Acórdão nº 172/13.4TBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Setembro de 2015

Data14 Setembro 2015
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 172/13.4TBMAI.P1-Apelação Origem: Comarca do Porto-Póvoa de Varzim-Inst. Central-2ª Secção Cível-J1 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Rita Romeira 2º Adjunto Des. Caimoto Jácome Sumário: I- O tomador do seguro está obrigado, antes da celebração do contrato, a declarar com exactidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para apreciação do risco pelo segurador, ainda que as mesmas não sejam solicitadas em questionário fornecido pelo segurador-art. 24º, nºs 1 e 2, do novo regime jurídico do contrato de seguro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril (LCS).

II- O cumprimento do dever de declaração do risco não se esgota no preenchimento do eventual questionário que acompanha a proposta ou com a entrega desta. Ele acompanha toda a fase de formação do contrato e o seu cumprimento terá de aferir-se pelas circunstâncias que venham ao conhecimento do proponente até à conclusão do contrato.

III- Contrariamente ao que sucedia com o revogado artigo 429.º do Código Comercial, só o comportamento doloso do segurado conduz à anulabilidade do contrato, como decorre inequivocamente do nº 1 do art. 25º da LCS.

IV – Para a anulabilidade do contrato de seguro prevista no art. 25º, nº 1, da LCS não é exigível a omissão ou a declaração inexacta susceptíveis de influenciar a seguradora na decisão de contratar, tal apenas acontece para as omissões ou inexactidões negligentes [artigo 26.º, nº 4 al. b) da LCS].

I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B…, mulher C…, residentes na …, .., .º Esquerdo, Maia intentaram a presente acção declarativa com processo ordinário contra D…, S.A., com sede na Rua …, .., pedindo a sua condenação no pagamento da quantia € 123.572,96 actualizando-se tal importância à data em que for proferida a sentença, bem como a pagar-lhes a quantia correspondente aos montantes despendidos e entretanto efectuados a título de pagamento do prémio de seguro a título de estorno.

Alegam, em resumo, tendo celebrado com a Ré um contrato de seguro de vida crédito à habitação cujo objectivo era garantir o pagamento do crédito à habitação, caso ocorresse algum risco que impedisse a sua capacidade de ganho.

Acontece que, tendo a segurada Autora, em meados do ano de 2010, já depois da celebração sido acometida de uma invalidez absoluta e definitiva para o exercício da sua profissão, a Ré declinou a sua responsabilidade alegando “incumprimento nas declarações de saúde prestadas”.

*Devidamente citada, a Ré contestou invocando a anulabilidade do contrato de seguro objecto da acção por terem sido prestadas declarações inexactas, pugnando, assim, pela improcedência da acção.

*Foi requerida a intervenção do E…, S.A. e F…, Lda e, admitidas, apenas esta última veio contestar, concluindo pela improcedência da acção.

*Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.

*A final foi proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a presente acção e consequentemente improcedente e consequentemente absolver a Ré D…, S.A., e os intervenientes, E…, S.A. e F…, Lda., do pedido.

*Não se conformando com o assim decidido vieram os Autores interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: 1º Os recorrentes celebraram com a Ré D…, S.A., em 7 de Agosto de 2009, um contrato de seguro de vida crédito à habitação.

  1. O intermediário deste contrato de seguro foi o Sr. G…, mediador de seguros da empresa F…, Lda., entidade responsável de fornecer todas as informações aos aqui recorrentes.

  2. Este seguro visava garantir o pagamento do crédito à habitação, caso ocorresse algum risco que impedisse a capacidade de ganho dos recorrentes.

  3. A recorrente C… em meados do ano de 2010 foi acometida de uma invalidez absoluta e definitiva por doença, padecendo de retina diabética, a qual constituiu uma doença irreversível, que lhe provoca cegueira.

  4. Ficou totalmente incapacitada para o exercício da sua actividade profissional de motorista de pesados, que até então desempenhava.

  5. Tendo-lhe sido atribuída um grau de incapacidade parcial de multiuso de 89,8 %, desde 11 de Novembro de 2011.

  6. Encontra-se de forma permanente e definitiva incapaz para o exercício de qualquer profissão, necessitando do apoio de terceira pessoa.

  7. Por via dessa inaptidão, ficou a recorrente de imediato reformada por incapacidade absoluta e definitiva com referência a 26 de Maio de 2011, pelo valor € 303,23 (trezentos e três euros e vinte e três cêntimos).

  8. Participada a situação à Ré D…, S.A., esta declinou a sua responsabilidade alegando “incumprimento nas declarações de saúde prestadas” e “prestou declarações inexactas nomeadamente relativas à patologia”.

  9. Ora a recorrente é diabética há mais de 20 anos, todavia apenas toma insulina desde o ano de 2011, sendo que aquando da subscrição do seguro, apenas controlava a doença com a toma diária de comprimidos, situação que nunca omitiu ao seu mediador de seguros, Sr. G….

  10. Alias o próprio G…, refere nunca ter perguntado directamente à recorrente se padecia de diabetes.

  11. Como pode prestar declarações inexactas, se nunca lhe foi perguntado se tinha diabetes! 12º O próprio questionário não faz qualquer pergunta a esse respeito.

  12. A recorrente respondeu com absoluta verdade às questões da proposta de seguro, nunca sendo advertida que as informações deveriam ser mais o completas possível.

  13. Nunca o Sr. G… a alertou para esse facto, aliás foi o próprio que preencheu os questionários, sendo que durante o preenchimento dos mesmos, nunca a recorrente omitiu ser portadora de diabetes, por ser tratar de uma doença não limitativa do exercício da sua actividade.

  14. A recorrente exercia uma actividade profissional, considerando-se uma pessoa saudável, desconhecendo em absoluto ser portadora de qualquer problema a nível visual, sendo que tal patologia, imprevisível, se veio a manifestar mais tarde.

  15. A seguradora declinou pagar o prémio à recorrente de forma abusiva, pois esta não omitiu qualquer informação, confiando que os esclarecimentos prestados pelo intermediário G… eram fidedignos.

  16. O tribunal a quo não logrou esclarecer a existência de duas propostas de seguro, ambas referentes aos recorrentes.

  17. Uma das propostas não foi considerada pelo tribunal a quo, em benefício da outra.

  18. Ora, a proposta de seguro não considerada pelo tribunal a quo, era aquela que os recorrentes tinham na sua posse, e que consideram como válida, era a proposta que atenta as respostas dadas, culminaria, na execução de exames médicos complementares.

  19. Nessa proposta, a recorrente mencionou, ter consultado cardiologista.

  20. Segundo os depoimentos das testemunhas Dr. H… (médico da ré Seguradora D…, S.A) e técnica de Seguros, I…, respondendo-se afirmativamente à pergunta “já consultou um cardiologista”, a seguradora solicitaria exames médicos complementares.

  21. Ora, desconhecemos os motivos pelos quais a Seguradora não requereu à recorrente tais exames complementares.

  22. Também não foi dada relevância pelo tribunal a quo, ao facto de os recorrentes terem mudado de seguradora, ou seja, os recorrentes tinham um seguro de vida numa companhia de seguros, e mudaram tal seguro, para a ré.

  23. Os recorrentes não subscreveram um seguro novo.

  24. Não faz qualquer sentido a tese defendida pela ré de que os recorrentes a enganaram, pois se assim fosse, estes manter-se-iam a sua seguradora originária.

    Face a tudo exposto, 26º Não considera a recorrente haver suporte fáctico, testemunhal ou documental para que o Tribunal a quo tivesse julgado improcedente a presente acção, uma vez que o próprio tribunal considera que “não ficou provado que a A. omitiu ser portadora de Diabetes.” 27º A sentença ora recorrida, em nosso entender, violou ainda o disposto nos artigos 271º, 280º, 334º do Código Civil.

  25. Violou ainda o princípio da livre apreciação pelo tribunal, nos termos do artigo 607º nº 5 do CPC, a qual se baseia na sua prudente convicção sobre a prova produzida.

  26. A sentença recorrida...

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