Acórdão nº 881/16.6JAPRT-BA.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelCRAVO ROXO
Data da Resolução20 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 881/16.6JAPRT-BA.P1.

* Acordam no Tribunal da Relação do Porto: *No processo comum nº 881/16.6JAPRT-BA.P1, do 2º Juiz do Juízo de Instrução Criminal do Porto, vieram os arguidos B… e C… suscitar o incidente de recusa de Juiz, relativamente à Meritíssima Juíza que não identificam, mas que se depreende ser a Senhora Dra. D…, alegando sumariamente que:* Do 1º arguido: 1ºO valor essencial da imparcialidade, como condição e qualidade estrutural da função de julgar está, desde logo, consagrada na CEDH (Convenção Europeia dos Direitos do Homem), onde no seu artigo 6.° se lê: "qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada ( ... ) por um tribunal (...) imparcial (... )."2ºOs princípios e os direitos fundamentais dos Homens, próprios do Estado de Direito Português, porque democrático, visam assegurar a imparcialidade dos tribunais.

  1. Para tal exige-se a independência e garantia de imparcialidade dos juízes (nomeadamente artigos 2o, 8o, 20°, 202° e 203° da Constituição da República Portuguesa (doravante designada por C.R.P.); o artigo 6o, 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem; o artigo 10° da Declaração Universal dos Direitos do Homem; o artigo 14° n° 1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos; e o artigo 47° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia) nas suas decisões.

  2. O processo penal português, atenta a sua estrutura acusatória (artigo 32° n° 5 da C.R.P.), tem uma dimensão deveras importante do princípio das garantias de defesa (artigo 32° n° 1 da C.R.P.) constituindo a imparcialidade do Juiz uma garantia essencial e única, a quem apenas pode recorrer a um tribunal para decidir da sua causa.

  3. «Independência e imparcialidade são verso e reverso da mesma realidade fundamental, e a imparcialidade é uma nota essencial do próprio conceito de tribunal» in Castro Mendes, Nótula, pág. 660.

  4. Como ensina Figueiredo Dias in "Direito Processual Penal, Io vol., Coimbra, 1974, página 315: "não é tanto o facto de, a final, o juiz ter conseguido ou não manter a sua imparcialidade, mas sim defendê-lo da suspeita de a não ter conservado, não dar azo a qualquer dúvida, por esta via reforçando a confiança da comunidade nas decisões dos seus magistrados".

  5. A imparcialidade do Juiz pode ser assegurada através do mecanismo de Recusa, quando nos termos do disposto no artigo 43°, n° 1 do Código de Processo Penal (doravante designado por C.P.P.): "ocorrer motivo, sério e grave, adequado a gerar confiança sobre a sua imparcialidade".

  6. Assim, a demonstração de que, na direção dos actos processuais, o juiz concede um tratamento injustificado e arbitrariamente diferenciado a um sujeito processual, privilegiando-o ou prejudicando-o, inclinando-se desde logo, num determinado sentido de decisão da causa, implica a sua suspeição e fica comprometida a sua imparcialidade.

  7. Com efeito, o arguido nos presentes autos, advogado, que usa o nome profissional de E…, foi mandatário de vários arguidos no processo n° 5544/11.6TAVNG-J, que correu termos pelo Tribunal da Comarca do Porto, Instância Central de Instrução Criminal do Porto, 1a Secção, Juiz 3.

  8. A Juiz que presidiu à fase de instrução do processo supra mencionado é a mesma Juiz de Instrução Criminal dos presentes autos.

  9. E, nada haveria a acrescer, não fosse o facto de a imparcialidade objectiva da Sr.a Juiz ora recusada, motivada pelas suas atitudes, motivações e pré-juízos de valor, se encontrar prejudicada pelo que a seguir se descreve, o que de todo não se pode permitir, sob pena de a Justiça ficar desprovida de imparcialidade, seriedade e segurança.

    Vejamos:12°Em 22 de Maio de 2015, no âmbito do processo supra referenciado (5544/11,6TAVNG) foi proferido o seguinte despacho (de que se transcreve na parte que interessa ao presente Incidente, tendo também sido omitido propositadamente o nome dos arguidos): "...O Ilustre Mandatário dos arguidos, no debate instrutório veio invocar que a presente instrução padece do vício de irregularidade, por ter ocorrido violação do prazo máximo fixado para esta fase processual no art. 306° do C.P.P., e que é o de 4 meses, uma vez que o debate instrutório na instrução requerida pelos co-arguidos que se encontram em liberdade, só foi realizado cerca de 6 meses depois de 17/10/2014 (altura em que foi proferida a decisão instrutória na instrução requerida pelo arguido, que se encontrava preso preventivamente).

    Termina concluindo pela procedência da invocada irregularidade e que em consequência, seja iniciada de novo a fase de instrução. Cumpre decidir.

    Efectivamente, dispõe o art. 306° n° 1 do C.P.P. que "O juiz encerra a instrução nos prazo máximos de (...) quatro meses" se não houver arguidos presos ou sob obrigação de permanência na habitação.

    O n° 3 da mesma norma prescreve que "Para efeito do disposto nos números anteriores, o prazo conta-se a partir da data de recebimento do requerimento para abertura da instrução". No caso dos autos, a instrução requerida pelos co-arguidos que se encontram em liberdade, foi admitida e declarada aberta por decisão proferida em 17/11/2014.

    Foram efectuadas as diligências que o tribunal entendeu pertinentes e ainda o interrogatório judicial de 7 (dos 9 arguidos que o requereram) arguidos, por ter sido por eles requerido e ser diligência obrigatória para o JIC.

    Por decisão proferida em 24/2/2015, foi designado o dia 27 de Abril do corrente ano para a realização do debate instrutório.

    Ou seja, o referido debate foi designado para data que ultrapassou apenas em 10 dias, o prazo previsto no art. 306° n°s 1 e 3 do C.P.P.

    O Ilustre Mandatário dos arguidos foi notificado de tal despacho em 9 de Março de 2015 (cfr. fls. 16153 e art. 113°n°s 1 b) e 2 do C.P.P.) e as arguidas em 14 de Março de 2015 (cfr. fls. 16209, 16214 e art. 113° n°s 1 c), 3 e 13 do C.P.P.).

    O art. 123° n° 1 do C.P.P. prescreve que "Qualquer irregularidade do processo só determina a invalidade do acto a que se refere e dos termos subsequentes que possa afectar quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio acto ou, se a este tiverem assistido, nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele praticado".

    Nem o Ilustre Mandatário das referidas arguidas, nem estas, estiveram presentes na prolação do despacho que designou o dia 27 de Abril de 2015 para a realização do debate instrutório (cfr. fls. 16138).

    E o certo é que também não vieram invocar a suposta irregularidade nos 3 dias seguintes à notificação de tal decisão, conforme prevê o citado preceito legal. Consequentemente, a suposta irregularidade, a ter ocorrido, considera-se sanada, ou seja, mantém-se válida a instrução. Por outro lado, conforme se verifica do exame dos autos, o referido debate instrutório não pode realizar-se no aprazado dia 27/472015 por motivo (não imputável ao tribunal) da falta de comparência dos mandatários constituídos pelos arguidos, atento o disposto no artº 63° n° 1 por referência ao art. 300° n° 1 do C.P.P.

    Em observância do disposto no art. 300° n° 4 do C.P.P., realizou-se o debate instrutório, 3 dias depois (30/4/2015).

    Note-se ainda que mesmo ultrapassado o prazo previsto no n° 1 do art. 306° do C.P.P., não ocorreu qualquer vício, muito menos o da invocada irregularidade da instrução.

    Com efeito, os prazos estabelecidos na referida norma são meramente ordenadores e, portanto, a sua violação não tem por consequência a nulidade ou irregularidade dos actos realizados depois do prazo legal.

    Ao invocar a suposta irregularidade, pretendeu o Ilustre Mandatário das arguidas, tal como requereu, que fosse reconhecida e declarada e se iniciasse de novo a instrução, não se vislumbrando, com tal requerimento outro objectivo que não seja o de entorpecer/protelar o andamento do processo, bem sabendo, porque foi notificado do despacho proferido em 26/3/2015 pelo Sr. Juiz do tribunal do julgamento, que o co-arguido —, privado da liberdade, se encontra a condenado ao abrigo do disposto no artigo 521° n° 2 do C.P.P. e não se tratando de actos praticados por pessoa que não seja sujeito processual penal, porquanto os actos praticados pelo Mandatário forense é um acto de parte e sendo o acto que deu origem à multa aplicada está excluído do âmbito da norma do artigo 521°, n° 2 do C.P.P.

  10. A decisão ínsita no Douto Acórdão da Relação do Porto (de 30.09.2015) foi a seguinte (apenas se transcreve a parte final): "Ora, deste regime decorre que o mandatário constituído nos autos não é o "estranho" ao processo a quem se dirige a previsão do n° 2 do artigo 521° do Código de Processo Penal. E que quando imposta, a taxa sancionatória excecional é da responsabilidade do sujeito processual - mandante - e não de quem o representa no processo- mandatário.

    Tenha-se, ainda, presente que o mandatário incorre em obrigação de indemnizar o mandante quando não cumpre ou cumpre defeituosamente o contrato.

    E que mesmo quando se reconheça que o...

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