Porto/Instância Central do Porto/Cível] Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, S.A., NIF ………, com sede no …, …, Guimarães, instaurou nas Varas Cíveis do Porto acção judicial contra C… – Companhia de Seguros de Crédito, S.A., NIF ………, com sede na Rua …, Porto, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de €80.203,72, acrescida dos respectivos juros calculados à taxa legal contados desde a data da citação e até efectivo pagamento.

Para o efeito, alegou que celebrou com a ré um contrato de seguro de créditos, o qual abrangia designadamente os respectivos créditos sobre o seu cliente D…, S.A., ao qual a autora forneceu diversas mercadorias alimentares. Entre 17.09.2010 e 23.11.2010 a autora forneceu a este cliente mercadorias tituladas pelas facturas que apresenta e cujo valor ascende ao total de €100.254,65, montante que não foi pago pelo cliente na data prevista. Em 09.12.2010 a autora comunicou à ré a suspensão dos pagamentos do mencionado cliente, sendo que este veio posteriormente a ser declarado insolvente, apesar do que a ré se recusa a pagar o valor do crédito comunicado.

A acção foi contestada pela ré que reclama a improcedência total do pedido, mediante a alegação de que a autora prestou falsas declarações à ré quanto ao montante do seu crédito, pois na data da comunicação da ameaça de sinistro o seu crédito sobre aquele seu cliente ascendia não a €100.254,65 mas, pelo menos, a €210.014,65. A alegação da autora de que não comunicou o restante crédito sobre o cliente porque as demais facturas já estavam fora de prazo previsto contratualmente para a respectiva participação importa uma violação da obrigação da autora de comunicar a ameaça de sinistro, informando a ré do montante global do seu crédito sobre o cliente, assim fornecendo os elementos necessários à ré para analisar as condições de cobertura do crédito no âmbito do contrato celebrado. Os créditos cobertos pelo contrato de seguro são todos os créditos que se constituam na vigência da apólice, sendo absolutamente indispensável para o funcionamento do contrato de seguro de crédito, conhecerem-se todos os créditos do segurado sobre o seu cliente para se verificar não só a data da verificação do sinistro nos termos do artigo 7.º n.º1 das Condições gerais, mas também o âmbito da cobertura do contrato. Apesar dos pedidos da ré a autora não forneceu as informações que lhe foram pedidas designadamente no tocante às facturas cujo valor deveria ser pago pelas letras de câmbio aceites e pelo cheque emitido pelo cliente. Nos termos do artigo 11.º n.º 2 das Condições Gerais, caducou o direito da autora à indemnização contratual uma vez que a autora não comunicou os elementos necessários à identificação do crédito seguro ou à comprovação da ocorrência do risco e ou da verificação do sinistro, nos seis meses subsequente à notificação da ré para esse efeito. A ser devida qualquer indemnização haverá que descontar o valor da franquia prevista no contrato e bem assim o valor do IVA que se encontra excluído do contrato.

Após audiência de julgamento, foi proferida sentença julgando a acção improcedente e absolvendo a ré do pedido.

Do assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: I – Os factos alegados pela recorrida sob art.ºs 19.º, 20.º, 24.º, 25.º, 26.º, 31.º e 35.º da contestação, são contraditórios e contrariados com a documentação junta e os depoimentos prestados pelas testemunhas E… e F… indicadas pelos recorrida; II – Outrossim, os pontos infra identificados sob os n.ºs 2.º, 25.º, 28.º, 29.º e 31.º da petição inicial dos foram incorrectamente julgados como não provados, de toda a documentação junta, mormente, os documentos juntos pela recorrente sob o n.º 26, a certidão emitida em 08/09/2011 em que consta que os valores de crédito sobre a dita devedora insolvente, reclamados e reconhecidos, não haviam sido pagos, e o depoimento testemunha indicada pela recorrida E…; III – Pelo que devem ser julgados não provados os factos alegados sob os art.ºs 19.º, 20.º, 24.º, 25.º, 26.º, 31.º e 35.º da contestação e os art.ºs 2.º, 25.º, 28.º,29.º e 31.º da petição inicial julgados provados; IV – A recorrente invocou e provou ter feito fornecimentos, cobertos pelo contrato de seguro que outorgou com a recorrida no valor de 100.254,65€, à entretanto declarada insolvente D…, S.A. que constituíram um sinistro nos termos da apólice; V – Inversamente, a recorrida não invocou na contestação ter ocorrido falta de pagamento pela dita D…, SA de qualquer outro fornecimento ou prestação de serviço, anterior ou posterior, àquele que constituiu a comunicação da ameaça de sinistro efectuada pela recorrente; VI – Sem alegar tratarem-se de vendas e prestações de serviços, a recorrida fundou o direito a exonerar-se de efectuar o pagamento da indemnização apenas e só na falta de prestação de esclarecimentos sobre um valor em dívida constante de uma reclamação de créditos feita pela recorrente com base em letras de câmbio e cheques, isto é títulos de crédito; VII – Pelo que, incorreu em erro de julgamento o segmento da sentença que considerou que o sinistro é de valor montante muito superior (mais do dobro), e bem assim que tal sinistro corresponde ao valor reclamado e reconhecido no processo de insolvência e a obrigação de fazer outras comunicações para além das efectuadas pela recorrente; VIII – Face à prova produzida e à matéria dada como assente, a recorrente tem direito a, contratualmente, receber da recorrida as quantias peticionadas a título de seguro de crédito contratado com esta e por vendas àquela efectuadas de que não recebeu o respectivo preço; IX – Sendo certo que, tal sinistro no valor de €100.254,65 foi regular e atempadamente comunicados à recorrida, comunicou em 09/12/2010 à recorrida a “ameaça de sinistro”, e na qual comunicou a suspensão dos pagamentos do mencionado cliente “D…, S.A.” e sob o art.º 30.º alegou que, “declarada a insolvência da mencionada cliente em 28-03-2011, foi formalizada a participação do sinistro à Ré, relativamente às facturas em que havia manifestado a dita ameaça de sinistro”; X – Facto amplamente confirmado pelos documentos e testemunhas indicadas pela recorrida E… e F… nos depoimentos supra identificados e transcritos; XI – Tanto mais que a recorrente deu integral cumprimento ao art.º 5.º, ponto II, al a) das CGA remetendo toda a documentação referente ao sinistro, isto é, de todos os documentos que titulem o crédito e ainda os de expedição e recepção dos bens transaccionados para o mercados externo; XII – Assim, o Mm.º Juiz “a quo” decidiu pela improcedência da acção essencialmente por ter considerado a recorrida não esclareceu as divergências ocorridas entre o valor da participação de sinistro e o valor da reclamação de crédito, incorrendo em erro de julgamento; XIII – Salvo devido respeito, andou mal o Mm.º Juiz “a quo” decidiu os presentes autos referindo que existe o direito à exoneração porque “a autora não esclareceu tais divergências no prazo contratualmente fixado (mesmo após prorrogações)”.

XIV – Ora, a mera falta de esclarecimento de alguma questão pela recorrente sobre o valor do crédito – o que não se concebe, nem concede e apenas se admite por mero raciocínio académico – não é causa de exoneração; XV – Na verdade, nos termos do n.º 1, do art.º 11.º das clª gerais, para o esclarecimento de questões relacionadas com os registo contabilísticos – como seria o caso da data de emissão de facturas, confirmação de contas correntes, ou outros dados relativamente à relação com o devedor – é concedido o direito à recorrida de aceder à contabilidade da recorrente, o que a recorrida não alegou nem provou; XVI – Provada que foi pela recorrente a existência do contrato de seguro de crédito válido, da ocorrência de um determinado sinistro e a sua tempestiva comunicação, nos termos do disposto no art.º 342.º do C.C., a alegação e prova de factos que a exonerassem do pagamento da indemnização contratualmente fixada incumbia à recorrida, por se tratar de um facto impeditivo do direito recorrente; XVII – Como bem refere a sentença, os contratos de seguro – nos termos dos art.ºs 426.º e 427.º do C. Com – são regulados pelas estipulações constantes da apólice que não sejam proibidas por lei, devendo os mesmos ser pontualmente cumpridos; XIX – Com efeito, ao abrigo das referidas normas e nos termos dos art.ºs 1.º, 2.º, 3.º e 5.º da C. Gerais, é devida a indemnização à recorrente pela recorrida, não havendo fundamento para a exoneração da recorrida no seu pagamento; XX – Assim, a sentença recorrida violou os termos da apólice bem assim, para além de outros, o disposto nos art.ºs 426.º e 427.º do C. Com, 342.º e 409.º do Código Civil.

A recorrida respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.

Após os vistos legais, cumpre decidir.

  1. Questões a decidir: As conclusões das alegações de recurso demandam deste Tribunal que resolva as seguintes questões: i) Se a decisão da matéria de facto deve ser alterada relativamente aos pontos concretos indicados pela recorrente; ii) Se a autora estava obrigada a fornecer a informação pedida pela ré relativamente a fornecimentos anteriores aos mencionados na comunicação da ameaça de sinistro; iii) Qual a consequência do não fornecimento dessa informação; iv) Que decisão deve ser proferida em relação ao pedido da autora em função dessa consequência.

  2. Da impugnação da decisão da matéria de facto: O artigo 640.º do novo Código de Processo Civil estabelece que, querendo impugnar a decisão da matéria de facto, o recorrente tem de especificar, obrigatoriamente e sob pena de imediata rejeição do recurso nessa parte, os seguintes aspectos: os concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que na óptica dos...

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